1. Cheiros e desejos

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Chego em casa e ainda sinto teu cheiro em mim, algo para além das minhas roupas, mais precisamente um odor impregnado numa parte da minha alma que nenhum outro cara alcançou.

Me dou conta que você me inebria, me toca de um jeito que esvai todas as minhas barreiras e pudores, me despe com um olhar pelo qual me torno tão sua que chego a quase não me pertencer.

Ruborizo só de pensar em como meu corpo clama pelo teu, implora por aconchego, pelo encaixe, pelo poder que tem teus sussurros sacanas.

Percebo que mesmo sem nenhum rótulo, te pertenço, que apesar do acordo que fiz comigo mesma, que da minha boca só sairia gritos e gemidos na erupção noturna do nosso enlace, me peguei esses dias querendo te contar sobre meu chefe idiota ou sobre o meu gato que adoeceu.

Droga! Lá vou eu de novo estragar um relacionamento tão puro, tão cristalino.

Desde o começo era subtendido: sexo, só sexo, o melhor sexo.

Mas eu tinha que querer um abraço depois de ser levada ao céu, claro que eu tinha que inventar de adormecer depois de uma foda bem dada, óbvio que eu ia me envolver emocionalmente.

Tô viciada, já tentei ficar sem te ter dentro de mim, mas não dá, porra, não dá.

De dia penso nos milhões de motivos pra não ir naquele teu apartamento imundo e que grita na minha cara em cada canto que olho: "não se apega!", mas quando a noite cai, me vejo nas tuas mãos.

Desejando com cada partícula do meu corpo te usar e ser usada, que se dane.

Só de ouvir tua voz rouca no interfone qualquer arrependimento de ter corrido ao teu encontro desaparece.

Eu quero, QUERO, ser beijada por esses teus lábios carnudos, ser imprensada na parede e sentir pelos teus apertos na minha coxa o quanto me deseja.

Não vejo a hora de esquecer os meus problemas e só pensar na maravilha que é tua barba pinicando minha pele quando beija meu pescoço.

Paradoxalmente, arranca minhas roupas ferozmente e delicadamente me beija no mais íntimo da minha feminilidade, me faz arquear o corpo, denunciar por meio de gemidos o quanto você sabe me fazer gozar.

E vou andando pela rua, sem ter adormecido na tua cama nem sentido falta de um abraço, caminho com teu cheiro em mim, cheiro de sexo, de orgasmo, de transa bem dada.

Suspeito que as pessoas consigam sentir ao passar por mim, ou elas devem ter apenas se espantado com minha cara de mulher que sabe o que quer (por hora), que não nega o que deseja e que se tiver que quebrar o coração não tem medo de sofrer, aliás, evitar desprazer não me tornou mais feliz do que deitar e rolar com você, ao som de um jazz qualquer no meio dos seus lençóis cheirando a bebida, cigarro e a mim.

Texto publicado originalmente no site Ingênua, em 21 deJulho de 2015.

http://ingenua.com.br/site/cheiros-e-desejos/

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