Lily:
- Pai, pela milésima vez! Eu não irei para o Brasil com você! - Bufei.
- Claro que você vai! - Insistiu.
- Eu não irei! - Gritei.
- Já está decidido, e você não pode contestar a minha decisão! Hoje mesmo irei até a sua escola para cancelar a sua matrícula. Inclusive, na escola de ballet! - Ele disse.
- O Senhor vai acabar com a minha vida! - Esbravejei. - Eu não posso perder a segunda fase do World of dance! E os meus amigos? E as aulas de ballet? E a mamãe? É a minha vida, pai! Não posso mudar tudo assim! É radical demais para mim! - Falei aos prantos.
- Pensa pelo lado bom,filha! Os brasileiros são muito receptivos! Certamente você fará muitas amizades, e será feliz lá também! - Forçou um sorriso.
- Eu não quero ir! - Berrei. - Detesto aquele país! - Falei sem pensar.
- Mas foi lá que você nasceu! Se pensa que é uma britânica, está muito enganada! - Bufou.
- Eu sei disso! - Resmunguei.
- Então não venha bancar a fresca! - Disse bravo.
É,na verdade os meus pais são brasileiros. Quando nós nos mudamos para os Estados Unidos, eu tinha apenas seis anos de idade.
Por isso, o português é a língua predominante na nossa casa.
Mas, somos fluentes em inglês, lógico!
- Você vai acabar com a minha vida, e não percebe isso! Que droga! Afinal, por quê essa loucura de voltar para o Brasil agora? Aqui você tem tudo! O que está faltando? Olha á sua volta! - Questionei.
- Não é loucura! É saudade! É necessidade. - Ele respondeu.
- Necessidade? Aqui os professores são valorizados! Pelo que eu saiba, a nossa condição financeira está muito boa. E no Brasil? Os pobres professores ganham uma miséria,para tentar dar educação para quem não quer nada! - Resmunguei.
- Você está se excedendo! Você não sabe o que fala! Pro seu quarto! Já! - Ordenou.
- Pode ir para o seu Brasil país da igualdade, so-zi-nho! Ficarei aqui! - O enfrentei.
- A sua revolta não me fará mudar de decisão! Os seus avós estão loucos para te ver! Ingrata! - Bufou. - Se quiser deixar de frequentar a escola hoje, já pode! E se quiser se despedir dos seus amigos do ballet já pode! Viajaremos no final do mês. Ou antes! - Avisou,e me deixou sozinha no quarto, aos prantos.
- Eu te odeio! - Berrei o mais alto que pude,jogando contra a porta, todos os objetos que via em minha frente.
- Eu não irei com ele! Não mesmo! - Falei sozinha.
Fui para a escola de ballet, e participei do ensaio normalmente.
Ao final da aula, o Lucca me chamou para conversar.
- Lily, eu gostaria de saber por quê você foge tanto de mim! Depois que nós nos beijamos,você só foge! Eu pensei que nós iríamos namorar! - Ele disse diretamente.
- Aquele beijo não era para ter acontecido,jamais. Esta é a verdade! Sempre te vi como um de meus melhores amigos, e confundi as coisas apenas! - Respondi com sinceridade.
- Quer dizer,que você não me ver como um namorado? - Levantou a sobrancelha.
- Isso! Até por quê, eu nunca namorei,e não penso nisso agora. Quero focar na minha carreira! - Dei de ombros.
- Ok. - Acenou,e foi embora sem dizer mais nada.
Estava ensaiando uns passos sozinha enquanto a escola não fechava, quando a Megan chegou visivelmente assustada.
- Algum problema? - Perguntei ao ver o seu rosto pálido.
- O seu pai está lá fora! - Ela disse.
- O que ele quer? - Perguntei como quem não quer nada.
- Ele veio cancelar a sua matrícula.. - Comprimiu os lábios.
Saí correndo em desespero.
- O Senhor não pode fazer isso! - Eu gritava, e esperneava,enquanto ele me segurava pelos meus pulsos. - Você é um monstro! Eu te odeio! - As palavras saíam de forma involuntária.
- Florzinha, não fale assim com o seu pai! Vamos conversar! - Megan me tirou dos braços dele.
E assim, terminei o meu dia na casa dela,recebendo seus conselhos,e tomando chá de camomila.
Lily:
Após muitas brigas, o meu pai finalmente conseguiu o que ele queria: Me vencer,e me fazer ir embora para o Brasil com ele.
