Corpo Pequeno, Coração Grande

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Capítulo inspirado na musica Cry Baby

O silêncio era cruel.

Cry Baby estava deitada em sua cama vermelho escarlate, cor por qual ela nunca tivera muita afeição, coberta com seu lençol estampado de cupcakes rosas e azuis. O ar frio lhe aconchegava, a manta quentinha envovia-a num abraço.

Era lá que ela queria ficar, no frio, no escuro, se encolhendo até desaparecer.

Porém, o dia estava surgindo, o sol estava dando as caras, a luz começava a penetrar pelas venezianas da janela. O mundo estava se despertando, e a mãe de Cry Baby também.

Ela era uma boa pessoa, no entanto, passava a maior parte do tempo perturbada, estressada, e tudo era efeito das garrafas de bebida que lhe acompanhavam durante todo o dia, durante toda vida.

Tanta angústia, tanto rancor... e mais lágrimas emergindo da escuridão.

- Cry Baby! - gritou sua mãe enquanto batia violentamente na porta - Já está na hora de se aprontar para a escola!

Cry Baby não respondeu, fingiu ainda dormir.

- Não me faça arrancar-te da cama!

Estava preocupada. A menina não gostava de irritar a mãe, tinha medo que ela surtasse, mas não queria ir pra escola, era péssimo.

- CRY BABY! - dessa vez ela gritou pra valer.

Cry Baby estremeceu. Seus punhos cerraram, seus lábios contraíram, seus olhos se apertaram.

- Oi... Mãe.

- Vamos! Levante-se!

- Mas...

- Nada de mais! É hora de despertar e você sabe disso! Não chamarei outra vez.

Cry Baby apertou o lençol com as mãos e fez uma bola, jogou-o na parede, baixou a cabeça. Seus olhos começaram a lacrimejar. Era sempre assim, chorar já havia se tornado um hábito, lágrimas desciam de seu rosto sempre que ela se encontrava numa situação difícil, e sua casa era cheia dessas situações.

Ela se levantou da cama, tirou as pantufas e pôs-se a caminhar lentamente em direções sem sentido pelo quarto. Ora caminhava ao espelho, ora caminhava ao guarda roupa, ora caminhava até a uma parede, batia a cabeça e voltava à jornada infinita. Desesperada, não sabia o que fazer para ganhar tempo, deduziu então, que a única maneira seria enfrentar mais um dia com aquelas crianças azedas.

Cry Baby sentia-se como uma gota de chocolate em meio a creme de limão. E ela não gostava de nada agridoce.

Correu à porta e decidiu abri-la, seus passos eram lentos e cuidadosos, queria tentar parecer o mais normal possível, mesmo que por dentro suas emoções estivessem explodindo. Os olhos correram pela escadaria e pela decoração, quadros antigos com molduras redondas e ovais decoravam a casa inteira, rosa e roxo cobriam as paredes principais e coloriam a vida monótona e sombria das pessoas que habitavam o lugar. Cry Baby via tudo isso com clareza, e às vezes poderia até sorrir, mas a cascata de lágrimas continuaria despencando dentro dela.

Tomou fôlego e desceu as escadas que a levariam para o próprio inferno, o inferno da família, o inferno dos amigos, da escola, da convivência.

- Da próxima vez que eu lhe chamar - anunciou a mãe enquanto enchia com iogurte uma tigela de cereal - quero que responda da primeira vez, já basta o que eu passo nessa casa, não tenho paciência pra aturar seus choramingos.

Cry Baby - Através das CortinasOnde histórias criam vida. Descubra agora