Live Forever

Reality

— Tenho meus próprios fantasmas, e não sou de todo mal, mesmo que não possa afirmar também ser de todo bem... – Sua pausa a fez sorrir recostando a cabeça sob a madeira do estábulo, seus olhos se perdendo no rosto da aeromoça tão concentrada em si. Estava grata que ela se mostrasse tão disposta.

— Só me coloca mais desconfiada a cada segundo... – Lauren respondeu baixinho, não conseguindo evitar um pequeno sorriso de invadir seus lábios.

— Se eu assumir uma perfeição inexistente sei que ficará ainda mais desconfiada, gosto de fugir do pretexto que me torna invencível nos quesitos sentimentais... posso ser implacável no meu trabalho, uma máquina perfeita para fazer negócios, mas minha realidade sentimental é quase trágica de tão inconstante. – A maneira a qual conseguia ter firmeza em sua fala, e expor que aquela sim era sua realidade trazia a confortante sensação de segurança à Lauren, de que não importasse nada, naquele momento estavam sendo honestas.

A aeromoça não deixou de perder os olhos no vestido de Karla Camila, e era perceptível seu interesse no corpo e na face da mulher, visto que não desviava, e não se intimidava em encará-la e notar cada detalhe de seu decote.

— Fui acostumada a lidar com situações desgastantes desde muito cedo, e isso me consumia por completo, mesmo que depois de compreender já não tivesse o mesmo impacto em mim como outras coisas. Perdi meu pai em um acidente de carro quando ainda estava em ascensão com a minha empresa. Ele levava a amante junto, e foi polêmica o suficiente para tecer bons conflitos sobre minha família, depois de todo o contexto trágico a família da amante veio com pedidos judiciais e manipulações, indenizações, ameaças em tons negativos e destrutivos... Posso confessar que tudo isso carregou traumas inescapáveis para mim, porque eu sabia que estávamos sob uma injustiça, e mesmo assim fiz o que foi possível dentro dos meus limites financeiros para ajuda-los. Deixe-os em posição de privilégios financeiro sem esforço, e mesmo assim só se aproximavam de Ally e eu porque queriam mais do dinheiro, eram gananciosos. Essa atitude deles foi emblemática por ser minha primeira vez lidando com interesses desviados, estes aos quais já dominam minha realidade diária, muitos só querem privilégios que eu possa dar, é cansativo, massivo me colocar sob uma perspectiva de bloqueio com quase todos à minha volta por temer levar uma facada nas costas. – Seu tom de voz era brando, havia muito controle em suas ações, a concentração em Lauren demonstrava que queria ser justa em expor aquilo que sempre lhe incomodou e fazia parte de si.

— Sinto muito sobre seu pai... – Sua voz baixa em tom delicadamente empático deixava claro que a notava e se importava, e que Lauren tinha de si uma facilidade tremenda de tirar informações e fazê-la falar, mesmo que toda a história de seu pai ainda fosse um drama não resolvido que lhe custava noites de insônia e pensamentos desconexos por dias aleatórios.

— Perco capacidades as quais não perderia com outra mulher quando estou à sua presença, sabia? - O sussurro de Karla Camila e seu olhar que negava a ser desviado deixava explicito sua honestidade. Lauren não sabia entretanto, o quão honesto aquilo podia ser em comparação ao que soava, odiava ter uma visão tão turva sobre realidades.

Sofrer tanto em sua vida, lhe trouxe doses de ceticismo que não traria se tivesse crescido sobre outra realidade.

— Decidiu ser honesta demais essa noite, ou decidiu me iludir de tal maneira que me deixasse uma impressão muito gloriosa sobre uma suposta honestidade. - Lauren lhe citar aquilo era sem dúvidas um ponto que a fazia desviar o olhar e lancinar ao sentir que suas palavras lhe afligiam muito além do que deveria.

A quem devia atribuir suas indagações tolas? Uma mulher que havia acabado de a conhecer não confiaria a si com tamanha facilidade. Só não conseguia confundir seu subconsciente que machucasse ao menos um pouco receber desconfianças quando se abriu tanto, falando de tópicos que a atingia muito.