Êpa Baba!
Oxalufã era o rei de Ilu-ayê, a terra dos ancestrais, na longínqua África.Ele estava muito velho, curvado pela idade e andava com dificuldade,apoiado num grande cajado, chamado opaxorô.Um dia, Oxalufã decidiu viajar em visita a.seu velho amigo Xangô, rei de Oyó.Antes de partir, Oxalufã consultou um babalaô, o adivinho,perguntando-lhe se tudo ia correr bem e se a viagem seria feliz.O babalaô respondeu-lhe:"Não faça esta viagem!Ela será cheia de incidentes desagradáveis e acabará mal."Mas, Oxalufã tinha um temperamento obstinado,quando fazia um projeto, nunca renunciava.Disse, então, ao babalaô:"Decidi fazer esta viagem e eu a farei, aconteça o que acontecer!"Oxalufã perguntou ainda ao babalaô,se oferendas e sacrifícios melhorariam as coisas.Este respondeu-lhe:"Qualquer que sejam suas oferendas, a viagem será desastrosa."E fez ainda algumas recomendações:"Se você não quiser perder a vida durante a viagem,deverá aceitar fazer tudo que lhe pedirem.Você não deverá queixar-se das tristes conseqüências que advirão.Será necessário que você leve três panos brancos.Será necessário que você leve, também, sabão e limo da costa."Oxalufã partiu, então, lentamente, apoiado no seu opaxorô.Ao cabo de algum tempo, ele encontra Exu Elepô, Exu "dono do azeite de dendê".Exu estava sentado à beira da estrada, com um grande pote cheio de dendê."Ah! Bom dia Oxalufã, como vai a família?""Oh! Bom dia Exu Elepô, como vai também a sua?""Ah! Oxalufã, ajude-me a colocar este pote no ombro.""Sim, Exu, sim, sim, com prazer e logo."Mas, de repente, Exu Elepô virou o pote sobre Oxalufã.Oxalufã, seguindo os conselhos do babalaô, ficou calmo e nada reclamou.Foi limpar-se no rio mais próximo.
Passou o limo da costa sobre o corpo e vestiu-se com um novo pano;aquele que usava ficou perto do rio, como oferenda.Oxalufã retomou a estrada, andando com lentidão, apoiado no seu opaxorô.Duas vezes mais ele encontrou-se com Exu.Uma vez, com Exu Onidú, Exu "dono do carvão";Outra vez, com Exu Aladi, Exu "dono do óleo do caroço de dendê".Duas vezes mais, Oxalufã foi vítima das armadilhas de Exu,ambas semelhantes à primeira.Duas vezes mais, Oxalufã sujeitou-se às conseqüências.Exu divertiu-se às custas dele,sem que, contudo, conseguisse tirar-lhe a calma.Oxalufã trocou, assim, seus últimos panos,deixando na margem do rio os que usava, como oferendas.E continuou corajosamente seu caminho, apoiado em seu opaxorô,até que passou a fronteira do reino de seu amigo Xangô.Kawo Kabiyesi, Sango, Alafin Oyó, Alayeluwa!"Saudemos Xangô, Senhor do Palácio de Oyó, Senhor dó Mundo!"Logo, Oxalufã avistou um cavalo perdido que pertencia a Xangô.Ele conhecia o animal, pois havia sido ele que, há tempo, lho oferecera.Oxalufã tentou amansar o cavalo, mostrando-lhe uma espiga de milho,para amarrá-lo e devolvê-lo a Xangô.Neste instante, chegaram correndo os empregados do palácio.Eles estavam perseguindo o animal e gritaram:"Olhem o ladrão de cavalo!Miserável, imprestável, amigo do bem alheio!Como os tempos mudaram; roubar com esta idade!!Não há mais anciãos respeitáveis! Quem diria? Quem acreditaria?"Caíram todos sobre Oxalufã, cobrindo-o de pancadas.Eles o agarraram e arrastaram até a prisão.Oxalufã, lembrando-se das recomendações do babalaô,permaneceu quieto e nada disse.Ele não podia vingar-se.Usou então dos seus poderes, do fundo da prisão.Não choveu mais, a colheita estava comprometida, o gado dizimado;as mulheres estéreis, as pessoas eram vitimadas por doenças terríveis.Durante sete anos o reino de Xangô foi devastado.Xangô, por sua vez, consultou um babalaô,para saber a razão de toda aquela desgraça."Kabiyesi Xangô, respondeu-lhe o babalaô,tudo isto é conseqüência de um ato lastimável.Um velho sofre injustamente, preso há sete anos.Ele nunca se queixou, mas não pense no entanto ...Eis a fonte de todas as desgraças!"
Xangô fez vir diante dele o tal ancião."Ah! Mas vejam só!"- gritou Xangô."É você, Oxalufã! Êpa Baba! Exê ê!Absurdo! É inacreditável, vergonhoso, imperdoável!!!Ah! Você Oxalufã, na prisão! Êpa Baba!!Não posso acreditar e, ainda por cima, preso por meus próprios empregados!Hei! Todo vocês!Meus generais!Meus cavaleiros, meus eunucos, meus músicos!Meus mensageiros e chefes de cavalaria!Meus caçadores!Minhas mulheres, as yabás!Hei! Povo de Oyó!Todos e todas, vesti-vos de branco em respeito ao rei que veste branco!Todos e todas, guardai o silêncio em sinal de arrependimento!Todos e todas, vão buscar água no rio!É preciso lavar Oxalufã!Êpa Baba! Êpa, Êpa!É preciso que ele no perdoe a ofensa que lhe foi feita!!"Este episódio da vida de Oxalufã é comemorado, a cada ano,em todos os terreiros de candomblé da Bahia, no dia das "Águas de Oxalá"quando todo mundo veste-se de branco e vai buscar água em silêncio,para lavar os axés, objetos sagrados de Oxalá.Também, com a mesma intenção, todos os anos, numa quinta-feira,uma multidão lava o chão da basílica dedicada ao Senhor do Bonfim que,para os descendentes de africanos dos outro tempose seus descendentes de hoje, é Oxalufã.Êpa, Êpa Baba!!
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Lendas Africanas dos Orixás
RandomLivro de Pierre Fatumbi Verger/Caribé. Ed. Corrupio. Um babalaô me contou: "Antigamente, os orixás eram homens. Homens que se tomaram orixás por causa de seus poderes. Homens que se tomaram orixás por causa de sua sabedoria. Eles eram respeitados p...