Pão de queijo e farpas

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Tantos anos aturando meu irmão Lucas finalmenteme seriam úteis. Eu ainda estava sofrendo com todos lá de casa na minha cola,cobrando que eu convidas­se minha "amiga" Lara no sábado para um lanche. E issoera um pé no saco porque eu não estava afim de aturar Lara por uma tardeinteira. Porém, ao mesmo tempo, não queria desapontar mamãe e vovó.   

Não me entendam mal. Lara tinha seus momentos bons, como quando me maquiava (uma ou duas vezes por semana) ou juntava a mesa dela com a minha para todos os exercícios em dupla (eu não precisava dela, mas os profes­sores exigiam que as tarefas fossem feitas em parceria). Mas era só. Ela falava demais. Era difícil acompanhar o ritmo de conversa dela. Uma hora eram produtos de beleza, daí ela conferia o iPhone e ia falando o quanto amava algum cantor coreano de nome impronunciável (quando eu dizia que era japonês, ela ficava com muita raiva). Maurício entrava na conversa e eu nunca entendia do que eles falavam. Por fim, concluiam comentando sobre um assunto maluco qualquer.

Uma loucura atrás da outra.

Sem contar que ela insistia em me chamar de Mari. "Mari" não combina com a força de Mariana, uma vez tentei dizer. Mas era impossível argumentar com Lara neste sentido.

Enfim... Como dizia, não estava a fim de aturar a Lara por uma tarde inteira. Então, bolei uma estratégia típica do Lucas: eu esperaria a semana próxima da Páscoa chegar e faria o convite. Como ela já tinha dito que iria para São Paulo no fim de semana anterior ao feriado, ela não pode­ria comparecer. Assim, vovó e mamãe não me encheriam mais a paciência (já eram quase dois meses de cobrança), eu poderia estudar em paz e, quando as aulas voltassem, eu já teria inventado outra maneira para que Lara não precisasse ir para minha casa.

Só que eu quebrei a cara muito, mas muito feio.

Ontem, fiz o convite a Lara na hora do intervalo. Ela não só amou a ideia, como me abraçou e disse que iria com todo o prazer, já que só viajaria no domingo (perdi essa par­te da conversa). Na hora me senti levemente culpada por tentar manipulá-la. A culpa passou quando ela se levantou da mesa em que estávamos sentadas e convidou o Maurício também.

Sério, qual era a daqueles dois? Ele gostava dela? Por que diabos ele aceitou o convite se nós nem nos falávamos direito?

Na hora, retive a raiva apertando as minhas mãos. As unhas acabaram me ferindo.

E agora estávamos todos ali, na sala de estar da minha casa. Lara e vó Fatinha já tinham engatado uma conversa calorosa, enquanto Lucas fingia prestar atenção (quando, na verdade, só estava admirando Lara). O que elas falavam, já não saberia dizer. Pelo menos, era sempre bom ver a minha vó animada.

Enquanto isso, eu e Maurício nos sentávamos nas poltronas laranja, em cantos opostos da sala, observando os três no sofá verde limão. Apreciei o tato dele ao não se sen­tar no puff branco perto de mim. Evitava o constrangimento do silêncio que sempre reinava entre mim e ele.

— Pronto! O pão de queijo está quentinho – minha mãe anunciou ao entrar na sala com uma bacia imensa de pães de queijo. Exagero. Éramos seis pessoas, não vinte. — Venham, sentem-se a mesa.

Nossa mesa toda branca e de metal (eu não disse que a nossa sala era de gosto duvidoso?) era de quatro lugares. Lucas imediatamente buscou um banco na cozinha e sentou do lado de Lara. Eu puxei uma poltrona e fiquei na outra ponta, entre vovó e Maurício.

Aliás, pausa para um comentário: Lucas era muito menor que a Lara. Ela tinha o que? 1,77? Ele, uns 1,64 no máximo. Iria usar isso contra ele na primeira oportuni­dade!

A parede branca do meu quartoOnde histórias criam vida. Descubra agora