Naquela manhã, inteiramente amarga e ensolarada de um jeito bem irritante, Carol estava, mais do que ninguém, com vontade de jogar tudo para o alto, pegar um cobertor e voltar a dormir como fazia nos finais de semana, onde não tinha que trabalhar.
Mas tinha um só motivo para ela ainda estar ali, sentada sobre uma cadeira dura olhando para livros transbordando nas bordas da mesa, e seu nome era Abraham.
O velho prometeu na noite anterior que contaria uma de suas histórias para ela.- Certo, certo. Chega de euforia, eu estou aqui. - disse enquanto caminhava do outro lado da sala com uma xícara lascada de café.
A presença do senhor despertou o interesse da jovem que, agora, punha a passar seus dedos nos livros empoeirados e velhos.
- Qual será? Qual? - Abraham perguntava a si mesmo enquanto mexia, inquieto, sua mão atrás das costas.
Um livro pesado, roxo e de capa macia alcançou os olhos negros da jovem menina que logo o pegou e, com ele em mãos, sorriu.
- Que tal esse?
- Esse? - Abraham fez uma cara de desgosto e retrucou. - Esse não há nada para contar. Apenas de uma menina que eu conheci...
- E ela era importante para você?
- Um pouco, quem sabe?
- Então! - os lábios de Carol ser prenderam em um sorriso. - Por favor, Abraham!Ele concordou. Afinal, por algum motivo, aquele sorriso o fazia lembrar de quando ele ainda era jovem.
A história, consoante o velho, contava a vida de uma menina de cabelo castanho e olhos lindos da mesma cor. Ele a viu crescer e a viu, também, se tornar uma poderosa pessoa e ela não tinha poder político ou absoluto ou real, não. Nada disso. Ela era apenas ela. Com magias incríveis e amigos que nunca a esqueceram, bem, talvez só uma vez.
Contou que nunca havia conhecido uma pessoa tão corajosa quanto ela e que seus amigos eram, na verdade, sua família porque a verdadeira nunca a aceitou.- E o que aconteceu com ela? - perguntou tão interessada que não parava quieta.
- Eu não sei. - respondeu Abraham, abanando as mãos. - Eu sumi depois que me acertaram com magias fortíssimas.
- Ah. E você se lembra como conheceu ela?
- É claro. Era véspera de Natal e me lembro que ela e seu irmão vieram pedir moradia ao meu anfitrião.Antes que ela pudesse perguntar mais alguma coisa, o velho se levantou e foi para a cozinha e pediu para que não o incomodasse.
Era loucura. Loucura saber que existiu alguém tão forte e determinada assim.
Carol queria ser assim, também.(...)
Anos se passaram e, hoje, a menina fraca de apenas 6 anos estava forte e com 14, inspirada a se tornar isso por causa daquela história.
Desde que os treinamentos começaram, há 8 anos atrás, Carol se tornou incrivelmente invencível e com o mesmo potencial carismático de sempre.
Arco e flecha era o que ela, por paixão, carregava nas costas.- Carolina!
A menina correu até o aposento de Abraham logo que ouviu seu berro chamando por seu nome.
Desajeitada como sempre entrou no quarto e cambaleou até seus livros.- Sim?
- Como hoje é seu aniversário de 14 anos quero lhe dar o meu presente.
- E o que é? - perguntou, curiosa, enquanto arrumava o vestido branco.
- Por favor, pode entrar!Uma moça de mesma altura e peso de Carol, belos fios negros trançados, branca, talvez mais branca que a luz, e de lindos olhos caramelo escuro entrou no quarto e sorriu.
Suas botas batiam no chão enquanto andava e seu vestido roxo encantava os mal olhos que nele poderia ter.- Olá, Carol. - sua voz era suave, um pouco rude e em alto e bom som.
- Ah, oi. - já a voz da menina era áspera e cansada como se aquele presente não lhe agradasse.Para a surpresa da jovem a desconhecida estava cada vez mais perto dela e quando se deu conta, já estava envolvida no abraço da moça.
- Com licença, mas eu te conheço?
- Ah sim, claro. Você não se lembra, mas eu sou, ou deveria ser, a famosa Maitê.Aquilo caiu sobre as costas de Carol como uma apunhalada. Ela se lembrava muito bem da melhor amiga que ajudava a fugir da mãe.
Era loucura pensar que algo tão frágil e perigoso como um guarda chuva pudesse se tornar um ser humano tão lindo e sem falhas como Maitê.
- Minhas queridas, dou-lhe a vocês o poder da ligação direta. - disse o velho, em meio a tosses.
Ligação direta, para os desinformados era uma magia poderosíssima que mantinha um ser cuja a ligação é muito forte com outro. E isso era o que ambas tinham uma com a outra.
Uma fita rosa com lindos círculos avermelhados, ou melhor, uma corrente uniu seus pulsos e dps se soltou, ficando uma corrente para cada uma.- Isso - afirmou, apontando para os pulsos. - vai unir vocês duas e...
Antes que pudesse terminar de falar, Abraham fora interrompido por sangue que, agora, escorria de sua boca para suas vestimentas casuais.
- Chegou a hora, Carol. Ache a sua mãe. - disse, deitando em sua cama com cuidado.
- Seu velho idiota! Por que só me apresentou a Maitê agora? - sua voz agora era, nada mais nada menos, do que um monte de palavras que corriam na margem do rio que era suas lágrimas.
- Sabe, menina? Eu já fui um monte de coisa, acredite. Um demônio, um mago, um destruidor de vidas mas nunca um velho idiota. - respondeu. - E... Eu só lhe apresentei a sua querida Maitê agora, pois sabia que a minha hora chegaria e não seria mais esse velho, nesse corpo. Talvez eu volte a ser uma xícara...Se gostar da história clica na estrelinha, por favor!
Se liga nas referências, tá?
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Carol [Conto]
Short StorySe Carol acreditava no destino e essas coisas de astrologia? Isso era apenas coisas de criança para ela. Afinal, se isso existisse ela não teria tais marcas pretas e cicatrizes que sua mãe deixara em seus minúsculos membros, ela não viveria na misé...