Três

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Katherine

Sempre tive a sensação de estar vivendo a história dos outros, seguindo a correnteza e me agarrando em rochas escorregadias demais. Era como se não fosse pertencente da minha própria vida, isso era justificável quando tinha os meus dezessete, mas, depois de tudo que tinha passado isso deveria sumir. Ainda assim, isso continuou comigo até depois que saí daquela cidade, estava fugindo, não apenas indo seguir um plano concreto, vivendo para preencher os buracos, ainda estando no vazio. Se toda aquela merda não tivesse acontecido ainda estaria no mesmo lugar. Você ainda era meu, Nicolas?

Quando cheguei na minha terra o sol ainda estava terminado de se pôr e a briza leve e úmida me abraçou por completo. Dei um suspiro, tentando me manter calma enquanto tudo em mim estava em combustão. Aquele lugar tinha cheiro de terra molhada e café da tarde, uma cidadezinha pequena e aconchegante para alguns, para você o paraíso e o meu pesadelo.

Desci do ônibus no centro, perto da feira principal. O movimento ainda era grande e foi quase impossível conseguir encontrar algum táxi que me levasse para casa da minha mãe, o que fez com que eu tivesse que arrastar três malas grandes ruas a fora, tentando me lembrar de algum ponto que poderia pedir ajuda. Infelizmente tudo ali parecia mudado e nenhuma alma tinha me reconhecido. Era apenas uma turista estranha andando desengonçada, nem se tivesse vendo tudo de fora me ajudaria. Por fim, depois de começar a suar frio e precisar parar três vezes no meio do caminho para recuperar o fôlego, uma mulher morena parou o seu carro ao meu lado. Não a reconheci de início, apenas depois de ter tirado os seus óculos de sol e de sorrir para mim que sua imagem veio a minha mente. A minha tia Luzia, irmã mais velha da minha mãe, era a condutora do veículo.

—Katherine?–perguntou, tão surpresa que sua boca estava aberta em um completo "o". Tentei dar um sorrisinho, que saiu mais como uma careta de nervoso. Ela abriu a porta do passageiro e eu me coloquei para dentro, jogando as malas nos bancos do fundo.—Veio nos visitar sem ao menos dizer que estava vindo?

—Queria fazer uma surpresa.–respondi, meu tom estava mais doce do que o costumava usar. Entretanto, era comum parecer mais minada para a minha família. Você sabe, tinha que manter a face de ser gentil e feminina.—Mas tinha me esquecido que hoje era dia de feira.

—Pois é, essa cidade fica uma loucura em dias como esse.–ela colocou o carro para andar. Indo na mesma direção em que estava, para a casa da minha querida mãe. Seus olhos buscara os meus por alguns segundos, querendo entender algum sentimento ou esperando que eu lhe conte a verdade. —Sua mãe sabe que você chegou?

—Não, a última vez que conversei com ela foi a semana passada.–murmurei, ainda mais constrangida com a situação. Era claro que aquele tipo de pergunta iria surgir, só estava reafirmando como eu era uma filha desnaturada.—Não queria a preocupar com a viagem, a senhora sabe como é, ela ira ficar muito ansiosa pela minha volta.

—Compreendo.–disse, depois de alguns segundos de completo silêncio, era perceptível que não estava acreditando muito na minha desculpa.—Mas vou ao menos avisar o meu marido para comemorarmos a sua volta hoje a noite.

—Eu ainda estou muito cansada.

—Uma festinha não vai ter deixar em pedaços.–com isso ela aumentou a velocidade do seu som, impedindo com que eu dissesse qualquer coisa.

Em poucos minutos estavamos no bairro da minha antiga casa, o que me deixou ainda mais nervosa. Não estava preparada para todas as perguntas que estavam por vim, mesmo que isso tenha passado em minha mente diversas vezes enquanto fazia as malas, e tudo que tinha planejado era dizer "vim dar uma olhada em minha mãe, estou indo embora logo", não queria nem pensar no que iriam achar ao saber que estava indo unicamente para ver você sair correndo do altar, direto para os meus braços.

Meu eterno "e se..."Onde histórias criam vida. Descubra agora