Depois de uma despedida dolorida, eu deixei a escola de ballet, e consequentemente os meus amigos, e a minha melhor amiga: Megan.
- Você jura que nunca vai se esquecer de mim? - Perguntei com lágrimas imensas nos olhos.
- Claro! Nós iremos nos falar sempre! E eu vou te mandar todas as fotos da segunda fase do campeonato. - Sorriu levemente.
[[ Chorei ainda mais]]
- A minha carreira acabou por aqui, Megan! - Falei.
- Não! Não ouse em dizer uma coisa dessas! No Brasil também há oportunidades para bailarinas! Já saíram grandes bailarinos de lá, você sabia? - Perguntou, e eu assenti com um gesto de cabeça. - Você é tão boa no que faz, que eles vão ficar loucos, disputando por você! - Disse limpando as minhas lágrimas.
- Eu voltarei! - Nos abraçamos.
- Eu sei! - Me apertou.
Em seguida, ela me levou para o palco da escola, onde os meus amigos fizeram uma festa de despedida para mim,onde dançamos, tiramos muitas fotos, e eu chorei muito.
Cheguei em casa aos frangalhos, e fui fazer as minhas malas.
- Tudo bem aí? - Papai perguntou, encostando na porta.
- Tudo. - Respondi sem emoção.
- Olha filha, não é a minha intenção te deixar infeliz, e te afastar das pessoas que você gosta.
Mas,eu sinto muitas saudades dos seus avós, dos meus irmãos, enfim eu acho que família é uma coisa tão importante, para de certa forma, ser deixada de lado assim por tanto tempo! Já fazem dez anos que eles não te vêem, e eles querem muito te "reconhecer",digamos assim. - Ele disse.
- Já terminou o discurso? - Perguntei fria.
- Hum, já. - Ele baixou a cabeça.
- Não preciso de mais explicações. Irei com o Senhor para o Brasil, e ponto final! - Falei fechando a mala.
Ele retirou-se, eu tive uma péssima noite de sono e lágrimas, e no dia seguinte...
Acordamos cedo, nos arrumamos, tomamos um café rápido, e fomos para o aeroporto.
Não demorou muito para embarcarmos, e ás 10:30 da manhã, desembarcamos no Brasil, mais especificamente, em São Paulo.
Fomos de táxi até a casa de meus avós paternos que me receberam com muitos beijos,e abraços, e depois meu pai me levou na casa do meu avô materno,que ficou revoltado ao saber que nós deixamos a minha mãe internada em uma clínica para dependentes químicos nos Estados Unidos, mesmo o pai falando por diversas vezes, que eles não estão mais juntos.
Voltamos para a casa dos meus avós paternos onde ficaremos até conseguirmos um lugar para ficar.
- Filha, amanhã mesmo, irei te matricular em algum colégio! Aliás, você não pode perder o ano! - O professor Olavo disse.
- Uhu! Que emoção! - Revirei os olhos.
- Você está aí toda "bravinha",mas quando começar á fazer amizades,vai gostar daqui! Eu tenho certeza! - Sorriu.
Olhei pela janela daquele quarto, e me senti perdida, em um lugar no qual eu não conheço, e não me recordo de nada do que passei ali, em minha infância.
Certamente,a minha carreira de bailarina desceu pelo ralo de vez! Era só isso que eu conseguia pensar. Na verdade, eu não parava de pensar.
Deitei - me naquela cama completamente diferente da minha, e tentei dormir.
Dormir,para tentar esquecer que a minha vida mudou completamente.
Lily:
Meu primeiro dia de aula em uma escola brasileira, e eu já acordei com cara de velório.
Levantei da cama,e fui ao banheiro me arrastando (como de costume),tomei um banho gelado, fiz as minhas higienes, e voltei para o quarto.
- O que eu vou vestir? Ah! Tanto faz! Dane - se quem for perder o seu precioso tempo, olhando para a minha roupa! - Resmunguei sozinha.
Vesti um jeans azul, uma camiseta branca, e a minha jaqueta college por cima. Nos pés, um tênis preto básico.
Deixei os meus cabelos soltos.
No rosto, passei protetor solar, um pouco de pó compacto, rímel,e um gloss rosa.
Desci para tomar café, cumprimentei os meus avós, e o meu pai já não estava mais em casa.
- E o meu pai? Onde está? - Perguntei.
- Ele foi ver uma proposta de emprego, em uma faculdade. - Vovó respondeu.
