- A Hanna é filha de Íris - Skyler repetiu pela milésima vez, enquanto seguíamos de volta para o chalé de Hermes, como se o show pirotécnico de luzes proporcionado especialmente pela deusa mensageira não tivesse deixado o fato esclarecido o bastante.
Depois da cena chocante - pelo menos, foi o que presumi pela clima de assombro e incredulidade que tomou o refeitório após Hanna ser reclamada -, a recém descoberta filha de Íris saiu do pavilhão como um furacão e foi seguida por uma garota que eu não conhecia. Quis perguntar quem ela era, mas meus colegas de mesa logo começaram uma discussão acirrada sobre o que tínhamos acabado de presenciar e o pensamento fugiu da minha mente.
Quando o jantar acabou, nos reunimos com outros semideuses no anfiteatro, onde aconteciam as famosas fogueiras. Depois de assistirmos a alguns números musicais proporcionados pelos filhos de Apolo e uma competição de dança entre sátiros e filhos de Afrodite, Skyler e eu decidimos que tinha sido emoção o suficiente para um único dia e resolvemos voltar para o chalé 11. Foi então que ela reviveu o maior acontecimento da noite, quando passamos em frente ao chalé de Íris - esse que, por sinal, estava estranhamente silencioso - durante o caminho.
- Vem cá - aproveitei que ela tinha retomado o assunto para tirar uma dúvida que pairava em minha mente desde cedo -, por que o pessoal sugeria deuses e deusas quando estavam discutindo sobre quem eles achavam que era o parentesco divino da Hanna?
Skyler demorou o tempo que levamos para alcançar a entrada do chalé de Hermes para compreender a minha pergunta.
- Ah, é porque a Hanna é órfã. Tudo o que a gente sabe é que ela fugiu do orfanato em que morava dois anos atrás e veio parar aqui. Nós não sabíamos se ela era órfã de mãe ou o pai, por isso não sabíamos se ela era filha de um deus ou uma deusa - explicou, em um tom mais baixo. Sua expressão, pela primeira vez desde que a conheci no começo do dia, ficou séria. - A Hanna mora aqui no Acampamento, May. Ela não tem pra onde ir. Bom, até hoje, né.
Assenti para demonstrar que estava ouvindo, embora tenha ficado um pouco distraída ao chegar em uma conclusão repentina. Passada as emoções do dia, percebi o porquê de Hanna ter causado uma impressão tão forte em mim, e não era somente por conta da sua falta de empatia e hospitalidade com minha pobre pessoa. Havia algo nela que me incomodava e eu nem sequer sabia exatamente o quê ou o porquê.
Geralmente, eu costumava ser um pouco desconfiada com pessoas que não eram simpáticas ou amigáveis como Skyler, mas o sentimento sobre Hanna não parecia ser desconfiança. Era alguma coisa parecida com aquela sensação que se tem quando reconhecemos a melodia de uma música, mas não conseguimos lembrar o seu nome. Não importa o quanto tente.
Mas aquilo não importava. O que importava de verdade era o fato de que eu não teria mais que me preocupar com a hipótese de Hanna me matar enquanto eu dormia e somente torcer para que ela esquecesse a sua irritação comigo, uma vez que, no momento, estava mais ocupada com a sua nova situação familiar.
- Por que será que Íris demorou tanto tempo para reclamá-la? - perguntei a Skyler, quando alcançamos a sua beliche, porque ela tinha ficado de me emprestar uma roupa para dormir.
Skyler Eaton, meu novo guarda roupa pessoal.
- Não sei. - Skyler deu de ombros e me entregou uma nova muda de roupas. Era uma camisa com a letra de uma música de K-Pop e shorts de pano verde-limão. Achei tendência. - Sabe, depois da guerra contra Cronos, os deuses meio que prometeram ser mais atenciosos com a gente, mas não é como se eles seguissem essa promessa à risca. É por isso que ainda temos semideuses que ficam um bom tempo sendo ignorados pelo pai ou pela mãe deles.
Temi que esse fosse o meu caso. Nunca me importei muito em conhecer o meu pai biológico, visto que tinha uma família perfeitamente feliz, calorosa e presente em minha vida. Eu nunca chamei Jared de pai, mas sempre o considerei a figura paterna mais próxima que tinha - além de tudo, ele era um ótimo pai para minha irmãzinha, e isso era importante para mim. No entanto, agora que sabia que minha mãe tinha tido um romance com um deus olimpiano, seria legal saber quem ele era. E porque nunca tinha, sei lá, ligado para me desejar um feliz aniversário durante todos aqueles anos. Um ser divino não deveria ser tão ocupado assim, né?
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Aurora
FanfictionAurora Mayne tinha apenas um único e simples plano para sobreviver ao ensino médio: seguir todas as normas como uma boa garota até a temida faculdade. O plano corria nos trilhos até o dia em que, em uma aula de orientação em sua nova escola, a garot...