1- A Última Carta

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Nathy

Já está amanhecendo e eu não consegui pregar o olho.

Faz tempo que sinto meu romance com Fábio perdendo as poucas forças que tinha. Namoramos há dois anos, mas só agora consigo admitir para mim mesma que buscava algo mais intenso e mais sólido do que o que vivo com ele.

O que mais me incomoda no Fábio é seu jeito ciumento e possessivo. Isso me faz mal, me deixa com vergonha. Ontem mesmo ele fez uma cena patética, durante nosso jantar de aniversário de namoro. O funcionário do restaurante foi atencioso comigo, exatamente como foi com ele e de repente, lá estava o Fábio destratando o rapaz, dizendo poucas e boas para ele, exigindo respeito. Fiquei com ódio. Não é a primeira vez que ele apronta algo assim. Conclusão: Deixei o restaurante no mesmo instante pedindo que ele não viesse atrás de mim.

Conheci o Fábio na autoescola. Ele parecia um cara legal e acabamos tendo uma amizade bacana. O pai dele foi assassinado durante um assalto, no dia da nossa prova de direção. Nem pudemos comemorar nossa aprovação porque quando ele ligou para casa, louco para contar a novidade para os pais e os irmãos, soube da tragédia e ficou muito mal.

Acabamos nos aproximando muito por conta disso. Me deixei levar pela tristeza dele e quando me dei conta, ele já estava me apresentando a todos como sua namorada. Não teve nada combinado antes. Nenhuma conversa, nenhum aviso. Ele decidiu assim e viramos namorados. Não gostei disso, mas ele estava tentando lidar com a perda, por isso deixei o barco correr.

Nunca esqueci tudo que vivi com Cláudio. Não passa sequer um dia em que eu não pense nele, em que eu não me pergunte por onde ele anda, o que tem feito da vida e se um dia a gente voltará a se esbarrar. "Será que sente minha falta assim como eu sinto a sua?"

Levanto e pego minha caixinha de cartas. Tem muitas cartas e bilhetinhos dele aqui, guardados como se fossem relíquias. Mas essas que ele me enviou quando nos tornamos namorados são as que mais releio.

Volto para a cama e coloco uma música no celular. Desdobro essa ultima carta que encontrei presa na fresta da janela da minha antiga casa. Não é sempre que consigo relê-la. Mas preciso disso hoje.

"Naná, não sei o que aconteceu aqui. Tá tudo muito errado com meu pai e minha mãe. Ela disse que vamos embora pra longe, agora. Não sei para onde.

Eu queria muito ficar aqui, mas ela disse que não posso.

Eu volto. Volto para buscar você!

Não se esqueça que te amo e que um dia a gente vai se casar e ter sete filhinhos. Me espera."

Ele sempre me chamou de Naná. Minha mãe diz que essa foi a primeira palavra que ele disse quando eu ainda estava na barriga dela e quando nasci, tia Ana foi nos visitar no hospital e Cláudio fez o maior berreiro, querendo me levar para casa. Deixou as enfermeiras enlouquecidas, repetindo em prantos: "É minha! É minha!"

Quatorze anos sem saber dele... Nunca mais tivemos qualquer notícia.

O que ameniza minha saudade é a convivência que tenho com o tio Mauro e com a nova família dele. Tio Mauro cometeu erros em seu primeiro casamento, mas não merecia ficar sem o filho. Ele sofre bastante com essa ausência. Ele e Cláudio se davam muito bem, eram muito companheiros. A tia Ana não tinha esse direito de separá-los. Mas quem sou eu para julgar? Ela foi traída, dentro de sua própria casa. Tio Mauro tinha um caso fazia tempos com uma vizinha nossa. Tia Ana não soube lidar com isso e quando descobriu, só quis desaparecer.

Acordo com alguém me fazendo cócegas e abro os olhos, assustada. É a minha prima Laís.

— Ei, vai dormir o sábado inteiro? Existe vida lá fora, sabia, preguiçosa? — ela vai dizendo e abrindo as janelas do meu quarto.

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