Sentado na varanda de uma manhã cinza, sem a luz amarela do sol, apoiei meus braços sobre minha cabeça, enquanto a brisa do vento batia levemente sobre meu rosto, misturada ao barulho do vai e vem do mar que podia ser ouvido de onde eu estava. Comecei a me sentir nostálgico ao ponto de lembrar de coisas deprimentes, o que combinava com aquele dia frio e cinza. Parece que outra vez a melancolia tomou conta de mim; sentia um peso nos olhos devido à enorme vontade de chorar, porém já havia feito muito disso ultimamente e não precisava de mais lágrimas no momento. Eu as contive e deixei a melancolia pesar em meu coração, enquanto alisava minha nuca com minhas unhas ao ponto de causar certa ardência, algo para neutralizar a dor com dor.Fiquei de pé, encostado na sacada da varanda, a mesma varanda que algumas noites antes havia conhecido Tony. E, para minha surpresa, mesmo em meio a toda melancolia angustiante, me peguei sorrindo novamente, e foi bom ter a sensação de paz.Num pequeno rádio que achei perto do salão, coloquei na primeira estação que achei interessante, cantava uma música do Ed Sheeran, "Even my dad Does Sometimes". - Perfeita para um momento melancólico, não acham? - E comecei a rever meus passos até ali e o quanto a vida havia me envolvido em seus jogos e tramas.Eu ainda tento digerir tudo isso até hoje, neste exato momento em que você lê essa história. Talvez por isso eu a esteja contando, para ver se consigo entender tudo o que me aconteceu. Quando eu ia ao psicólogo, ele me disse uma vez que escrever como me sinto ajudaria a me sentir melhor sobre mim e tudo mais, porém eu nunca dei ouvidos, até agora, e sinceramente ele tinha razão.Eu estava naquela varanda pensando em como eu havia chegado ali e conhecido aquelas pessoas de uma forma louca e alguns meses atrás isso seria totalmente impossível. Eu conseguia pensar em todos, mas não conseguia deixar Tony por último, eu não sabia o que havia de tão especial nele, porém foi preciso apenas uma noite - e não falo do sexo somente - para que ele me mostrasse tudo o que tem em si; ele era o meu anjo, e a paz que trazia para mim era sua auréola.Minha cabeça ainda borbulhava confusão, mas do meu rosto aquele sorriso não saía ao pensar nessa nova fase que eu estava vivendo. Tony! Tony! Tony! Eu comecei a ver que o desejava por perto cada vez mais e queria sentir seu corpo novamente, queria correr para ele e me atirar em seus braços. Eu me sentia diferente, me sentia em outro mundo, eu me sentia livre pela primeira vez, das dores, traumas e crises, tudo por pensar em Tony.Eu não sei se estava indo rápido demais, porém eu nunca aprendi a ter cautela quando o assunto é amor. Amor! Me peguei pensando nisso, já? Não, não, não podia ser amor, não ainda, admiração talvez, mas não amor.Quando "Give me love" tocou na rádio, Mariana me veio à mente e, mesmo que não estivéssemos juntos pelas circunstâncias e decisões errôneas que ela tomou ao desistir de nós, eu ainda estava apaixonado por ela e sobre isso não havia dúvidas. Eu ainda tentava digerir o fato de que ela não estava viva, e sinceramente, eu queria esquecer isso, porém não era tão fácil. Até chegar ali eu estava cansado, carregava um peso grande no meu coração, um peso tão grande que eu não entendia como conseguia suportar.Eu só precisava de um tempo para mim, para que algo novo acontecesse, para que a vida me surpreendesse, e se por acaso eu recebesse um prêmio por esperar algo bom - se é que posso colocar dessa forma - aquele seria o meu prêmio: Tony.Quando já não tinha mais em que pensar e em quem pensar, percebi que deixei uma ou duas lágrimas caírem, e após isso sinto alguém se aproximar por trás de mim e me abraçar lentamente. Era Tony, que viu lágrimas no meu rosto e, sem fazer perguntas, as limpou me beijando no rosto e ainda me abraçando por trás, apoiou seu queixo no meu ombro e me desejou:- Bom dia, lindo!- Sim, o dia está lindo mesmo, porém cinza e não como de costume - disse em um tom descontraído e brincalhão.