- Rápido, não? Chegamos ontem, e hoje eu já tenho aula, ele já foi ver emprego.. Se continuar assim, amanhã ele vai está casando com outra, e tendo dez lindos filhinhos! - Falei ironicamente, comendo uma torrada.
- Um professor de fora aqui, é bastante valorizado, Lili! Antes de vocês virem para cá, ele já havia recebido a proposta. Ofereceram meio período na faculdade para ele dar aulas de filosofia,e meio período para ele dar aulas de inglês em uma escola profissionalizante. - Minha tia, irmã do meu pai disse.
- É LILY! - Corrigi.
- A mocinha não acha,que está sendo áspera demais não? - Minha tia perguntou.
- Que eu não queria vir pra cá, não é novidade para ninguém! - Bufei.
- Mas o que custa, ser um pouco mais simpática com os seus avós? Eles ficam tristes, sabia? - Perguntou me encarando.
- Deixa, Otávia! Tudo ainda é muito novo para ela! Não faça pressão na menina! - Vovô disse.
Levantei da mesa, e peguei a minha mochila.
- Quem vai me levar na escola? - Perguntei.
- Eu! - A tal tia respondeu, pegando as chaves do carro no porta - chaves.
Nos dirigimos até o carro em silêncio, e ela parou em frente á escola.
- Quer que eu entre com você? - Perguntou sem olhar para mim.
- Não, obrigada. - Desci do carro, ela saiu em arrancada, e eu fiquei paralisada em frente aquele colégio imenso.
Colégio Maftarazzi. Uma placa enorme dizia.
Entrei tímida, andando pelos vastos corredores, e visivelmente perdida,até que esbarrei em um Senhor alto, e pançudo.
- Oh,Sorry! Quer dizer, perdoe - me! - Falei desajeitada.
- A Senhorita está perdida? - Perguntou sério.
- Sim,estou. Sou nova aqui, e não sei onde fica a minha sala. - Comprimi os lábios.
- Qual o seu nome? - Perguntou.
- Lilith! - Respondi nervosamente. - A minha sala é 2° ano "A",bloco B. Mas esta escola é tão grande, que eu ainda não consegui achar. - Ri, suando frio.
- Lilith, eu sou o professor Petrochelly! Sou o mais antigo professor desta escola,e conheço este lugar como a palma da minha mão! Te levarei até a sua sala. Me siga! - Ele disse, e eu o segui.
- Thanks! Droga! Obrigada! - Agradeci atrapalhada.
Se eu fiquei nervosa ao conhecer o professor que não é nada atraente, imagine se conhecesse algum garoto.
Pois apesar de não ter sido favorável a idéia de morar no Brasil, sei que aqui o que não faltam, são garotos bonitos. Estou certa?
Quando finalmente encontramos a minha sala, o professor Petrochelly também entrou.
- O Senhor pode ir! Ficarei bem aqui. - Eu disse tímida.
- Mas eu irei dar aula aqui! Já quer que eu saia? - Gargalhou.
[[Corei]]
Encolhi os ombros envergonhada, e dei um sorriso amarelo.
- Gente, esta é Lilith, a nova colega de classe de vocês. Ela veio dos Estados Unidos, e eu acabei a conhecendo aqui perdida no corredor (risadas) e por coincidência, a trouxe para vocês! Dêem as boas vindas para ela! - O professor bem humorado, falou.
- Boas vindas LÁlith. - Alguns disseram.
- Vish! Temos gringa na área? - Ouvi alguém dizer lá atrás.
- É Lilith! - Corrigi de cabeça baixa.
- Grande coisa! De todos os jeitos, o nome é estranho mesmo! - Uma garota gritou.
[[ Gargalhadas ecoavam]]
- Me chamem de Lily! - Bufei,e quando fui sentar em uma carteira..
- Aqui já tem dono! - Jogaram uma mochila.
Fui para outra carteira.
- Aqui também. - Desta vez um caderno.
Sentei em uma, sem dizer nada.
- Tá louca garota? Este é o local do Carter! - Uma garota loira falou, me fazendo sair.
Por fim, me sentei lá atrás, isolada, nas últimas carteiras.
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Um Passo para Deus (DEGUSTAÇÃO)
JugendliteraturVinda de uma família completamente desestruturada, Lily cresceu presenciando diversas brigas de seus pais, e vendo a sua mãe se afundar no alcoolismo cada vez mais. Só, que tais fatos não a fizeram desistir do maior sonho de sua vida: Ser bailarina...