Iniciativa. / 5.cap

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i·ni·ci·a·ti·va - Acto ou direito daquele que é o primeiro a fazer ou a lembrar alguma coisa.
Desembaraço nas resoluções. Começo, princípio.
"iniciativa"

Podia até dizer que hoje o dia iria correr bem, pena que era domingo e amanhã começariam as aulas...
Lá no fundo algo me agradava, a mochila nova, o cheiro a novo dos livros e dos cadernos. Porém, pensar que amanhã regressaria ao colégio, e voltaria a ser a esquistóide, que desmaiava sem motivo aparente, ou até mesmo a pobre coitada que se escondia no escuro da biblioteca a ler livros com mais de 300 anos.
Mas o que é que tem? Essa era eu! Essa era Rayene!

Não iria deixar que este ano letivo fosse igual aos outros não queria e não podia.
Depois de finalmente reunir forças e ganhar coragem para me levantar da cama. Lá fui eu tomar o pequeno almoço com a família.

-Bom dia! - disse na chegada a mesa onde os meus pais e irmão se encontravam.

-Bom dia.

Responderam todos com menos entusiasmo que eu. Comi, pedi licença e logo subi para o quarto.

Ao lado do meu quarto encontrava-se o quarto dos meus pais e mesmo que eu não quisesse eu ouvia os berros, de uma discussão longa e com um motivo: Rayene.

- Nem penses! Não vais transferir a menina assim de escola. Ela anda lá a anos!

- Roberto, ouve! Aquela escola é especializada, lá ela iria ser bem tratada e ninguém lha olharia de lado, pois todos têm as suas perturbações

- Basta a Rayene não é perturbada, não é maluca tão pouco, ela é tua filha! Custa-te assim tanto aceitar que ela é diferente! Custa-te acreditar que ela não vai ser uma cheerleader,porque ela não quer! Ela não gosta! Não tem que ser a rainha do baile, não tem que ser a mais popular. E é ela que sofre com os olhares de lado, não és tu. E nota bem, ela nunca pediu para mudar de escola. Eu não permito que a Rayene mude de escola!

- Mas...

-Mas nada. A conversa termina aqui!

E então a porta do quarto ao lado bateu, as lágrimas escorreram.
Até a minha mãe me vê como uma tola!
Tudo bem que as vezes até eu mesma me sinto como tal, mas é assim tão difícil acreditar que eu sou diferente que eu tenho sonhos ou visões com uma rapariga com o meu rosto, o meu corpo, e sinto o que ela sente e que agora chegou a cidade um rapaz chamado Lian que por acaso é exactamente o rapaz que eu sonhei durante estes anos todos e que por ventura é o primo da minha melhor amiga. Céus... Serei eu mesmo doida.
Será que isto teria de acontecer comigo?

Chorei durante horas a fio, e perguntei-me umas milhentas vezes o porque de tal acontecer comigo! Mas se nem um médico tinha resposta como eu teria?

-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

Lian

Não conseguia tirar a Rayene da minha cabeça e de certa forma isso estava a me deixar perturbado. Para além de existir o meu pai no topo dos meus pensamentos Rayene não ficava a perder. Depois daquela noite algo mudou em mim e eu não sei se foi a ter conhecido a ela ou ao seu problema e sinceramente, eu não sei se o meu pensamento era sobre o facto de ela ser a rapariga mais bonita que já conheci ou o que se passa na sua mente.
Algo ali era na realidade muito estranho e qualquer um vê isso. Nenhuma pessoa normal tem recordações dos seus antepassados a não ser ela!
E é de louvar alguém que consegue sobreviver a isso sem se esconder da sociedade. A verdade é que este tipo de pensamento não me saia da cabeça
Durante tantos anos senti-me eu mesmo o maior estranho do mundo... e agora encontrei alguém pior do que eu.
Por outro lado, sentia pena dela, porque ninguém deve acreditar nela, devem ser poucas as pessoas a quem ela contou sobre o seu problema e agora eu era um desconhecido que conhecia mais dela do que mesmo ela própria imaginaria. Também ninguém mandou a linguaruda da Maria abrir a boca...

As paredes do quarto estavam a sufocar-me , as paredes e os pensamentos. Tinha de arranjar uma maneira de ajudar Rayene e quem sabe ela me ajudar a mim.
Então decidi eu mesmo ir a casa de Rayene

- Tia, vou visitar uma pessoa. Importa-se!?

- Uma pessoa mas que pessoa ? Meu querido tu acabas de chegar a cidade...

- Rayene.

A minha tia sorriu. Ficou contente por a conhecer de certa forma não sabe o seu problema.

- Tu o quê!? Tas doido? Nem conheces a menina de lado nenhum!

Foi a vez de Maria mostrar alguma reacção porém esta bem diferente da de minha tia. Maria recebeu de imediato um olhar de reprovação da tia Carla

- passo a conhecer. Adeus priminha

Peguei na chave e mesmo antes de fechar a porta ouvi a Maria gritar:

-Livra-te de lhe contares que eu te desvendei o segredo dela.

Sorri e continuei a caminhada até a casa rosa clara.

A cada passo que dava receava o que me esperava. E ia elaborando um ou dois discursos como resposta de estar presente em sua casa.

Finalmente cheguei, respirei fundo e toquei na campainha. Veio uma senhora me atender

- Olá. Que desejas?

- Olá, bem eu sou primo da Maria e ela mandou-me vir dar um recado a Rayana.

- E porque não lhe ligou?

- Esta sem telemóvel...

Não me pareceu que a minha desculpa tivesse convencido a senhora a minha frente -acho ser a mãe de Rayene.

- Bem rapazinho... Só te deixo entrar porque és sobrinho da Clara e eu realmente tenho bastante respeito por ela... A Rayene esta no quarto. Primeiro andar segunda porta a esquerda.

- Muito obrigada senhora...

- Matilde.

Subi as escadas, tinha as mãos a tremer, talvez pelo discurso lá em baixo ou pelo facto de estar em frente a porta indicada.
Bati contra a madeira da porta, uma, duas e três vezes mas nada de Rayene a abrir. Então decidi eu mesmo abrir a porta.

Ao longo do edredom branco estavam espalhados os seus cabelos ruivos. Aproximei-me lentamente, e no silêncio do quarto ouvia a sua respiração, quando dei a volta a cama conclui que ela estaria a dormir. Mas não sai de lá e lá fiquei até ela acordar.

As sardas, os cabelos ruivos, a pele pálida, tudo nela me fascinava e quanto mais a olhava mais queria saber dela.

E foi quando aqueles olhos verdes penetraram nos meu azuis que tive a certeza que seria uma boa amizade.

- Lian? Como estas aqui?

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Proximo cap. Narrado por Rayene

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