A tal "lunática do PAS"

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Todos olhavam pra mim. Sério, todos mesmo. Cla­ramente alguns não entendiam o porquê da garota nova atrair os olhares da escola, mas a maioria esta­va pasma ou segurava a vontade rir. OK, alguns já estavam rindo. Parecia com aqueles filmes (imbecis) de adolescentes americanos em que você entra no corredor do colégio e as pessoas param seus afazeres ou o que quer que fosse só para te encarar. E te constranger, lógico.

A diferença é que as protagonistas desses filmes são sempre umas completas perdedoras e inseguras de si. E, bem, eu definitivamente não me encaixo nesse estereótipo. Desde pequena soube que meu Q.I. é acima da média e nun­ca fiz questão de esconder esse atributo de ninguém. Claro que nem sempre as pessoas estão preparadas para isso, fa­zendo com que apelidos como "cabeçuda", "CDF" e "nerd" me perseguissem a vida toda.

Sorte que compreendo que tudo não passa de inveja. Até porque, além de inteligente, sou interessante e nunca engordo. Fazer o que? Alguns são sempre mais favorecidos pela genética. Outros, bem, são protagonistas desses filmes adolescentes americanos de que falava.

Assim, ao invés de me acanhar e sair correndo para chorar no banheiro, simplesmente percorri o corredor cin­zento até o final entrei na sala número 25, 3º ano "E". Como se nada tivesse acontecido.

Na sala de aula, não foi diferente. Bastou eu dar o primeiro passo para dentro, que os cochichos e olhares co­meçaram. Bom saber que os meus companheiros de turma me apoiavam (sarcasmo). Enfim, optei pelo mesmo proce­dimento no corredor e os ignorei. Só havia lugares na última fileira, perto da janela, e me dirigi para lá.

Sentei-me. Ainda bem que a carteira era composta de mesa e cadeira separadas. Odiava aquelas que eram um con-junto só. Era claustrofóbico para o lado direito do meu corpo.

Verifiquei o relógio do meu celular ultrapassado. A aula começaria logo, então apenas arrumei meu material na carteira e senti pena das pobres almas que ainda riam de mim. Um dia esse ultraje iria voltar. Ação e reação. Ou jus­tiça, como preferia chamar.

Para passar o tempo, resolvi reparar nos meus vizi­nhos dos lados. Afinal, em breve eu precisaria fazer alianças para trabalhos em grupo e afins. Vai que eu me sentei na­quele lugar para isso.

Daí veio a decepção.

O "ser" da direita estava dormindo e tudo que se po­dia ver, além do uniforme padrão, casaco vinho do colégio e calça jeans, era um mar de cabelos negros e longos inun­dando a mesa (homem ou mulher?). Já a menina da esquer­da, usava óculos de grau grandes demais para o rosto dela e parecia bastante entretida com seu iPhone e fones de ou­vido. Ou seja, nenhum dos dois aparentava ter um intelecto parecido com o meu.

Tudo bem. Não se podia ter tudo na vida.

O sinal tocou, os cochichos cessaram e o professor en­trou. Finalmente, a parte que importava iria começar: o estudo. Que caísse uma bomba na cabeça das outras pessoas. O tercei­ro ano do Ensino Médio seria mais do que decisivo para mim, pois precisava concluí-lo com louvor, como qualquer outra sé­rie da minha vida estudantil, e tirar uma nota perfeita no PAS* para passar em Medicina na Universidade de Brasília.

— Bom dia. Sejam bem-vindos ao último ano de tor­tura escolar de suas vidas – o professor começou. Ele era tão comum que nenhuma característica física dele se so­bressaía. — Em breve, vocês poderão trilhar o caminho que bem quiserem e do jeito que quiserem. Mas, até lá, vocês estudarão História Mundial comigo.

História. Não seria nada relevante pra minha carreira de médica no porvir, mas sempre simpatizei com a matéria. Acho que se deve ao fato de mamãe também ser professora de História.

A parede branca do meu quartoOnde histórias criam vida. Descubra agora