Recordações\ 1cap.

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Verbo
re.cor.dar, transitivo- trazer à memória semelhança com comemorar

Ano 1883
Abri os olhos - sentia uma sensação estranha – olhei a volta e única coisa que eu vi foi o tom escuro do quarto, que pensei ser o quarto da minha mãe.
 Sentia olhares atentos sobre mim e quando a visão ficou nítida, vi a minha mãe.

- Rayane! – a minha mãe abraçou-me – Como estás Rayane?

Senti a minha cabeça a girar e vomitos involuntários subiram desde o meu estômago até à minha boca e num reflexo rápido virei a cabeça para o chão e despejei tudo – ou talvez nada - que tinha no estômago.
 Afinal o que estava a acontecer comigo? Senti os meus olhos arderem e esperei ansiosa pelas lagrimas que sabia que iriam deslizar momentos depois pelas minhas bochechas, começou por ser um choro calmo, mas a medida que as lágrimas iam caíndo formaram-se soluços na minha garganta, provenientes do choro descontrolado.

-Calma Rayane está tudo bem, sossega – mais uma vez senti os braços da minha mãe me envolverem num abraço forte e desesperado.

E foi nessa altura que ouvi cavalos, ouvia claramente os cascos a baterem na terra, ouvi o estrondo feito pelas armar devido ao fogo lançado, e vi o corpo do Lian cair sobre os pavimentos acastanhados, o sangue a esvaiar-se a mistuar-se com o castanho do chão.

Meu Deus Lian morrerá na batalha, agora entendo a sensação estranha, era a sensação de vazio formada pela perda de Lian, o enjoo devido ao cheiro a sangue que ainda, achava eu, que pairava no ar, e o choro descontrolado o choro de perda.

Coloquei a mão no ventre, lembrando-me do feto plantado lá por Lian antes de partir. Estaria lá essa sementinha proveniente de um amor acabando por ser separadao pela morte? Seria um milagre, apesar de tudo deus ter colocado em mim um pedacinho de Lian antes deste partir?

E então tudo voltou a ficar escuro.

                      1 ° capitulo dias atuais

Cá estava eu mais uma vez a espera de ser chamada para entrar no consultório do Drº Alvez, o meu psicólogo, obrigada pela minha mãe.
 Estava cansada destas consultas, todos os medicos tentavam encontrar respostas para as minhas visões ou recordações. Eu não gosto de as ter mas já vivo com ela a anos suficientes para me adaptar.

- Rayane  Wilton consultório 4.- Ouvi o meu nome através do interfone do hospital.
 
Olhei para a minha mãe e ela olhou para mim com um sorriso, na tentativa de me encorajar para me levantar daquela cadeira branca e dura de hospital. E eu levantei-me em resposta ao olhar atento dela. Caminhei lentamente até ao consultorio e depois da permissão para entrar entrei e senti-me – já não numa cadeira branca e dura mas sim numa preta e almofadada- olhei para o doutor, tinha um olhar terno – olhar tipico de psicologos- cabelo branco.

- Olá Sª Matilde, como esta? –cumprimentou a minha mãe com um aperto de mão.

- Bem doutor, dadas as circunstancias claro!

 O médico voltou- se para mim:

- E a menina, como está?
  
Pensei um pouco antes de dar uma resposta indelicada ao doutor afinal ele não tinha culpa da minha mãe me arrastar a força para as consultas dele.

- Estou bem obrigada. – E sorri um sorriso forçado, mas foi o melhor que arranjei na altura.

- Bem Rayane, como sabe estamos aqui na tentaiva de arranjar uma resposta para as visões que tem tido. Podia começar por me contar quando começaram essas visões?
 
Acenei com a cabeça em frustração, não havia nada que eu podesse fazer senão começara relatar.

- Bem tudo começou quando eu era criança a cerca de dez anos quando tinha 6 anos,
Era o meu primeiro dia de aulas de piano, entrei toda contente por dentro da sala, vi o piano a minha frente e então a minha cabeça começou a girar tudo ficou escuro, subitamente ouvi cavalos, berros de guerra, sons de pistolas a disparar, e lá no fundo ouvia uma melodia triste tocada por piano. Vi a imagem de uma senhora jovem, com cabelos iguais aos meus e de uns olhos azuis tal e qual o tom dos meus, vi-a lágrimas a escorrer nos olhos dela.
Depois tudo voltou ao seu estado normal.

