Saí atordoada da sala da diretora, e pude ouvir uma enorme algazarra que vinha do andar de baixo. O barulho subia as escadas e ecoava por todos os corredores preenchidos por portas e mais portas. Srta. Hulten saiu na minha frente, descendo as escadas que rangiam. O descer logo atrás dela, pude ver Justin guiando e auxiliando todos os jovens, que pareciam agitados. Logo no saguão, onde havia alguns sofás e um grande tapete felpudo, via-se no teto uma garota loira, literalmente presa lá. Srta. Hulten bufou de impaciência, como se aquilo fosse tão rotineiro quanto preparar seu chá para o café da tarde. Havia pessoas rindo por todos os cantos, ouvia-se gargalhadas altas e escandalosas, dedos apontavam para a pobre garota que flutuava no teto. Porque ela realmente parecia flutuar, quase como se as leis da gravidade não se aplicassem a ela. Justin pegou sua mão delicadamente, e a puxava para baixo, o que aparentemente não era tão fácil assim. O rosto da menina estava enrubescido, todo vermelho e com olhos caídos de vergonha. O cabelo loiro escuro caía pela testa, e uma faixa azul com o laço desfeito caia junto. Ela parecia ter a minha idade, mas era muito mais baixa que a maioria das pessoas de dezoito anos. Aos poucos, Justin conseguiu colocá-la delicadamente no chão, onde Srta. Hulten calçou em seus pés um sapatinho cinza, aparentemente de algum metal pesado, que a segurava no chão, provavelmente chumbo. Ainda havia algumas risadas pelo saguão, e Justin fazia questão de olhar a todos os donos das supostas risadinhas com uma cara de desgosto. A menina agora via-se presa ao chão, onde seus pezinhos eram fixados com um sapato tão pesado que precisava de ajuda para se -arrastar- por ai. Aos poucos, as pessoas foram se dispersando, e me vi sozinha no saguão, tentando assimilar a cena que presenciei.
A garota flutuante -nome temporário que decidi adotar até saber o verdadeiro nome dela- fez a minha ficha cair. Eu estava lá, no meio de dezenas de adolescentes com poderes malucos como flutuar, super-força, inteligência a cima do normal, e havia eu, que tão monotonamente me curava. Eu ficava doente, mas em um dia os sintomas já se passaram; eu me machucava, mas os ferimentos não duravam algumas horas. Que emocionante. Eu só trazia benefícios a mim mesma, não era como eles, que poderiam ser facilmente confundidos com super-heróis, que salvam pessoas e até cidades inteiras com seus dons.
Emmily veio ao meu encontro, afobada.
-Você viu aquilo?- ela perguntou, se referindo ao "espetáculo" da garota presa no teto.
-Vi.- disse seca. Eu não queria fazer estardalhaço sobre aquilo, a menina parecia muito envergonhada, e eu não queria ser mais uma a espalhar sua vergonha.
Ela deu de ombros e me mandou segui-la, disse que o nome da garota flutuante era Stella, e que ela tinha esse dom antigravidade que a fazia flutuar, precisando de sapatilhas de chumbo para segurá-la no chão. Me senti mal por ela, ficar presa ao chão não é algo muito agradável, mas entre sair flutuando por ai, ficando presa em tetos e batendo em galhos de arvores, eu preferia ficar com os pés no chão mesmo.
Emmily me entregou um papel onde dizia o horário das aulas. A palavra "aulas" no papel era como um letreiro luminoso de Las Vegas, piscava bem em frente ao meu rosto, jogando na minha cara que não, eu não estava salva do resto do ano letivo. Mas ao invés de aulas básicas como Matemática, Gramática, Literatura e Ciências, havia disciplinas como "História peculiar", "Controle dos dons", "Ciência das poções" e outras como latim, literatura , artes e uma bem curiosa que despertou muito a minha atenção: "Defesa contra Errantes". Não preciso dizer que estava ansiosa para saber do que se tratava. Justin era o professor dessa disciplina; Keira liderava Ciência das poções; Angel com História peculiar e Srta. Hulten ficava com o resto das matérias. Além das aulas no período da manhã, haviam de segunda a quinta, treinos e tarde. Não especificava qual tipo de treino eles estavam se referindo, e fiquei imaginando quem sabe um time de vôlei ou futebol. Shane dava suporte a Srta. Hulten nos treinos, juntamente com Alexandra, a garota de nariz empinado na mesa do café da manhã.
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Peculiar
FantasyJenn se vê dentro de um turbilhão de mudanças. Após o sumiço da irmã mais velha, tudo foi de mal a pior, e oito anos depois, descobre que sua vida não era nada do que ela pensava. A explicação para diversos mistérios da sua vida estão para vir á ton...