Os sessenta e seis livros que compõem a Bíblia protestante foram originalmente escritos em três línguas diferentes: hebraico (a maior parte do Antigo Testamento), aramaico
(língua irmã do hebraico, usada em boa parte de Daniel e em duas
passagens de Esdras) e grego (todos os escritos do Novo Testamento).
Podemos presumir que a maioria dos leitores deste livro não conhece tais línguas, o que significa que a ferramenta básica para leitura e
estudo bíblicos é uma boa tradução da Bíblia em língua materna ou,
como discutiremos neste capítulo, várias boas traduções.1
No último capítulo, vimos que o simples fato de você ler uma
tradução da Palavra de Deus já implica envolvimento conTuma interpretação — quer você queira, quer não. È claro que o fato de ler
uma tradução não é algo ruim; é simplesmente inevitável. Contudo,
a pessoa que lê a Bíblia apenas em sua língua fica, em certo sentido,
à mercê de tradutores, pois tradutores com frequência fazem escolhas para expressar o que os originais em hebraico ou grego realmente queriam dizer.
O problema de usar uma só tradução — por melhor que seja —
está no perigo de se depositar total confiança nas escolhas exegéticas
1 Neste capítulo, o autor baseia-se na discussão de traduções inglesas, que foram
respectivamente traduzidas para o português, respeitando-se os comentários do autor.
No restante da obra, em casos em que o autor não discute a tradução, mas apenas faz
citações, foram usadas traduções em português equivalentes [N. do T.].
da tradução da Palavra de Deus. Certamente, embora a tradução que
usamos possa estar em grande parte correta, nem sempre isso acontece.
Verifiquemos, por exemplo, estas quatro traduções de lCoríntios
7.36:
NKJV: "Se qualquer homem julga que trata impropriamente
a sua virgem...".
N A S b /u : "Se qualquer homem julga que trata de modo
inconveniente a suafilha..?.
TNIV: "Se alguém se preocupa com o fato de não estar agindo de
forma honrosa com a virgem de quem está noivo...".
NEB: "Se um homem tem uma noiva em celibato e sente que
assim não está agindo certo com a sua noiva...".
A NKJV é bem literal, mas não muito precisa, uma vez que torna
ambíguos o termo "virgem" e a relação entre esse "homem" e "sua
virgem". De uma coisa você pode ter certeza absoluta: Paulo não
pretendia ser ambíguo em sua fala. Apenas uma das outras três op
ções correspondem à sua intenção, e os coríntios, que tinham levado
o problema para Paulo, entendiam bem o que o apóstolo pretendia
dizer; assim, sequer cogitavam a existência de outra interpretação.
E preciso notar aqui que nenhuma das outras três versões é uma
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