Capítulo 01

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LUNA

Franzo o cenho e inclino o queixo para cima levemente, o teto parecia turvo e mais escuro que o normal, esfrego os olhos e volto a encara-lo novamente, talvez fosse só a minha vista já cansada, eu precisava encontrar algo que me ocupasse, com urgência, a essa altura meus pensamentos pareciam me intoxicar, embora, as vezes eu chegasse a acreditar que se eu desejasse com mais força, eles poderiam virar realidade.

E dessa forma, eu me perdia nas milhares de possibilidades que eu criava enquanto olhava para aquele ponto fixo sobre minha cama.

— O que está fazendo ? - Suspirei ao ouvir a voz em um notável tom curioso que me sugou de minhas especulações.

— Estou nos vendo daqui algum tempo. - A resposta veio fácil, tanto quanto o pequeno sorriso que surgiu quando Sol repousou sua cabeça em meu ombro ao se deitar ao meu lado no colchão.

— Você faz umas caretas estranhas quando fica assim, parece que está mastigando alguma coisa, tipo aquelas carnes mal passadas que Edgar faz e parecem borracha.

— O churrasco assassino. - Concluo rindo com ela.

— Edgar é o pior cozinheiro que já vi.

— E ele nunca desiste... - Pontuo a característica como um exemplo a ser seguido erguendo o indicador para dar ênfase a fala.

— Quantas refeições preparadas por ele, você acha que a gente aguenta? - Sol insiste ainda humorada e se vira na cama ficando de lado para olhar para mim.

—Contarei ao Edgar que estão reclamando da comida que ele faz. - Ergo rapidamente a cabeça e avisto minha mãe entrando no quarto, ela tira o chapéu, o casaco e pendura em um suporte improvisado antes de caminhar até a cama.

— Que coisa feia dona Olga... - Fito seu rosto com uma expressão reprovativa.

— Mãe, o que o coração não ouve os olhos...

Não pude conter uma risadinha abafada ao ver a expressão confusa no rosto de minha irmã ao hesitar.

Esse era o meu momento preferido do dia, quando a noite se aproximava devagar, já conseguia ouvir os ruídos dos animais noturnos do Texas, todos estávamos em nossa pequena casinha, e eu poderia aproveitar a companhia da minha família.

Eu trançava as madeixas de Sol, enquanto ouvíamos as histórias que minha mãe contava, era a nossa rotina, já sabíamos a maioria das histórias, mas observávamos atentas como se fosse a primeira vez. Eu gesticulava as palavras com a boca, sem som, todas as partes que recordava, me divertia com isso, era um daqueles desafios pessoais, estava em um desses momentos quando fomos interrompidas por barulhos no outro comodo, era semelhante a algo pesado caindo.

— O que foi isso ? - Sol foi a primeira a se manifestar, mas sua voz era quase um cochicho, entretanto seus olhos berravam uma total atenção em direção a porta.

Instintivamente segurei seus ombros, vozes alteradas tomaram o lugar do silêncio após o barulho, estremeci ao ter um vislumbre do que teríamos que enfrentar pelas próximas horas. Sol se desvencilha de mim e salta da cama em direção ao corredor, sumindo pela porta.

— Outra vez não... - Dona Olga murmura, levanta e vai pelo mesmo caminho que a caçula, eu bufei, já impaciente, e levantei desgostosa, como se ficar ali pudesse evitar tudo, mas não evitava, me encaminho até o corredor, atrás das duas.

A cada passo, a discussão ficava mais clara e mais alta, o amargor já se faz presente... Eu iria até lá me encostaria na parede e aguardaria até que tudo se findasse. Ao olhar para frente, vejo a figura da mulher curvada, visivelmente cansada de ter que aguentar aquilo mais uma vez.

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