Querido Diário

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Janeiro, 1964

"Querido Diário,

Aprendi que seguir padrões é algo que não sei fazer. Principalmente os padrões impostos por minha mãe. Queria que ela entendesse que não importa a opinião alheia, que temos de viver aspirando nossa própria felicidade sem ser impedidos pelas regras impostas pela sociedade. Porém, acho que ela jamais entenderá. Acho que ela jamais me aceitará. Hoje, pelo menos, ela está me obrigando a fazer algo que normalmente eu não aceitaria, mas as consequências podem ser boas demais.

I'm what you make me, you've only to take me, and in your arms I will stay...

Elvis Presley."

Eu estava de castigo havia sete dias. A única coisa que minha mãe permitia que eu comesse eram bolachas com chá. Mas Chico sempre dizia a Fátima levar algo mais para me sustentar ao longo do dia. Diana sempre entrava em meu quarto e perguntava se eu tinha algo para lhe dizer. Ela poderia me deixar lá por meses, e ainda assim eu daria o braço a torcer. Jamais prometeria que iria me comportar, pois sabia que isso significaria ceder às amarras de mamãe.

Rico sempre me mandava cartas, contando sobre suas excitantes férias, de como ele e Roberta estavam agora namorando, contava novidades de Yan, Vini e Miguel. Nunca mencionava Ben, seu irmão. Este também não me procurara desde o baile na casa de Yan. Não sabia por que estava tão preocupada, afinal, fora só um beijo. Para mim, não havia sido somente isso, por mais que minha cabeça tentava me convencer que fora apenas algo casual. Mas eu não tinha a mínima ideia do que se passava na cabeça de Ben, tão mais velho e vivido que eu. Se ele fosse como meus amigos, facilitaria. Meus pensamentos foram dispersos assim que escutei alguém bater sobre a madeira da porta do meu quarto.

"Entre" falei distraída, fechando o livro que lia. Diana deslizou elegante para dentro; impressionante como, apesar de seus quase quarenta anos, ela continuava tão jovial. Seus cabelos loiros batiam um pouco abaixo dos ombros e eram sempre penteados da mesma maneira ondulada há anos. Seus olhos eram de um castanho avermelhado e suas maçãs do rosto estavam sempre levemente rosadas. Eu estava sentada em minha cama, com um novo livro em mãos, ao passo que minha vitrola invadia o quarto com a linda voz de Presley.

"Vejo que sua rebeldia não cessou..." Diana disse seca, olhando-me severamente de cima a baixo.

"Não sou rebelde, mãe..." bufei e fechei meu livro. Ela começou a andar de um lado para o outro. Seus saltos ecoando no chão de mármore, e sua saia esvoaçava ao longo de seus movimentos.

"Percebi que de nada adianta mantê-la aqui," aquele barulho de seus sapatos começava a me irritar. "Resolvi libertá-la por enquanto. Entretanto, você terá que ir à festa de Charles Ribeiro hoje à noite," Diana falava com calma cada palavra. Mamãe sabia como eu não suportava sair com ela, já que eu era obrigada a fingir ser a filha perfeita da família perfeita. Fiz uma careta e fui repreendida. "A não ser que queira continuar trancada durante todos os dias das férias de verão..." ela continuou com seu tom severo.

"Eu irei, mãe," rebati irritada, rolando os olhos.

"Ótimo. Coloque seu Chanel preto que comprei semana passada. Ficará encantadora" disse ela por fim e deixou o quarto rapidamente, não me dando chance de protestar. Encostei minha cabeça atrás da cama e desejei que o tempo passasse muito devagar.

Eram sete da noite e Diana fazia minha maquiagem. Eu estava mais irritada após ela ter quase esmagado meus órgãos tentando fechar o zíper do vestido. Eu me mexia na cadeira, enquanto ela me dava tapas no braço. Assim que terminou, levantei-me e fui em direção ao espelho embutido no guarda-roupa. Eu estava... apresentável. Meu vestido era de seda preto até os joelhos e tomara-que-caia. Diana havia feito um elegante coque em meus cabelos, e a maquiagem era igualmente bonita.