-Boa noite tio
Falei interrompendo sua concentração no jogo de basquete (passava jogo de basquete a essa hora?) que assistia na TV de seu time preferido.
-Ah boa noite Anna, você deve estar muito cansada.
Ele respondeu sem vontade fingindo interesse no meu suposto cansasso de hoje, implorando com os olhos para voltar a ver o jogo super interessante dele.
-Eh... estou morrendo de sono. Bom, não quero atrapalhar o jogo.
Na verdade não estava com sono.
-Que isso você não atrapalha em nada.
Senti a mentira quando vi que ele mal tirava os olhos da tela e aumentava o volume. Revirei os olhos e sorri da situação. Era sinal verde para mim ir pro meu quarto e responder vários e-mails de pessoas falsas que eu evitei o ano passado.
Entrei no meu quarto e sentei na cama enquanto meu estômago digeria o excesso de frango que comi no jantar. Pensei em escovar os dentes já que não tinha feito isso o dia todo, mas lembrei que a escova tinha ido em bora junto com tudo. Agora recordei-me do passado, quando mamãe ainda estava aqui.
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-Annacleire querida mocinhas como você tem que estar sempre em perfeito estado
-A mamãe o que tem ficar sem escovar os dentes pra dormir?
-Querida quando você crescer você vai ser uma grande música.
-Se a música for de rock eu vou ser mesmo.
-Querida eu quis dizer que você vai tocar vários instrumentos. Assim como eu. E seu pai. Styve não me abrace agora estou convencendo nossa filha a ser uma dama.
-Ah Belly, ela será o que ela quiser...
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Agora minha visão fica embaçada como se meus olhos se recusassem a exercer a sua função natural, como se ja não bastasse, minha consciência sussurra palavras fortes que só eu posso ouvir e tenho que suportar, e de repente sinto como se facas muito afiadas perfurassem meus órgãos da região torácica enquanto sobe pela minha garganta um nó que só tem uma maneira de ser desfeito.
Agora meu rosto frio é acompanhado levemente pela presença de uma lágrima ardente e lastimante. Parece que o nol na garganta foi desfeito. Respirei profundamente e me joguei na cama enquanto o oceano Atlântico escorria pelos meus olhos verdes.
Lamento mamãe por eu nunca chegar a ser o que a senhora sonhou para mim. Muito menos ser forte como o papai foi.
E essa sou eu uma droga de rockeira com 17 anos nas costas que finge que não liga pra nada. E que na maior parte do tempo é uma péssima atriz. Se não chorar era o lema do papai, o meu é:
Não se importe com nada que pareça ser perigoso. Tire graça de onde não tem que garanto que será melhor pra você. Parece idiota, e é, mas foi um jeito que encontrei para sobreviver nesses anos todos sem as pessoas mais importantes pra mim. Talvez elas sejam importantes por que não estão aqui. No dia em que completo 17 anos. Não estou assim por que hoje e meu aniversário e eles não estão aqui. É por que a saudade é algo que não aprendi a lidar ainda, e talvez nunca aprenda.
