Cliente

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Não tive tempo sequer de arrumar minha mesa. Martha tinha acabado de atravessar a porta e ouvi meu nome sendo pronunciado por um dos funcionários de atendimento. Ele me apontava para uma ruiva de cabelos curtos, calça jeans clara e camiseta branca. Simples. Básica. Poderosa.

- Olá, você é Gregório, o gerente que está substituindo a Martha, não é?

Acenei positivamente com a cabeça tentando não parecer um retardado mental. A verdade é que eu estava embasbacado. Ela era linda! Linda como uma modelo profissional, se você me entende. A roupa justa demonstrava um corpo com mais curvas que a estrada de Santos. Seu sorriso aberto era simpático, mas também imperativo. Olhava-me nos olhos com uma confiança que me obrigaram a desviar o olhar. Senti o sangue fervendo por dentro. A simplicidade era só uma casca. Tudo naquela mulher era sofisticação. Do perfume que usava à maneira como se portava. Uma rainha. Não encontrava outra palavra para nomea-la.

- Posso sentar?

- Ah, claro, mas que idiotice, a minha! Sente-se, fique à vontade. Perdoe-me. Em que posso lhe ser útil?

Seu batom, que era de um vermelho diferente de tudo o que eu já vira, correu lateralmente em direção às orelhas. A ponta da língua surgiu levemente entre os dentes brancos dando ao sorriso um tom malicioso que não compreendi muito bem.

- Espero que possa ser útil em muitas coisas, Greg. Posso chama-lo assim, não é? Martha usou esse apelido e achei bastante simpático.

- Pode me chamar como quiser, senhora, estou aqui para servi-la.

Abri meu melhor sorriso tentando parecer gentil. Agrade-a, disse-me Martha. Aquela mulher era minha mina de ouro e eu estava me esforçando para conquistar sua confiança. E pelo visto ia bem, porque o sorriso dela ficou ainda mais escancarado. Ergueu levemente o queixo com atitude de autoridade.

- Você está se saindo muito bem. É... Martha não mentiu. Você é mesmo especial.

O risinho que exibia agora não parecia combinar com seu jeito autoritário, mas não dei importância. Estava gostando de mim e isso era a única coisa que me importava. Digitei minha senha no sistema e abri nosso programa de carteiras de investimento. Não conseguia tirar os olhos dela e, diga-se de passagem, a recíproca parecia verdadeira. Na verdade, eu seria capaz de dizer que ela me comia com os olhos. Desejei ter tirado o paletó antes de sua chegada. Minha camisa justa com certeza faria sucesso. Além do mais estava ficando muito quente. Será que o ar condicionado tinha quebrado novamente?

- Você deseja aprimorar seus investimentos, não é isso?

- Podemos dizer que sim.

- Ótimo. Sou um especialista no mercado de ações...

- ... estou certa de que sim, Martha já me disse suas qualidades.

Disse? Mas eu acabara de inventar! Nunca mentira tão descaradamente para um cliente. Era o fato de ela ter dinheiro ou era o desespero que me fazia agir assim? Não me sentia confortável explorando trabalhadores. Mas aquela mulher... aquilo era diferente. Dinheiro era algo que não lhe faltava. Eu só queria que os centavos da conta dela caíssem na minha. Não era nada tão feio. Era mais decente do que enganar as classes C e B, coisa que meus colegas faziam com a maior cara de pau desse mundo.

- Para começarmos, poderia me dizer o número de sua conta?

Ao invés de responder Gabrielle colocou um cotovelo na mesa, apoiou o queixo na mão e observou-me tão perto que seu perfume me tonteou. Ou foi sua beleza?

- Quando fez a barba pela última vez?

- Hoje pela manhã...

A resposta saiu automática. A pergunta me desconcertara. Eu tenho esse péssimo hábito de obedecer sempre que sou pego de surpresa. Sabe aquelas pessoas que precisam aprender a dizer não para se dar bem na vida? Então, sou assim. Quando não sei o que fazer, concordo. Com a situação, com a pessoa que fala comigo, com qualquer coisa. Depois, à medida que o cérebro processa a informação, vai batendo um arrependimento...

- Não a faça mais. Você ficará bem mais viril de barba.

Meu queixo deve ter batido na mesa e depois voltado. O tom de sua voz era imperativo e seu olhar duro, autoritário. Fiquei indignado. Ou ao menos uma parte de mim ficou. Porque meu pau, inexplicavelmente, cresceu na calça.

- Ok... ahn... bem... qual é mesmo o número de sua conta?

Ao invés de responder a ruiva poderosa consultou as horas em seu relógio de pulso e se colocou de pé.

- Lamento, meu lindo, mas estou em cima da hora para outro compromisso. Finanças é assunto sério, não quero tomar uma atitude precipitada. Leve suas melhores propostas em minha casa hoje à noite. Eu espero você a partir das vinte horas. Não se atrase, odeio esperar!

Jogou um cartão de visitas em minha cara e saiu rebolando em direção à porta. E que rebolado! Que corpo!

Suspirei e relaxei na cadeira. Peguei o cartão e fiquei tentando entender o que havia acontecido. E de repente meu peito gelou. Eu tinha um compromisso com Flávia. Não podia ir à casa da ruiva gostos, digo, poderosa.

Que merda, que merda! Martha ia querer me matar. Mas, puta que pariu, quem essa milionariazinha pensa que é? Não tenho obrigação de atendê-la fora do horário! Trabalho no banco até as dezesseis, o resto do tempo me pertence.

Então, como se alguém tivesse retrocedido a faixa, ouvi nitidamente a voz de Martha me dizendo ela é rica, ouça-se mimada e mandona. E era exatamente isso que ela era. Que inferno!

Ainda não era dessa vez que eu ia sair da merda. Trabalhar à noite estava fora de cogitação. Ainda mais no dia em que marcara um jantar com Flávia. Martha ia ter que entender.

O GerenteOnde histórias criam vida. Descubra agora