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Estou no escritório e me lembro que um chefe de empresa de automóveis vem para a reunião às 7:20. Sorte que são 7:10 e tenho tempo para me preparar. Não que eu já não estivesse me preparado horrores. Ontem, antes de sair, deixei tudo pronto e organizado. Me preparei tanto para o caso, mas nunca é demais uma revisão, não é mesmo? Ele é um cliente muito importante que veio com um caso muito complicado e toda a preparação é pouca. Estou com uma calça cintura alta bege, uma blusa de manga social vermelha apertada e um salto alto de 10 centímetros bem preto, de camurça. Fiz questão de passar uma maquiagem nada chamativa, mas pesei a mão no batom vinho. Não estou para brincadeira e quero nunca mais ouvir que o biel é meu ex. Cansei de sofrer e perder tempo. Vou ser feliz, já é hora. Tenho que falar com ele, temos que resolver isso. Por enquanto não vou ficar pensando na minha vida pessoal tão triste e fracassada, e vou me concentrar no caso. Como chefe, Gabriel vai vir comigo na reunião tão importante. E como um bom advogado preparado que ele é, está conversando desde que chegou em uma sala com os outros advogados. E não arrumando os papéis e se preparando. Como sei? Ele foi barrado quando vinha para cá, deve ser importante. Espero. Ainda bem que não vi ele, só de pensar na loira meu estômago revira e eu quero quebrar a cara dele. A reconciliação vai pro espaço e eu só quero bater muito naquele rosto tão bonito com a barba loira por fazer. Ele tinha que ter um sorriso tão encantador e um abraço que sinto tanta falta? Tinha que ter olhos que deviam ser punidos por serem tão brilhosos e encantarem quem olha? Tinha que me fazer abaixar tanto a guarda? Não se casem. Amor já é uma droga, agora o tempo passa, e isso faz com que você veja a pessoa, que a conheça nos mínimos detalhes, profundamente... E eu odeio admitir que, além do amor profundo que ele conseguiu de mim em cinco estúpidos anos... Levou junto a minha total admiração e respeito. Ele sempre esteve lá quando precisei e sempre me deu um amor incondicional. Sem pedidos, sem exigências sem trocas, sem nada. Simplesmente porque ele me amava. Além disso tudo, fez com que eu me orgulhasse dele. Um homem que correu atrás de nosso sonho de ter uma empresa. De como ele sempre me ajudou. De como ele, com 24 anos quis se casar. Tão novo, recém formado, lindo. E como ele sempre me amou e cuidou de mim. Uma lágrima solitária cai do meu olho, como pude perder aquele olho brilhante? Como pude deixar aquele homem tão magnífico me escapar? Porque não abaixei minha guarda, pedi desculpas e simplesmente fui ser feliz?
- Úrsula, terra. Juliano está guardando o carro. Vai subir agora mesmo.
- Por que não disse logo Jean?
Ele é um amigo de faculdade.
- Por quê estava te chamando? Ou acha que foi fácil sair de seus devaneios?
Ele começa a rir e eu fico pensando em como estava pensando tanto.
- Depois conversamos. Tenho que correr.
Vou até a sala, arrumo os papéis e espero que o Juliano chegue. Nem percebi mais biel já estava aqui, com os olhos pregados em mim, como se quisesse me questionar algo (o que será, não é mesmo?).
- Que cara é essa? Pode parar de me encarar, já me vê todo santo dia a tantos longos anos. Pode perguntar fofo.
Falo e ele está visivelmente curioso e um tanto quanto intrigado.
- O que estava fazendo lá?
Ele me pergunta sério, como se quisesse fazer outra pergunta que seus olhos denunciavam. Acho que já imagina qual seja.
- Estava arrumando os papéis para a reunião, não me atrasei como você fez questão de fazer ontem.
Me faço de boba, mas ao mesmo tempo dou uma alfinetada bem certeira. Quero ver seus olhos queimarem de ciúmes.
- No restaurante.
- Ha?
Adoro irritá-lo, já esta vermelhinho. Ele sempre vou tão transparente. E eu sempre admirei isso nele. Sorte que não tenho isso, pois se as pessoas te vêem, assim tão claramente, elas vai brincar com você. E eu não nasci para ser fraca.
- Foi jantar no La Paes.
Já consegui o que queria, vejo fogo em seus olhos, mas continuo dando respostas idiotas, me faço de desentendida mesmo:
- Amo a comida, você sabe não é?
-Costumávamos ir lá, amo alfinetar, quero ver culpa em seus olhos. O mínimo já que ele chamou outra para ir no nosso restaurante, poxa, foi onde me pediu em namoro. Qualquer um em meu lugar sentiria o que estou sentindo- Íamos sempre. Pera, como sabe que fui ontem?
- Então admite.
Assim que ele ia continuar com o surto de ciúmes, querido Juliano chega, e que gato. Com seus 28 anos, solteiro e bem alto, o encaro. Como vejo a cara de desconforto de biel, falo:
-Um prazer imenso conhecê-lo, senhor, Juliano Valmonty.
