Profusão

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Naquela manhã fria, típica de Hoseok (quarta-feira) o céu chorava para mim e eu queria chorar para ele; mesmo que as lágrimas não viessem aos meus olhos, o estoque havia acabado. Hoseok tocou meu ombro, e mesmo que aquele fosse o dia dele, eu não estava com saco e muito menos alguma gota de paciência para ter que enfrenta-lo. Quero dizer, eu não estava no clima para ouvir quaisquer que fossem as queixas de Hoseok para comigo; sobre meu jeito preguiçoso, sobre minhas camisetas serem de uma única cor e sobre eu colocar açúcar demais no café. A questão principal era que eu estava num daqueles dias péssimos, em que nada consegue lhe agradar. Nem mesmo as piadas de Hoseok que me faziam sorrir adiantavam de algo.

- Hyung - chamou minha atenção -, o que houve? Você parece mil vezes pior.

- Ah, - eu disse -, isso anima qualquer um.

- Gigi, - tocou meus ombros -, você sabe que não foi essa minha intenção; estou preocupado com você.

- Não precisa - respirei fundo -, não há necessidade alguma de se preocupar comigo; o que quero dizer é, me deixe sozinho um pouco, sim?

- Como quiser - resmungou -, se precisar é só me chamar, se bem que você não vai precisar.

- Eu não estou bravo com você, se é o que está pensando - disse por fim -, eu só quero organizar toda essa bagunça na minha cabeça, você entende isso?!

- Entendo - e saiu; batendo a porta atrás de si.

- Não, você não entende.

Eu estava confuso novamente e sozinho, muito sozinho; algo estava fora de ordem dentro de mim, já não conseguia me concentrar nas minhas aulas, perdi uma boa parte da matéria na sexta-feira pois troquei mensagens com Hoseok no meio da aula e Namjoon não fizera questão de me emprestar seu caderno. Mas eu não o julgo; nem me julgo. Todos passamos por esses momentos de confusões internas, mas já era a segunda vez que aquilo acontecia comigo e eu ainda não sabia o motivo; de primeira pensei ser Hoseok, mas agora estávamos bem, então qual o problema?!

O que havia de errado comigo? Estava bem e de súbito, estava triste; e como, diabos, consegui permanecer sentado olhando para a chuva do lado de fora por tanto tempo? Eu sei la; tudo me parecia o mais melancólico possível, e como se não fosse ruim o suficiente, Hoseok estava bravo comigo; mas eu não tinha culpa, afinal, tentei ser sincero e não quis deixa-lo chateado. Em momentos assim, me pergunto se minha vida seria diferente/melhor se eu ainda morasse em Daegu; claro que, eu ainda cursaria música na faculdade de lá, mas não teria conhecido Namjoon, nem Seokjin, muito menos Hoseok; que agora ocupa um lugar tão grande na minha vida.

Eu tinha sede de solidão, estava sempre afastando todas as pessoas que gostam de mim, mas eu não faço por mal; garanto. Principalmente Hoseok, eu gosto dele, o quero por perto; apesar de tudo eu aprendi a viver com ele e isso deve ser o mais interessante; como aprendemos a conviver com a presença alheia. Mesmo que Hoseok seja a confusão em pessoa, ele é uma pessoa incrível, uma companhia ótima e um ouvinte melhor ainda. Menos aos sábados; quando ele coloca Beyoncé na TV e dança enquanto limpa o quarto comigo, não é como se eu não gostasse das músicas; mas veja bem, Hoseok era a pessoa mais escandalosa do mundo e eu não estou exagerando. Junte duas coisas que ele gosta muito, no caso dançar e berrar, aí está a combinação perfeita para uma dor de cabeça daquelas.

Não sei por quanto tempo fiquei ali, pensando em todas as coisas que me agradavam, e devo confessar, não houve sequer uma vez em que Hoseok não aparecera em minha cabeça, me fazendo derrubar sorrisos avulsos. Ele ainda não havia voltado de onde quer que tivera se metido. Resolvi ligar para ele; no segundo toque fui atendido, xingou-me e desligou o celular. A chuva havia parado, mas já escurecia e eu devia desculpas à Hoseok, por mais que não tivesse intenção de magoá-lo. Apenas peguei um agasalho e coloquei meus tênis; digitei uma mensagem para Namjoon, que dizia, apesar dos erros causados pela correria, que se Hoseok estivesse junto à ele, ele deveria pedir para que ele voltasse para casa. Perguntei aos garotos que estavam a vagabundear no saguão se Hoseok passara por ali mais cedo e um rapaz disse que ele havia ido na direção do auditório; apesar de eu achar que ele provavelmente estava bêbado o suficiente para não lembrar seu próprio nome, confiei nele; mesmo porquê ninguém contestou quando sai agradecendo. O começo daquela noite gélida segurou minhas bochechas como uma tia faria, o ar frio me abraçara e o agasalho parecia não ser o suficiente.

Um por centoOnde histórias criam vida. Descubra agora