Runaway - @LikeRavena

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"I've known it for a long time
Daddy wakes up to a drink at night
Disappearing all night
I don't wanna know where he's been lying
I know what I wanna do
I wanna runaway
Runaway with you
Gonna grab clothes, six in the morning, go"

"Sei disso há muito tempo, papai acorda para uma bebida à noite, desaparecendo a noite toda. Não quero saber onde ele está mentindo. Eu sei o que quero fazer. Quero fugir. Fugir com você. Vou pegar minhas roupas e ir embora as seis da manhã."

xxx

Ele não sabia ao certo que horas eram, mas ainda assim não se importou.

Não esperaria mais.

Sabia que o pai não estava lá. Era mais provável que estivesse em um dos bares da cidade, bebendo tequila e conversando sobre assuntos sórdidos com pessoas desprezíveis. Sentir-se culpado não era uma opção. Mas a culpa sempre martelava em sua nuca ao pensar na mãe, serena e alheia, dormindo em um dos quartos do andar de cima da casa.

Nate sabia que não podia fraquejar e jogar tudo para o alto por um súbito ataque de consciência; ele amava a mãe, e mesmo que tentasse esconder de si mesmo, sempre amara o pai. Apesar de tudo sempre os amara muito, e isso era difícil demais de encurralar para um canto esquecido de si.

Mas o que estava acontecendo? Ele perguntou-se. Ela estava esperando-o a menos de um quarteirão de distância de sua casa. Ela, seu sorriso singelo e a liberdade que ele sempre desejara. Aquilo serviu de estímulo para que continuasse; o simples ato de pensar nela fazia seu pulso dar pulos por todas as veias do corpo e o incentivava de forma muito eficaz a seguir em frente.

Com dezoito anos e apaixonado como jamais estivera, o garoto tinha a sensação de que poderia conquistar o que quisesse.

Ele passou as mãos impacientes pelos cabelos claros que percorriam-lhe a face, num ato de total nervosismo, e nem ao menos sabia o porquê exato de estar nervoso - afinal, já tomara aquela decisão há tempos. Iria sair de casa, realmente fugir. Iria levar a vida da forma como bem entendesse e estudaria a faculdade que tivesse interesse real em cursar. Ou talvez não cursasse faculdade alguma, ainda não sabia ao certo.

A enorme mochila verde-limão que estava jogada sobre a cama possuía um rasgo visível bem na parte da frente, mas ele o ignorava com destreza. Tudo o que fazia era espremer todos os objetos que julgava necessários dentro da velha mochila, para então fechar o zíper e colocá-la nas costas.

Saiu pela porta do quarto e nem sequer virou o rosto, nem sequer pensou em olhar o lugar onde passara toda a vida uma última vez; não havia tempo para desenterrar memórias, então apenas ergueu o rosto e prosseguiu.

Todos os cômodos por quais passava estavam inteiramente silenciosos e iluminados à meia luz. Atravessou a cozinha e sala de estar tentando produzir o mínimo de barulho que conseguia. Soltou um suspiro de alívio ao colocar as mãos na maçaneta da porta e abrí-la cuidadosamente.

Mal conseguiu acreditar quando um toque gelado passou por seu ombro e espalhou-se por suas terminações nervosas, alertando-o de que não, não estava só e não sairia sem ser visto como imaginara.

- Você vai sair a uma hora dessas?

Ele virou o rosto, dando de cara com a figura alta e robusta que lhe era muito familiar.

- O que você está fazendo em casa a uma hora dessas?

- É a minha casa, onde você esperaria que eu estivesse? - o homem retrucou.

- Bom, geralmente a esse horário da madrugada não é nada comum você estar em qualquer outro lugar que não seja um bar.

- Pare com isso, Nate.

- Parar com o que, afinal? Por acaso ouvir a verdade te incomoda tanto?

- Pare de agir como se eu não fosse seu pai.

- Você não age como um pai, mas ah, sim, quer que eu aja como um filhinho exemplar.

Nate apertou as alças da mochila contra as costas e decidiu não discutir - sabia que uma discussão não o levaria a lugar algum. Tudo o que precisava era sair pela porta, apenas isso.

- Nate, não. Aonde você pensa que vai?

- Eu não estou pedindo permissão.

O garoto empurrou a porta e estava prestes a atravessá-la quando sentiu o aperto forte do pai em um dos braços.

- Nate, o que você está fazendo?

- Eu estou me mandando - Ele quase gritou, sentiu a voz alterada sair sem que pudesse controlar. - vou embora e fazer o que todos fazem. Vou viver a minha vida.

- Ah, então é isso o que você pretende? Colocar uma mochila nas costas e sair por aí achando que o mundo é um parque de diversões?

- Não importa o que eu pretendo. Ou o que eu quero. Nada nunca importou pra você, então por favor, largue o meu braço e me deixe ir de uma vez.

- Não. Pare com isso, você não vai.

- Sou maior de idade, e posso fazer o que eu bem entender.

- Então você se jogaria de um penhasco só porque é maior de idade e pode fazer o que quiser?

- Já cogitei isso, mas não, não dessa vez. Me largue.

- Eu sou o seu pai.

- Eu sei, e não entendo por que você só lembrou disso agora. Mas já é muito tarde. Me deixe ir.

- Filho... eu não quero que... eu não que você vá. - Por um instante, a voz do homem pareceu fraca, mas ele não choraria, Nate tinha certeza. Seu pai jamais chorava.

- Desculpe, é tarde demais, pai. Diga a mamãe que eu a amo.

E saiu de forma furtiva pela porta; se alguém o tivesse visto poderia até mesmo dizer que estava correndo, fugindo. Não deu chance ao pai de poder segurá-lo outra vez e temeroso, apressou o passo. Só parou, arfante, ao avistar a cachoeira de cabelos castanhos que ele tão bem conhecia.

- Nate! - gritou, sorrindo graciosamente. - Cheguei a pensar que você não vinha e... o que? Você... está chorando?

- Pensei que não seria tão difícil deixá-los... mas... foi. - colocou as mãos nos ombros dela e respirou o mais fundo que pôde. - Esqueça, vamos embora.

- Vamos. - ela suspirou. Seu tom era exausto.

Ele segurou a mão da garota com uma firmeza que jamais segurara, e esperou. Apenas esperou que enquanto andassem pelas ruas a brisa gélida secasse as lágrimas e fizesse a dor antiga e conhecida diminuir.

Na hora exata, sempre queimava, sempre era insuportável. Mas diminuiria. Por sua longa experiência, ele sabia que sim.

likeravena

The Multiply ExperienceOnde histórias criam vida. Descubra agora