Prólogo.

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 Meus pés eram velozes, tão rápidos que nem mesmo eu compreendia de onde nascia aquela energia pulsando por toda minha perna.

Corra, continue a correr!

O instinto de sobrevivência urrava em meu cérebro, abafado pela pulsação acelerada que espalhava a adrenalina em minhas veias. Foquei-me naquilo, naquela única coisa de suma importância: correr! O mais veloz possível, para o mais longe que meu corpo pudesse ir. A dor aguda dos galhos quebradiços perfurando meus pés era quase extinta pelas pancadas do meu coração desesperado, mas ainda assim, arrancavam a vida dos meus passos longos, deixando uma trilha de sangue tão vermelha quanto meu vestido esvoaçante nas vísceras da mata.

Hora ou outra, olhava para trás, dando mais vida ao meu pânico em ver aquele mar de sombras banhando tudo em seu caminho. Uma onda de nuvens negras dominava o céu límpido, o que era o mais perfeito azul se convertia naquela neve obscuramente celeste, e mesmo parecendo uma tempestade não haviam rugidos de trovões raivosos. As arvores vigorosas banhadas pela escuridão secavam repentinamente, suas folhas frondosas perdiam a vida em segundos, e tudo se tornava lentamente numa floresta falecida.

A neblina densa era como nuvens terrestres, tão rápida quanto minhas pernas cansadas.

Ainda conseguia ver a luz dourada do sol, e tentava alcançá-la a todo custo, sentir o calor do seu toque sobre minha pele negra. Sob ele estaria segura. Não era como se uma simples sensação me dissesse aquilo. Eu sabia! Porém quanto mais rápida eu era, mais distante ela parecia ficar.

As risadas altas e macabras em minha volta ecoavam dentro da minha cabeça, torturando-me por prazer.

Seria um homem ou uma mulher? Eram ambos!

Debochadas e maldosas, gargalhavam deleitadas com meu desespero. Vultos pareciam acompanhar-me, mais rápidos que qualquer outra coisa já vista.

Você não tem para onde ir pequena Valentin!

Uma mulher cuspiu em desdém, sua voz era como o próprio vento venenoso soprando aquilo em meus ouvidos, mas continuei correndo e ignorando aquelas palavras que faziam um calafrio subir por minhas tripas.

Tropecei em algo imerso sob as folhagens secas, e nessa hora, as sombras me alcançaram. O sol havia sido extinto, restavam apenas nuvens carregadas sobre tudo que meus olhos podiam alcançar. A neblina já estava em torno de mim quando olhei aos redores, as risadas pareciam estar em todos os lugares, quando repentinamente cessaram.

Não havia som algum além dos meus batimentos e minha respiração ofegante, fora isso, apenas uma quietude perturbadora me cercava. Como se surgisse de súbito, um sarcófago estava diante de mim, tão majestosamente encanecido. Sentia o ar engrossando ao meu redor, uma aura negra emanava do objeto numa espécie de energia álgida.

Se tornava cada vez mais difícil respirar com o pavor dominando cada célula do meu corpo.

Um rangido imergiu, sua parte frontal despencou, caindo em minha frente. A pequena lufada de vento veio junto a uma onda de vibrações gélidas, e as risadas de outrora se tornaram gritos horrorizados.

Minha boca semiaberta tremia tentado expulsar o grito preso na garganta, mas era tão inútil quanto tentar mover minhas pernas. O interior do sepulcro era negro, nada podia ser visto, até que então alguma coisa saiu tão veloz quanto um flash, e mesmo assim ainda pude ver o tecido azul do vestido desgastado e longas madeixas amadeiradas em tom escuro e opacas. O vulto veio feroz em minha direção, e somente agora um brado escapou entre meus lábios, ecoando desesperadamente pela floresta seca antes que tudo se tornasse escuridão.

Esse era um pesadelo que me atormentava diariamente desde que cheguei a minha puberdade, nunca o dividi com ninguém além de Natasha, ou o pequeno caderno amarelo qual chamava de diário. Assim como as imagens e sensações estranhas que sentira hora ou outra, poderia ser apenas um resultado dos livros de terror para adolescentes que lia nas horas vagas.

Na época não faziam sentido algum para mim...

Até agora!

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