O Amanhecer de Mirna

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- Mamãe! Descobri que nasci pra ser cantora!- dizia Mirna ao caminhar pela fazendo logo pela manhã, sonhando com o futuro.

- É mesmo? – respondeu a mãe, que já conhecia os devaneios de Mirna - Então precisará treinar bastante sua voz!

- A senhora me deu uma ótima ideia! – comemorou Mirna ao sair em direção ao galinheiro, tentando fazer com que sua cantoria saísse mais alta que canto de galo e piado de galinha.

Porém, as certezas de Mirna eram dissolvidas pelos primeiros raios de sol de cada novo amanhecer:

- Mamãe! Quero mesmo é ser atriz!- dizia Mirna após interpretar personagens inventados para seus únicos expectadores: porcos e vacas.

Mas no amanhecer seguinte, nascia mais uma ideia:

- Mamãe! Ontem vi uma estátua de santa tão bonita lá na igreja! Farei uma igualzinha para a senhora.

- Mas você precisará de mãos muito delicadas pra fazer isso, porque não treina um pouco?- sugeriu a mãe.

E ao olhar suas mãos calejadas de tanto trabalhar na roça, Mirna saiu para ordenhar a vaca:

- Mimosa, hoje será mais fácil viu. É que passei manteiga aqui na mão. Ficou tão macia e delicada, igual mão de escultora!- cochichava para a vaca enquanto fazia cara feia para os funcionários da fazenda que riam muito de seu jeito maluco e atrapalhado.

Até que certo dia Mirna ganhou do tio, que morava na cidade, uma caixinha de música:

- Nossa tio! Que lindo! Quero ser igual a esta bailarina!

Mirna ouviu a melodia até adormecer, prestando atenção nos rodopios do casal de minúsculos bailarinos, habitantes daquela caixa mágica.

E por vários dias seguidos, Mirna bailou.

No meio dos porcos, sobre a lama do chiqueiro.

No deslizar do vento, rodopiando pelas plantações de trigo.

Na beira do lago, desejando ter a leveza dos cisnes, mas tendo que fugir das bicadas dos gansos.

Toda noite, antes de dormir, abria a caixinha para admirar a bailarina:

- Como é delicada! E este vestido rosa é o mais bonito que já vi!

Às vezes, comparava as finas pernas da bailarina, com suas próprias, bem mais grossas e curtas ou aquelas delicadas mãos, com a terra de suas unhas, mas concluía:

- Não importa, terei mais firmeza com pernas grossas e mãos fortes para dançar por muito mais tempo!

Seu tio, quando soube que a nova empreitada de Mirna era ser bailarina, resolveu levá-la à cidade para assistir ao espetáculo do circo, onde diziam haver uma bailarina.

No circo, Mirna se encantou com tudo e não parava de dizer: - Que lindo tio!-  Mas não deixou de reparar que ali, algumas coisas eram muito diferentes.

Viu que o domador de leões era um anão.

O malabarista, não tinha uma das mãos.

O atirador de facas era cego.

O mestre de cerimônia, um pouco gago.

Mirna gargalhou, quando viu que a bailarina, era a mulher barbada!

- Há, há, há! Uma bailarina de barba! Então também poderá ter pernas grossas, não é tio? – repetia Mirna sem parar de rir.

Mas o novo sonho de Mirna derreteu quando a luz do holofote sobre o picadeiro anunciou a última apresentação da noite.

Mirna viu diante de si algo que jamais esqueceria: os palhaços!

Eles despertaram em Mirna uma vontade diferente de todas as outras.

E de volta à fazenda, foi logo anunciando:

- Mamãe! Descobri lá no circo o que quero ser quando crescer!

- É mesmo? Não me diga que quer domar leões? – Perguntou a mãe, não contendo a gargalhada.

- Também – respondeu Mirna.

- Também?- Assustou-se a mãe.

- Sim, pois um palhaço pode ser tudo o que quiser, do jeito que quiser. E ainda fazer todo mundo rir porque, procurando bem, o engraçado nele, todo mundo tem! - concluiu Mirna saindo para treinar seu andar desengonçado, suas histórias engraçadas e seu jeito alegre com o respeitável público da fazenda.

Pelo menos até o próximo amanhecer.

O Amanhecer de MirnaOnde histórias criam vida. Descubra agora