- Eu me referia a você, tonto.- Sei disso, eu só não queria inflar meu ego. Bom dia!Nessa hora ele sorriu e me abraçou mais forte enquanto nos apoiamos na grade da varanda. Deixei meu coração falar mais alto, eu estava nervoso, aquele momento estava sendo especial pra mim, enquanto estávamos em silêncio, ali abraçados, eu não via o tempo passar e não conseguia ver mais nada que não fosse Tony.O rádio ainda tocava e acho que eu havia escolhido uma estação perfeita pro momento, pois nesse exato momento tocava uma música da Beyoncé, chamada "Hello". Eu conhecia aquela música, seu refrão dizia: "Você me ganhou quando disse Olá". Eu não podia declarar coisa melhor do que aquilo, Tony em pouco tempo havia me ganhado, e seu jeito carinhoso dissipava qualquer outra coisa que viesse me perturbar; com ele eu só sentia paz.E ao som dessa música, enquanto ainda estávamos abraçados, Tony se vira e ficamos um de frente para o outro; eu não havia visto ele chegar, estava ali perdido em meus pensamentos, havia acordado cedo e na verdade mal havia dormido.Quando menos esperei, ele veio ao meu encontro e me beijou, eu queria muito aquele beijo, eu o desejava e não sentia isso há muito tempo; era quente, e eu podia sentir seu corpo musculoso e esguio. E ficamos ali, nos beijando por alguns minutos, e eu pensei que poderia viver pra sempre contanto que ficasse junto de Tony, até que Alice aparece e nos pega. Pensei que ela se espantaria, porém não demonstrou reação contrária, apenas disse:- Eu sabia, sempre soube desde que chegamos!- Eu ia te contar, Alice - disse Tony meio sem jeito.- Devia ter me contado mesmo... onde já se viu pegar meu rádio e não dizer... estava procurando ele desde que cheguei - disse ela se aproximando e abraçando o rádio que eu não fazia ideia que era dela.Eu dei risadas junto com Tony, havíamos esquecido que era de Alice que estávamos falando; ela não se importaria com coisas assim, era o que eu mais amava nesse jeito louco dela. Sem rótulos, sem julgo, apenas ela sendo ela com o mundo e respeitando a singularidade das pessoas; era o que eu mais admirava em Alice.Havíamos nos soltado ao ver Alice, mas Tony não soltava minha mão que estava apoiada na grade da varanda. Fui à cozinha preparar o café da manhã enquanto Tony e Alice continuaram na varanda, sentados numa mesinha que havia lá; decidimos tomar café juntos, preparei os pães, queijo, presunto, um bolo que havia na geladeira, leite, achocolatado e café, fui levando aos poucos até a varanda, que tinha a vista mais bonita do local.Depois da mesa arrumada, Wesley e Vivan também se juntaram a nós e Wesley disse:- Já sei o que podemos fazer hoje - parecia estar animado - vamos ao cinema!- Todos nós! - disse Vivian.- Que tal "A lenda"? - sugeriu Tony.- Não sou fã de filmes de terror - disse Alice - Que tal algum filme do Tim Burton?- Não tem nenhum no momento, Alice - afirmou Tony.Eu me desliguei do assunto, enquanto eles avaliavam toda uma grade de filmes que estava em cartaz nos cinemas; eu me sentia perdido ao ver que eles entendiam mais de filmes do que eu. Alice era uma viciada em filmes do Tim Burton, logo qualquer coisa em que ele estivesse metido seria mais do que óbvio que ela quisesse ver. Só tornei a me ligar no papo deles novamente quando eles elegeram um filme chamado "A casa da colina". Devia ser novo, pois eu nunca havia visto falar dele.- É um romance - explicou Vivian - o ator principal foi quem dirigiu...- Ótimo, eu topo esse! - Estava mais interessado em que Tony fosse do que no filme realmente.- Olhem, eu vou ficar com o saco de M&Ms e não pretendo dividir com ninguém - afirmou Vivian.- A não ser comigo, não é, amor? - Wesley questionou de uma forma brincalhona arqueando levemente as sobrancelhas, esperando uma resposta afirmativa.