Capítulo 3

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Passava das 15h. Fui até a geladeira e peguei uma lata de refrigerante. Naquele dia fazia muito calor. O ar-condicionado, que ficava no quarto, era suficiente para esfriar todos os cômodos.

Fui para a sala, deitando-me no sofá. Deixei o refrigerante sobre a mesa de centro e fiquei fitando o teto. Com uma caneta na mão, fazia simplórios malabarismos. Vez ou outra ouvia passos vindo do corredor. Era uma música monótona que preenchia o silêncio de minha mente. Este não era o único vazio. Nenhuma imagem me vislumbrava, embora dois nomes batiam à porta de meus pensamentos: Vanessa e Ilda.

Como eram tão diferentes. Uma, com aquele rosto de menina e modos angelicais. A outra, uma mulher voluptuosa, carregando no olhar e nos gestos uma vasta experiência sexual. Esse antagonismo me fascinava de sobremaneira. O homem mais pretensioso desejaria a duas, pois se completavam; mas um tímido como eu contentava-se com apenas uma, embora meu coração ficasse dividido.

Ser tímido tinha lá suas vantagens. Não detinha certos defeitos como arrogância, prepotência e narcisismo. Não era o tipo de cara que acreditava possuir todas as mulheres, ou ser o detentor de um poder capaz de conquistar qualquer uma. Por outro lado, acentuava outros como insegurança, baixa autoestima e introversão. O último consegui, como muito esforço, revertê-lo para uma extroversão parcial; mas não fora o suficiente para me tornar um rapaz interessante.

Estava esperando a ligação de Ilda. Aquele emprego seria a minha salvação. O salário como atendente era minguado, e não me permitia comprar roupas e calçados de marca. Não me encarem como uma pessoa superficial, mas um vestuário descente pode mudar uma pessoa, embora superficialmente.

Se eu conseguisse o emprego como revisor na Editora, ganharia o triplo do meu salário atual, trabalhando duas horas a menos por dia. Seria extraordinário demais! Aproveitaria essas horas para estudar e pôr os trabalhos em dia.

Poderia levar uma vida mais sossegada, sem muitos apertos e imprevistos. Sendo otimista, conseguiria até uma atenção mais significativa por parte de Vanessa. Não poderia afirmar com certeza, mas ela certamente me viria com outros olhos.

A tarde foi passando. Depois do último gole de refrigerante, sentia-me cansado de esperar. Deixei que minha mente vagasse ao acaso, e buscasse uma lembrança que me tirasse do tédio. Quando finalmente veio, deparei-me com o decote de Ilda.

Como eram belos e lascivos, dois mundos iguais e instigantes. Nos meus devaneios, aquele sutiã virou fumaça. Os seios seguiam livremente a gravidade a suga-los para o chão, como os bicos rijos a perfurar-lhe a blusa.

Os lábios de Ilda ganharam camadas de um batom vermelho com efeito molhado. Como explicar a excitação que aqueles lábios me provocavam? Eram chamativos, bem verdade, um convite ao deleite da carne em sua mais plena essência. Ilda deixou de ser apenas um nome, para tornar-se uma entidade.

Detive-me na agradável constatação de que a próxima voz que ouviria naquele dia seria a dela. Assim todos os meus sonhos mais ocultos despertariam para infindáveis noites imaginando aquele corpo, em cada centímetro, contorcendo-se diante de mim, o veludo retorquido, da pele de Ilda.

Minhas divagações foram interrompidas pelo toque do telefone; mas a excitação era tanta que não se dissipou.

- Gostaria de falar com o senhor Edgar Alan Silva.

Era uma voz gutural e inconfundível, o som provocante daquela que ocupava meus pensamentos.

- Ele mesmo, quem gostaria? – perguntei, apenas para atender a uma formalidade.

O Tímido do 28Onde histórias criam vida. Descubra agora