Dois

564 158 40
                                    

|Nicolas|

Por volta das cinco da tarde o café ainda estava tão cheio que era quase impossível caminhar entre as mesas. O sol começara a se pôr, enchendo o céu de tonalidades diversas de laranja, dando algo a mais na vista. No entanto, aquela claridade causava uma irritação nos meus olhos que me fez fecha-los o tempo todo. As garotas da mesa ao lado parecem achar que aquilo é um toque ou até mesmo uma espécie de paquera, já que estavam lançando sorrisinhos a todo instante.

Alguns turistas permaneciam a beira do rio, mesmo quando a água estava fria demais para um banho. Mas afinal, Eric's era um, se não o maior, comércio a beira do rio das redondezas, recebendo turistas e cidadãos do país inteiro. Sendo famoso por servir variadas bebidas quentes e petiscos aquáticos. Além de várias comidas refinadas que ele trazia todas as semanas para o local. Porém, todo o status não fez com que o Eric deixasse sua humildade e bondade de lado. Tinha o conhecido a três anos e sempre o via servindo comida para as pessoas mais necessitadas assim que saia do trabalho. Sendo um dos exemplos de comportamento para todos os novos moradores daquela parte do município, e, principalmente, para o filho do prefeito.

Gael estava falando a quase vinte minutos, ainda assim, não consegui absorver quase nada do que dizia, tão pouco conseguia o encara-lo. Talvez por achar que essa conversa era totalmente desnecessária, ou por saber que o único assunto falado era mulheres. Assim como nas quatro vezes que sentamos nessa mesma mesa, todos os meses, fingindo ainda manter uma amizade que acabou a muito tempo, eu e ele não éramos os mesmos de anos atrás, quando tudo se resumia a beber e se envolver em romances de uma noite, ele tinha se tornado um dos bons advogados da capital, eu estava noivo e tinha uma reputação de filho de um político a zelar, cada um carregando seu próprio fardo, vivendo vidas completamente diferentes. Só insistia nesse tipo de encontro por querer ter algo que me lembrava o passado, o único marco que me fazia sentir vivo era saber que anos atrás estava com tudo que queria nas mãos, mesmo o perdendo em questão de segundos.

-A noite foi boa?-o rapaz me despertou dos devaneios, seu tom era baixo e mais alegre do que deveria, era perceptível a malícia em sua pergunta, o que era de se esperar de um tipo como aquele, mulherengo e destrutivo. Revirei o olhos e lhe lancei um sorriso, como todas as vezes, fazendo do mesmo minha reposta. -Cara, estou começando a achar que preciso procurar uma loira.-Indagou. Seu polegar passou pela divisão das suas sobrancelhas, encontrando-se com uma pequena cicatriz, dei de ombros mostrando a indiferença sobre o rumo da conversa. Aquilo não era uma coisa bacana a se dizer, sabia que era um grande idiota também, mas ao menos essas merdas meu querido pai tinha me ensinando a jamais dizer.

-Eu acho que você deveria tratar as suas namoradas com mais respeito. -dei mais um gole na minha bebida, sentindo uma quentura bastante familiar, já estava na hora de parar, ficar bêbado perto dele era como dar doce para criança, ele iria se aproveitar e me perguntar todas as coisas sujas que tento esconder. - Tente não ser tão cafajeste, e assim, talvez, alguma permaneça.-

-Eu as trato com respeito.- Se defendeu, seus olhos estavam um pouco vermelho assim como seu rosto, como se tivesse tomado muito sol. Gael levantou a sua cerveja, e, antes de tocar nos lábios concluiu sua frase:-Mandei flores para a Carol ontem, ela não me ligou, mas tenho certeza que isso vai acontecer em breve.

Sua conversa fiada não fazia qualquer sentido, mesmo assim era divertido ter alguém que parecia não pisar em ovos enquanto estava conversando. O que acontecia com tanta frequência na minha vida, que a forma como falava me deixava até um pouco chocado. Gael virou um grande advogado, mas o seu lado de menino doido ainda não tinha se desligado completamente. Não era meu refúgio quando as coisas estavam ruins, nem tinha o poder de me tirar de todo aquele caos. Entretanto, como quando ia ali tudo se resumia a ficar vendo o pôr do sol e cumprimentar as pessoas, ele parecia até agradável, para alguns minutos sem pensar em nada mais preocupante.

Meu eterno "e se..."Onde histórias criam vida. Descubra agora