16. Memória desvanece

728 41 19
                                    

A relva estava coberta de flores. O branco se sobressaía, mas ainda era possível encontrar flores vermelhas e roxas entre o mato bem aparado do jardim de Valfenda.

Legolas pensava que conhecia todos os elfos de Imladris, mas agora percebia que estava bastante enganado. Viu ali alguns que costumavam ser seus amigos, porém a maioria ele não tinha a mínima ideia de quem era.

Ao seu lado, Tauriel lutava contra o impulso de deixar cair as lágrimas que faziam seus olhos arderem. Legolas sabia que ela fazia aquilo por ele. Contudo, ele não conseguia expressar em palavras o quão grato estava por ela estar ali. Simplesmente não conseguia forçar-se a falar, a lembrar tudo o que acontecera. Preferia ficar em silêncio com sua dor, assim como Tauriel.

O pequeno Lenwë dormia profundamente nos braços do pai. Legolas nunca teve jeito com crianças; tinha medo delas porque não conseguia entendê-las. Com Lenwë era diferente. O bebê parecia entender a situação pela qual passava, porque sempre chorava ao olhar a expressão do pai. Legolas não queria que o filho crescesse carregando o peso de perder a mãe, mas aparentemente, ele já carregava.

Lenwë se agitou no sono e cobriu o rosto com as minúsculas mãozinhas. Legolas não notou; na verdade, ele não estava atento a nada além do túmulo à sua frente. O resto não passava de pano de fundo.

Delicadamente, Tauriel pediu que Legolas a entregasse Lenwë. Mais elfos começavam a chegar, e Tauriel sabia que Legolas precisava de um tempo sozinho. Legolas entregou a criança cuidadosamente, como se não soubesse o que estava fazendo. Antes, deu um leve beijo na cabeça do filho. Tauriel segurou Elwën no outro braço e levou as duas crianças para o Salão.

O jardim rapidamente estava apinhado de elfos. Legolas não chegou a chorar na frente deles; esperaria para quando estivesse apenas com Melinyä. Os elfos de Mirkwood jogavam flores brancas dentro do túmulo, enquanto os de Valfenda entoavam canções belas e tristes, mal escondendo as lágrimas em seus rostos. Melinyä se tornara muito querida no pouco tempo que morara ali.

Todos vieram dizer palavras de consolo a Legolas, e ele mal ouviu. Seus olhos estavam focados em um único ponto, e nada os tiraria dali.

Tauriel voltou pouco depois. Legolas já estava se sentindo sufocado com todas aquelas pessoas olhando para ele, esperando que ele fizesse ou dissesse alguma coisa sobre sua falecida esposa. Tauriel chegou para junto dele e nada disse. Apenas pressionou um arranjo de flores vermelhas contra suas mãos e indicou com a cabeça. Legolas entendeu o que ela quis dizer, mas não achava que poderia fazê-lo. Abaixou a cabeça, e Tauriel a levantou.

- Consegue fazer isso - murmurou para que ninguém além dele ouvisse. Os olhos vermelhos dela em nada ajudavam. - Consegue sim.

Legolas pegou o arranjo. Lembrava que Melinyä dissera uma vez que adorava flores vermelhas, e que seria maravilhoso andar por um campo cheio delas. Imaginava agora Melinyä andando por um mar de flores, com seus cabelos castanhos voando atrás de si e um sorriso perene em seu rosto alegre; quão linda ela estaria.

Legolas deu passos lentos em direção ao túmulo. Pelo que se recordava, ele já andara por muitos lugares na Terra Média. Já quase congelara ao andar por montanhas, e enfrentara o sol escaldante mais vezes do que poderia contar. Mas nenhuma caminhada foi mais dolorosa que aquela.

A cada passo dado, Legolas sentia como se seu peito fosse explodir. Não podia se obrigar a imaginar que Melinyä, a sua Melinyä, estava ali dentro. Não podia ser. Era tão surreal. Ela estivera com ele há poucos dias, estava sim. Segurara sua mão e, juntos, afagaram a barriga volumosa que carregava o filho deles. Antes disso, ela o beijara devagar, como se quisesse apreciar cada segundo ao lado dele. Não era possível que tudo aquilo tivesse acabado num piscar de olhos.

A ELFA DA FLORESTA - Contos da Terra Média (Livro 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora