III.

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"Daniel, você está pronto? O príncipe já está aqui!"

Saí do meu quarto e caminhei até a recepção do palácio lentamente, nada ansioso para conhecer o homem que passaria o resto da vida ao meu lado.

Ao descer as escadas, me deparei com uma família extremamente clara, pareciam não ver o sol a décadas, todos tinham olhos azuis como o céu. Um deles em especial me chamou atenção, mais alto que seu irmão, porém mas mais baixo que seu pai, tinha cabelos negros, diferentes do resto da família ruiva -tingido, pensei.- Ele não parecia satisfeito de estar em tal lugar, batia o pé, olhava para seu celular e roía a unha do polegar, entediado.

Como a figura da realeza que vulgo ser, me juntei a minha família, olhei dentro dos olhos claros do monótono rapaz e tentei formular uma saudação que representasse o meu posto como sucessor de trono. Senti a tensão correr solta pela sala, era a minha deixa.

"Eae." Disse, logo me arrependendo. Eae? Quem se apresenta com eae?

O garoto arregalou os olhos e tentou controlar o riso, mas explodiu em gargalhadas.

Sua risada era adorável, seus dentes levemente desalinhados mordiam sua língua, tentando conter-se. Me peguei sorrindo diante de seu riso, mas logo me fiz sério e esperei o rapaz se recompor.

"Perdão." Disse o rapaz, ao parar de rir, mas o sorriso culpado estampado em seu rosto mostrava que ele não se arrependia de nada.

"Daniel James Howell." Estendi minha mão.

"Philip Michael Lester." Ele a apertou.

Fomos todos em direção à sala de jantar, que só era utilizada em momentos absolutamente importantes. Lá, havia uma mesa farta, com todas as iguarias possíveis. Philip continuava entediado, olhava tudo ao seu redor como se nada o impressionasse. Pensei em fazer contato, mas ele parecia muito distante.

"Muito obrigada por essa oportunidade. Nós de Gelasia desejamos um futuro próspero para o reino de Alphenor." Disse a rainha de Gelasia, que, com todo o respeito que me foi ensinado ao longo da vida, parecia estar em seus últimos anos.

"Nós agradecemos e desejamos a mesma prosperidade para o vosso reino." Minha mãe sorriu. "É uma grande honra poder celebrar este matrimônio entre os sucessores, não só de nossos tronos, mas de nossos ensinamentos, costumes, princípios, os sucessores de nossos nomes, os nossos sucessores." Ela levantou uma taça com vinho, em menção a um brinde. "Aos futuros reis de Alphenor. Daniel e Philip."

Sem outra alternativa, levantei minha taça cheia de água e brindei com a de Philip, que também não parecia muito animado com a  ocasião.

Depois de jantarmos, minha mãe sugeriu que fossemos ao quarto que fora designado a nós. A cada passo que dávamos em silêncio, eu sentia a ansiedade aumentar e, proporcionalmente, o constrangimento.

"Então... O  que você gosta de ouvir?" Eu soltei, na tentativa de quebrar o gelo.

      O caminho da sala de jantar até o  quarto parecia não ter fim. 

"A minha banda favorita é My Chemical Romance." Ele disse, sem fazer  contato visual.

"A banda não acabou por volta de 30 anos atrás?" Perguntei.

"35. Mas ainda é muito recente, não fale sobre isso, machuca meus sentimentos." Philip colocou as mãos sobre o peito, como se o assunto machucasse seu coração e eu ri. "Eu estou brincando, obviamente. E você?"

"Também sou grande fã de My Chemical Romance, mas tenho um gosto especial por Twenty One Pilots. Minha governanta os apresentou para mim, mas só posso ouvi-los com fones de ouvido, do contrário, a minha mãe enlouquece. Ela não gosta que eu ouça nada que fuja muito da área de música clássica."

"Twenty one Pilots... Absurdo como dois conseguem ter uma banda há 38 anos e, ainda assim, ter como incógnita o estilo musical."

"Eu acho que a melhor descrição pra musica deles é indie punk rock pos-screamo alternativo emo com ukulele e electro pop."

"Isso é bem específico. " Ele riu. "Mas eu devo concordar." O silencio se re-estabeleceu.  "As vezes você se cansa de tudo isso?"

"O que você quer dizer com "tudo isso"?"

"A linguagem apropriada, ter que se conter diante a tudo, quer dizer, quando foi a ultima vez que você gargalhou de algo sem se controlar? Ou gritou a letra de sua música favorita, chorou até cair no sono, bebeu até não lembrar mais onde estava, xingou alguém, beijou alguém que nem conhecia, disse pra alguém o que você realmente sentia por ela?" Philip perguntou.

"Nunca.  A realeza não tem tempo pra isso, Philip."

"Sim, Daniel, porém a realeza só não tem tempo pra isso porque a realeza não quer ter tempo pra isso."

Ele saiu marchando na frente e eu o segurei pelo braço.

"Eu não quero dificultar as coisas, eu juro. Eu só não sei viver de outro jeito." Eu disse.

"Sempre há tempo pra aprender." Philip respondeu. "Mas eu temo que você não queira viver de outro jeito..." Ele disse. "Vamos?" Ele perguntou e eu assenti com a cabeça, o guiando até o quarto que seria, de agora em diante, nosso.

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