ULTIMATO

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"Nenhum homem que não controla a própria vida pode ser considerado livre"

- Pitágoras


Vladimir estava furioso.

Não sentia, no entanto, o tipo de raiva comum, mas algo frio que o deixava num estado de extrema calma assassina. Odiava ser obrigado a fazer alguma coisa e enfrentar três horas de engarrafamento atravessando a cidade apenas para ver seu pai, dificilmente seria sua escolha de programa para o sábado à noite.

Um mordomo baixo, com cabelos brancos e as costas tão retas quanto uma tábua, veio recebê-lo à porta assim que chegou.

– Senhor Stephanovich, em que...?

– Onde está meu pai? – ele o interrompeu, autoritário.

– O senhor está no escritório, vou anunciá-lo – respondeu o mordomo, tentando acompanhar os passos rápidos e enérgicos do filho do patrão.

– Não, não vai, ele sabe que estou aqui.

O mordomo abriu a boca para questioná-lo, mas foi preciso só um olhar do outro para que mudasse de ideia, fazendo uma humilde reverência, retirando-se do seu caminho.

Conhecia aquele olhar e nada de bom poderia resultar daquele encontro, seria mais inteligente encontrar um lugar seguro e se esconder. Não é covardia – assegurou-se – afinal, quando dois predadores se encontravam, distância se transformava em uma palavra primordial à sobrevivência.

O recém-chegado abriu a porta com comedimento – apesar da ira que ardia em seu sangue – entrou e olhou em volta como um guerreiro estudando o campo de batalha, prendeu os olhos gelados no seu oponente.

Yvon Stephanovich, seu pai, era um homem de 70 anos, porém, quem o visse sentado em sua mesa de mogno, forte e imponente jamais lhe daria tantos anos. Seus cabelos a muito tinham perdido o tom escuro dando lugar a um cinza lustroso, rosto inexpressivo e marcado por rugas, os olhos azuis – tão parecidos como os do seu primogênito – brilhavam com o prazer da vitória.

– Vladimir, a que devo a visita? – sua voz era grossa e firme.

– Não seja cínico – Vladimir cuspiu as palavras com rispidez.

– Deveria ser mais respeitoso, garoto – Yvon o repreendeu.

– E você mais direto – rebateu, não existia amor ou respeito entre pai e filho, apenas uma tensão gélida entre dois homens extremamente dominantes – que ligação foi aquela?

– Que bom que parou de agir como um moleque covarde e resolveu receber meus recados.

– Não sou moleque, só comando um grande escritório de direito e isso demanda muito tempo – explicou, sem demonstrar a irritação que sentia.

– Escritório esse que eu construí.

– E que estou mantendo de pé – Vladimir detestava quando Yvon esfregava essa informação na sua cara com soberba, como se todo o esforço que havia feito para transformar o legado na família em um império não significasse nada.

– Não por muito tempo.

– Como assim, não por muito tempo? – questionou, cuidadoso, dando ênfase às palavras.

Por mais que seu coração estivesse aos tropeços e sua mente a mil por hora, criando e descartando várias possibilidades – uma pior que a outra – externamente Vladimir permaneceu impassível.

– Lembra da última conversa que tivemos, Vladimir? – perguntou Yvon, levantou indo em direção ao minibar de vidro e madeira localizado discretamente no canto do escritório.

AMOR POR CONTRATO - DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora