Predadores

Prólogo

Mais uma estrada. Mais uma pequena cidade no fim do mundo. Jake dirigia a dias, movido a cigarros que tragava como se fossem seu último. Talvez fossem. A iluminação precária dos faróis permitia enxergar vagamente as placas, mas Jake as ignorava, assim como ignorou todos os avisos que lhe deram em sua vida e o trouxeram até aqui.

Agora não importava mais. Tudo que podia pensar era em como encontrá-los. Tudo que ele sentia era o desejo de vingança.

Antes, esta pista era utilizada por milhares de veículos que lançavam sua poluição ao ar, assustando a fauna loca. Agora, o cheiro da mata densa que invadia a pista ardia as narinas. Era impossível distinguir que tipo de plantas eram essas apenas com a luz dos faróis. Ao menos, nessa velocidade. Incrível como o mundo se adaptava facilmente a falta dos humanos.

A uma centena de metros, consegue enxergar um vulto humano. Os passos cambaleantes e roupas esfarrapadas não permitem distinguir se trata-se de uma mulher ou homem, enquanto a figura se move no centro da estrada. Jake acelera. Seu coração também. O impacto lança o corpo imundo metros acima da terra, deixando uma mancha de sangue difusa no párabrisas e uma poça no meio-fio onde aterrissa, enquanto Jake tenta estabilizar o carro que desliza pela pista.

Jake estaciona e verifica o corpo. Um gemido intermitente pode ser ouvido do ser que se arrasta com pernas quebradas deixando um rastro de sangue arterial de uma fratura exposta. Ferimentos que deveriam fazer uma pessoa resistente chorar e se contorcer de dor, enquanto os mais fracos cairiam na abençoada inconsciência. Mas a, a criatura continua se arrastando na direção de Jake, seus olhos não expressam emoções, apenas procuram um alvo.

Jake chuta o rosto da coisa, que cai inerte. Toda humanidade que havia nela havia se dissipado há muito tempo, assim como o remorso em Jake. Ele costumava gostar de lavar seu carro sob o sol, sentir a satisfação de um trabalho feito com as próprias mãos, ajudar desconhecidos. Essa vida parece muito distante enquanto ele usa parte dos trapos da coisa no párabrisas.

Algumas centenas de metros a frente, é possível divisar a entrada da cidade após uma descida íngreme, caminho que havia feito tantas vezes.A visão privilegiada da encosta permite ver uma grande parte da cidade, muitos prédios e casas com janelas pregadas e nenhuma alma à vista. Pelo menos, não uma que já não esteja condenada.

Continuando em seu caminho, Jake tenta lembrar onde tudo começou. O pesadelo. Com certeza foi naquela manhã.