Desperto de repente. A casa estava silenciosa. O som da chuva torrencial que despencou do céu na madrugada havia cessado, e agora, o único, e mínimo som, era o da brisa gelada passando pela fresta da janela. O relógio marcava seis e dez da manhã, e como o quarto estava claro demais para que eu voltasse a dormir, decido levantar e ajudar Marianne com as tarefas. Provavelmente a mesma ainda estaria dormindo, e eu precisaria acordá-la para a faxina.
- Marianne! - grito, abrindo num gesto brusco a porta. Nada. Abro a porta de seu quarto, a cama estava perfeitamente arrumada, tudo em seu devido lugar, teria ela ido ao mercado?
Desço as escadas, ainda com uma tontura, e levo um susto quando dou de cara com tudo arrumado e limpo. Um cheiro de frutas preenchia a sala, e me dou conta de que vem de uma cesta sobre o balcão. Corro até a mesma, e noto um bilhete preso a alça da cestinha.
"Aylee, leve essa droga para o vizinho que deixou o presente aqui ontem. Eu sei que há dezenas de casas aqui, mas dê um jeito de achar. No momento, estou fazendo compras, e depois irei dar uma pesquisada numas empresas para a reforma da casa. Beijos. Nem pense em comer uma sequer. E se você não levar....."
-Argh! Eu sou empregada ou o quê? - dou a meia volta e subo novamente as escadas, teria de trocar de roupa. Visto calça jeans e uma camisa preta simples sob uma jaqueta. Penteio os cabelos e escovo os dentes antes de descer novamente as escadas. Como provavelmente teria que atravessar nove metros de quintal enlameado, coloco um tênis, e saio apressada com a cesta na mão, desviando de enormes poças de lama.
Paro em frente ao portão enferrujado de minha casa, observo o início do condomínio lá na frente. Olho para o número de minha casa. Número 70.
-Eu vou me matar. - murmuro, iniciando a caminhada. Paro na primeira casa depois da minha, á direita. Tinha dois andares, bem cuidada. Toco a campainha.
-Olá? - uma mulher, que aparentava ter uns quarenta anos atende. Cabelos loiros presos em um rabo de cavalo, com os olhos ainda sonolentos.
-Bom dia, a senhora ordenou que seu filho deixasse uma cesta de frutas ontem na minha varanda? É que eu preciso retribuir o favor, então... - torço mentalmente para que a mulher dissesse um sim, mas ela abana a cabeça, com os lábios comprimidos.
-Eu não tenho filhos. - diz, antes de acenar e fechar a porta. Enquanto olho para aquele bilhete do menino, fico imaginando o porquê de não ter um nome. Com certeza o porteiro reconheceria o maldito nome.
"Não fui eu. Não gosto de gente nova."
"Não, meu filho não deixou nada lá"
'Não."
"Não."
"Não."
"Não."
Eu estava extremamente cansada de ver gente de nariz empinado, quando, finalmente, por acidente, viro o bilhete e vejo um número. Quarenta e sete. Estive o tempo todo procurando por algo que já dizia no bilhete.
-Está de brincadeira? - pergunto a mim mesma. Observo que a casa estava à uns doze metros. Ando com pressa em direção à mesma, com a calça já cheia de lama.
Toco a campainha. Trinta segundos. Nada. Toco novamente. Um minuto. Nada. Novamente...Nada. Deveria estar dormindo. Decido voltar para casa e dormir mais um pouco, quando a porta se abre. Viro-me rapidamente, aliviada por não ter percorrido tudo aquilo em vão, e uma menina com cabelos escuros está parada no batente da entrada com um gato branco enroscado em seus braços.
- Olá? - ela tinha uma bela aparência, e obviamente não era um garoto metido.
- Oh! Hãn.. Posso saber se algum garoto que mora nesta casa deixou uma cesta em minha varanda ontem? - pergunto, admirando a bela casa, que por acaso parecia ser a maior de todo condomínio. Ou uma das maiores. Pela quantidade de janelas, parecia ser dividida em muitos cômodos.
- Garota nova, não é? - levo uns instantes para responder, balançando a cabeça para cima e para baixo - olha, é difícil eu lhe dizer quem desta casa lhe deixou a cesta, mas acho que foi o Rapmon.
- Rapmon?!
- Sim, Namjoon, ele fica na portaria. Se quiser falar com ele, vá lá. - ela aponta para o pequeno edifício atarracado no início do condomínio.
- Obrigada. - com um aceno rápido dou meia volta e corro até a entrada. Era estranho um jovem trabalhar na portaria de um condomínio... Quer dizer, pelo jeito como o garoto falava no bilhete, parecia ser jovem. Para falar a verdade, não sei de nada.
Assim que me aproximo da portaria, avisto por uma pequena janela alguém de costas. A cadeira inclinada para trás, com apenas as pernas traseiras da mesma apoiadas no chão. Os braços cruzados atrás da cabeça, e as pernas cruzadas sobre uma escrivaninha de madeira. O local estava mal iluminado, então preciso forçar os olhos de onde estou, apoiada no batente da porta, para enxergar qualquer coisa além de uma silhueta.
- Senhor? - chamo-o, imaginando se era mesmo um garoto, ou já um homem. Com um susto, o garoto - ou seja lá o que for - quase cai do assento, balançando os braços no ar desesperadamente buscando um equilíbrio. Não consigo conter uma risada abafada.
- Não teve graça. - reclama ele, totalmente envergonhado. Consigo finalmente enxergar seu rosto quando ele se levanta apressado e se aproxima de mim, tão alto quanto a porta. Os cabelos lisos platinados e úmidos estavam simples, jogados para trás, como se ele simplesmente tivesse passado as mãos sobre ele, e o rosto, belo e juvenil. Ele fica parado, observando, como se esperasse algo, e então depois de dois segundos faz um sinal para que eu diga o que pretendia dizer - o que quer? - pergunta ele.
- Ah! Sou a moradora nova, e ontem a noite, alguém da sua casa deixou uma cesta em minha varanda. Por acaso foi você? - ele analisa o pequeno cesto em minhas mãos e solta uma risada.
- Sim... Ou melhor, não fui eu, mas a pessoa mora comigo.
- Eu gostaria de entregar isto para ele, como um agradecimento.
- Sinto muito, ele não está em casa. Mas eu posso entregar.
- Ah, eu lhe agradeço por isso. - ele sorri e acena, pegando o cesto de minhas mãos.
- Tudo bem...

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You Are In Danger
FanfictionOs raios de sol não banhavam a cidade naquele dia. Nas frestas das janelas, com as cortinas esvoaçantes, não se espremiam os feixes de luz que inundavam a casa com o calor. Talvez eu só tenha percebido tudo isso devido à sua falta, mas eu não notava...