- Uhum, claro amor... sem dúvida - ela sorriu após dizer isso em um tom tão irônico que até eu percebi.Dentro da sessão eu só conseguia pensar em Tony, estava fissurado nele, eu nunca me senti assim; parecia um drogado quando entra em abstinência - tudo bem, nem é pra tanto, mas vocês fazem ideia do que quero dizer - tanto que nem prestei atenção no filme; ele dizia coisas bobas e me fazia rir a todo momento, e eu me sentia incrível com isso.Chegou a um ponto de todos perceberem que estava rolando algo entre nós, porque nem de Vivian e Wesley escaparam de perceber que havia algo.Após o filme, fomos a um fast-food, eu estava com pouca fome, mas qualquer coisa era boa ao lado deles. Estávamos para ir embora, e Alice disse que ficaria mais um pouco no shopping, pois havia marcado um compromisso.Alice e seus mistérios, um dia ainda descobriria o que ela esconde. E deixamos ela por lá, nos despedindo e indo para casa.No dia seguinte, Alice não havia aparecido ainda e eu estava louco para que ela voltasse pra casa, ainda não havia entrado em detalhes com ela sobre aquela noite, aquela bendita noite em que eu me senti mais feliz que nunca. Era um domingo e eu estava entediado, Tony e os outros haviam saído para fazer compras, já que nossa despensa estava vazia. Mesmo eu amando a presença de Tony, eu não era muito fã de enfrentar filas, muito menos as de mercado que tendem a ser mais confusas e demoradas do que o normal.Eu andava pela casa procurando algo o que fazer, mas não havia nada, estava tudo limpo e impecável. Não adiantaria eu bancar a empregada, já que eles haviam contratado uma diarista para aquilo; vejam só o meu nível de tédio, até faxina eu pretendia fazer para descontrair e fazer passar o tempo. Os sintomas de dominguite são iguais em todo lugar.Quando o telefone toca, eu torcia para que fosse Alice ou Tony pedindo minha presença em algum evento particular deles. Atendi imediatamente, mas não eram eles. Era minha mãe e mesmo gostando dela ter me ligado eu não consegui disfarçar meu desapontamento; queria algo para fazer e passar o dia no telefone com minha mãe não era exatamente um programa atrativo.- Oi, filho, como vão as coisas por aí? - disse minha mãe.- Vai tudo bem mãe, eu estou adorando.- E aí está fazendo sol?- Está sim, o calor está muito forte e tudo está as mil maravilhas aqui - eu não queria pressão para voltar agora.- Aqui chove desde que você foi embora, queria que estivesse fazendo sol - percebi segundas intenções na minha conversa com minha mãe, pelo visto ela queria passar uns dias aqui, pelo menos ela deu a entender isso.- Quando eu voltar, nós vamos à praia juntos, OK? - eu amo minha mãe, mas não queria nada do meu outro mundo nesse momento e nada que lembrasse ele, então foi essa a alternativa que achei para satisfazer minha mãe.Depois de perguntar como estão as coisas por lá e essas perguntas de costume que fazemos quando não se sabe o que dizer, perguntei pela minha avó e por Thalyta e mandei lembranças a Pedro e John que por sinal estavam por lá já que ouvi os dois gritando no fundo.Me despedi de minha mãe e desliguei o telefone, após isso Alice chega, estava com uma cara exausta, como se tivesse tido uma noite intensa, uma baita noite.Vou até a cozinha e ela me acompanha, abro a geladeira e pego uma maçã; ao bater a porta da geladeira, ela reclama e diz:- Não faz isso, por favor!- Não me diga que em você conseguiu uma enxaqueca tão forte assim!- Você não faz ideia - ela disse isso apoiando os braços e colocando a cabeça por cima deles.- Quero todos os detalhes dessa sua noite, pois tenho coisas para te contar também - disse animado enquanto ela acenava com uma mão e pelo visto ela não estava dando atenção ao que eu dizia.No momento seguinte, eu ouço um barulho do lado de fora da casa, não resisto e vou ver o que é, e ao chegar lá me assusto, não acreditando no que vi. (Continua)
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Flashbacks
RomanceRelatos entre a vida e a morte e no meio do caminho, um amor proibido. Flashbacks conta no ponto de vista do personagem coisas do seu cotidiano e sua vida no geral,onde ele aborda tudo o que pensa e sente sobre o que vê a sua volta e sobre seu mundo...