Capitulo II

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"Todo mundo é capaz de dominar uma dor, exceto quem a sente."

William Shakespeare

Rebecca tentava se distrair jogando Tetris no ultrapassado computador da Balzac's. A cada minuto desviava seu olhar do jogo, e direcionava-o para o relógio cuco na parede, na esperança que 00:00 já tivesse chegado, e ela pudesse fechar logo o estabelecimento e ir embora.

Quando o sino sobre a porta tocou, a atendente deu um suspiro cansado, e olhou para a entrada, se deparando com dois jovens de mãos dadas, ofegantes e com sorrisos marcados em seus rostos. Xingou-os em sua mente, por estarem interrompendo sua noite calma e silenciosa, trazendo para o local, uma animação, a qual ela não compartilhava. Os dois escolheram uma mesa, e depois de se acomodarem, ela andou até eles, desejando que o atendimento fosse rápido.

Julieta não ficou satisfeita ao ver que a atendente esboçava uma feição ranzinza, como se a presença deles a incomodasse. Parece que todas as pessoas que ela encontrava ultimamente, não comportavam a mesma alegria que ela tentava levar sempre em suas feições.

Depois de pedirem um café para cada um, os dois mergulharam em um silêncio desconfortável, sem saberem ao certo por onde iniciarem a conversa.

- Então, o que o aflige senhor desconhecido que encontrei na rua há cinco minutos?

- Não acha que deveríamos começar pelos nomes? – respondeu Henry, com uma sobrancelha levantada.

- Prazer Julieta – a garota estendeu a mão sobre a mesa. Henry devolveu o cumprimento, percebendo que sua mão devorava por completo a de Julieta.

Os dois permaneceram com as mãos unidas, até Henry perceber que não tinha se apresentado, e um pouco desajeitado, falou seu nome. Rebecca surgiu novamente, e entregou os cafés, voltando a seu lugar em frente ao computador, de vez em quando lançando olhares furtivos para o casal a sua frente.

- Não acredito que ela teve coragem de fazer isso! – exclamou Julieta, chocada com o que Henry lhe contara. – E com seu melhor amigo?

Doeu em Henry ter de colocar essas palavras pra fora, admitindo tudo que tinha acontecido naquele dia. A surpresa da moça, em nada se assemelhava a dele. Quando recebeu o bilhete deixado por Sara, seus sentimentos entraram em conflito, indo da raiva por não ter desconfiado de nada daquilo, a tristeza, de ter perdido a pessoa que mais amou no mundo. Não sabia ao certo o que fazer, por alguns instantes ficara desnorteado, todos na igreja curiosos para saber o que tinha acontecido. Era certo que o atraso da noiva, é algo bem comum, mas quase meia hora chegava a ser um exagero.

- Eu cheguei a pensar, que tudo podia ser culpa minha...

- Não ouse dizer isso. Ela... qual o nome mesmo? – interrompeu Julieta furiosa com afirmação do rapaz.

- Sara.

- Essa tal de Sara não deveria ter chegado ao ponto de aceitar um casamento, se mantinha as escondidas um relacionamento com seu melhor amigo.

- Mas se eu não tivesse sido tão burro, e percebesse os detalhes, isso poderia ter sido evitado.

Os olhares trocados com Daniel. Os encontros desmarcados para se encontrar com alguma amiga, ou mesmo terminar algum trabalho de faculdade. Se não tivesse ficado tão cego de amor, provavelmente todo esse escândalo tivesse sido evitado. Tudo estava simplesmente na sua cara, e talvez Henry tivesse escolhido fechar os olhos para aquilo tudo. Talvez com tanto tempo vivendo sob a indiferença de seus pais, tivesse-o deixado carente por alguém que o tratasse com o carinho e respeito que Sara o tratava.

- A culpa não é sua se resolveu confiar que ela era uma garota boa, talvez tenha tido motivos para isso. – falou Julieta, com a xícara em uma mão, e a outra sobre a do rapaz, que se surpreendeu com o toque, que transmitia toda a sua solidariedade. A garota fizera aquilo de forma inconsciente, se dando conta de seu gesto depois de alguns segundos, mas depois de retira-la, sentiu um formigamento, como uma lembrança da presença da mão de Henry ali. – Se continuar a se culpa, eu jogarei todo esse café quente em sua cara, então trate de esquecer esses pensamentos ridículos, e deixar essa Sara no passado, porque é isso que ela é: Passado.

Apesar de ter dedicado grande parte da sua vida aquele relacionamento, Henry tinha que admitir que a moça estava certa, não podia se lamentar o resto da sua vida por uma pessoa que com certeza já estava a quilômetros dali, fazendo planos para um futuro, em que provavelmente ele seria esquecido. Não se lamentaria dos anos que passaram juntos, mas simplesmente se forçaria a lembrar somente dos momentos felizes, e tentaria esquecer o dia de hoje.

- Você parece ter muito conhecimento sobre o assunto.

-Humm?

- Disse que parece saber bastante sobre como é... ser traído...

- Não traição exatamente – divagou Julieta amargamente.

- Como disse? – questionou Henry, confuso sobre o que ela tinha dito.

A garota deu um meio sorriso, mas que não alcançou seus olhos. Não se sentia confortável para compartilhar algo tão intimo com um completo desconhecido. Apesar de Henry ter se mostrado bem aberto, os problemas de Julieta iam muito além de uma traição descoberta depois de anos de namoro. Finalizou seu café com um único gole, e levantou da mesa mudando de assunto.

- Vamos?

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JulietaOnde histórias criam vida. Descubra agora