 Quando acabei de relatar vi o doutor com os olhos postos em mim. A minha mãe estava ao meu lado a suspirar.

- Hum...e essas aulas de piano ainda as frequenta? – o médico perguntou

- Claro que sim doutor! – respondi com um sorriso aberto, adoro tocar piano.

- E a melodia que ouviu nesse dia, sabe a tocar?

- De trás para a frente se for necessário! – Mais uma vez sorri.

- Muito bem Rayene , obrigada por me ter contado esses episódios, vou marcar-lhe uns pequenos exames e logo nos veremos.

Sorri fustrada. Quantas vezes tenho eu de dizer que não sou maluca? Que o que acontece comigo é um dom?

Levantei-me da cadeira – que apesar se de ser confortavel me estava a cansar- e corri para fora do hospital sem pelo menos me ter despedido do médico, deixei a minha mãe para trás e caminhei até a um pequeno jardim perto do hospital.
 Sentei-me num banco de madeira, preenchido por dedicatórias de casais apaixonados. Olhei em volta e vi crianças a correr atrás de uma bola, outros a escorregar pelos escorregas. E ainda um ou dois a observar os outros.
 E no meio de tantas crianças, pensei se eu seria mesmo normal ou se as minhas visões eram coisa de pessoas malucas. E comecei a chorar, já estava farta...

- Oh filha! Meu amor não chores, nós vamos livrar-te desse pesadelo!

Olhei para o lado e vi que era a minha mãe, abracei-me a ela e chorei, tudo aquilo que não chorei por anos.

Depois de derramar todas as lágrimas eu e a minha mãe voltamos para casa. Vivia numa casa alta devidamente envolvida por um jardim bem tratado, tinha dois anderes era uma casa bonita pintada num tom rosa claro. Vivia com os meus pais e o meu irmão mais novo o Guilherme.
 
Quando entrei em casa, subi logo para o quarto. Na realidade vivia mais naquele quarto do que no resto da casa, era uma quarto grande- demasiado na minha opinião- tinha uma enorme janela na parede em frente da minha cama, ia do chão até ao teto e era sem duvida a parte favorita do meu quarto.
 As paredes estão pintadas de um rosa claro,tem a minha cama um guarda-fatos, uma estante com todos os meus livros uma secretária e por ultimo uma porta que dava ate a casa de banho. Resumindo, era o meu cantinho de paz.
 Ouvi a campainha, e o som da porta a abrir e fechar, calculei que fosse a Maria.
A Maria era a minha melhor amiga a única que conhecia os meus surtos de visões antepassadas. Era morena, tinha um cabelo perfeitamente liso na cor preta e uns olhos escuros, era o meu aposto em todos os sentidos, eu era ruiva e tinha a pele mais clara do que o leite.

-Rayane, meu amor! – Gritos que só podiam vir da Maria.

- Que me vais pedir? – revirei os olhos.

Ela encolheu os ombros, e sentou-se na ponta da cama ao meu lado.

-Bem, do que me adianta estar a dizer que não quero nada se me conheces melhor que ninguém?

- Nada por isso mesmo, pede.

- Eu, queria pedir-te – Maria fez uma pausa sorriu  continuou- que viesses comigo ao acampamento perto da casa abandonada no pinhal, vai toda a gente Rayane...

Olhei para a Maria, abri a boca depois fechei, levantei-me da cama andei até a janela olhei lá para fora e obriguei-me a pensar na proposta que me foi feita a minutos atrás.
 O que me proibia de ir? O medo de ter um surto noturno a frente de tanta gente? Ou o desconforto do saco cama? Pois eu apostava na primeira opção.
 Mas por outro lado, à messes que eu não tinha visões, talvez até já estivesse curada.

- Eu vou, mas não te habitues!

-Obrigada lindaaaaa!

Maria envolveu-me num abraço caloroso e demasiado apertado, mas que com modéstia à parte, ,amava sentir.

Depois de umas fofocas, Maria foi embora e eu fui deitar-me.

RenatusOnde histórias criam vida. Descubra agora