- O prazer é meu, senhora...
O corrijo, só para irritar biel.
- Senhorita
Ele me olha e sorri, enquanto biel respira fundo, visivelmente bravo.
- Senhorita Úrsula.
Aperta minha mão olhando em meus olhos. Quando solteira flertava assim. Sou solteira agora e não flerto assim porque, mesmo que meu orgulho grite, ainda amo esse pimentão.
- Senhor Gabriel.
- Senhor Juliano Valmonty.
Os dois apertam as mãos e posso ver gabriel bem bravo. Nos sentamos e tratamos de trabalho. Foi três horas de reunião, olhares, um pimentão e um problema grande resolvido. Desculpe, informação confidencial.
- Nos vemos depois, Úrsula.
- Assim espero, Juliano.
Jogo todo o meu charme e quando ele se vai, biel não perde a oportunidade de mostrar seu ciúme que nunca conseguiu esconder, e diz:
- Nos vemos depois, Úrsula.
Imitando a voz de Juliano.
- Que foi, ciúmes?
- Ciúmes nada. Só queria que não dasse em cima de homens na minha frente.
- Te incomoda?
- Ele é um cliente, poxa.
- Talvez um futuro namorado. Quem sabe? Ele é bem bonito, alto, meu tipo.
- Vai largar o do restaurante?
- Querido, relacionamento aberto.
- O quê?
- Você ouviu. Vamos pra minha sala.
Falo só para irritá-lo.
- Nossa sala.
Ele me corrige, irritado.
- Por enquanto.
- Como assim?
Ele pergunta, bem perturbado.
- Não quero mais nada nosso.
- Vai sair da empresa?
Ele me pergunta assustado.
- Claro que não. Mas mudar de sala.
- Está cheio o nosso pequeno prédio.
- Sempre tem um jeito.
Estava na porta, ele me puxa e eu deixo cair a maleta que estava em minha mão. Que biel é esse na minha frente? Não sei, mas eu quero. Ele me pressiona contra a parede, perto, perto demais.
- Te faço sentir tanto assim?
- Quer dizer: te incomodo tanto assim?
- Admite que me ama.
- Admite você. Ah não, pera, já tem uma loira.
Nota: em menos de um mês de divorciado.
- Então me viu.
- Querido, eu enxergo e não ando de olhos fechados. Estava no mesmo lugar que eu, como eu não ia te ver?
- Ela é uma amiga que veio para cá.
- Não perguntei nada.
- Mas sei que quer saber. Não tenho nada com ela, ela inclusive está morando com o pai do bebê dela.
- Duvido.
- Você não me viu beijando-a, viu?
Não respondo e ele continua.
- Está grávida de três meses.
- Podia ser eu...
Falo sem esconder meu descontentamento. Eu queria muito um bebê, tanto quanto ele. Por que tudo teve que dar errado?
- Eu queria muito.
- Então porque me largou?
Falo chateada.
- Você que falou que não queira me ver sofrer, você que me expulsou da sua vida. Cansei de te ver sofrer, por causa das brigas. Mas do coração não consegue, não é?
- Você consegue?
- Eu nunca tentei.
- E o que está tentando com tudo isso?
- Ter a mulher que eu tive um dia.
- Aposto que prefere noitadas.
- Você foi a última que você imagina o que está pensando. Eu não quero ninguém, ninguém me completa como você. Te amo e preciso de você.
Volta pra mim...
- Eu te...
Quando ia falar, uma voz irritante e muito aguda fala:
- Querido, te achei. Ah, não vi você ai.- Ela se vira para mim e fala- Bom dia.

Abre um sorriso tão simpático que quase começo a abrir um buraco no chão para pular e assim, me ver livre dessa situação.
- Odeio- falo para ele e depois para a rosinha- Bom dia.
Quem é essa loira? Outra?
- Não vai me apresentar biel?
Ele nos olha, de uma para a outra, como se estivesse vendo um fantasma e um monstro. Ela é o monstro.
- Úrsula -pera, me chamou pelo nome, tem coisa errada- Essa é Amélia.
- Namorada dele.
O ser humano rosa acrescenta.
- Oh, prazer. Acho que já ouviu meu nome.
Ela sorri e o beija. Não vou ficar aqui vendo esse show ridículo. Saio e não me importo se a minha maleta ficou no chão. Minha dignidade faz companhia para ela. Podia ser uma megera, mas ela é tão doce e delicada. Tanto quanto o seu nome... Parece uma adolescente em sua saia rosa e blusa branca, e saltos dourados. Tão menininha, estereótipo de patricinha em pessoa. Maquiagem leve, batom rosa e brilho. E eu com vinho e matte. Bolsa dourada com um laçinho, bem mais baixa que eu, também parece ser três anos mais nova. Pode me trocar, mas mentir... Disse que não tinha ninguém e eu quase o beijei. Quase me entreguei para aquele ser humano que agora tenho nojo. Poderia sair correndo, ir chorar nos braços de Luan mas vou ficar. Com cara de inabalada e fazendo meu trabalho. Como ele pôde? Não sei. Mas não quero mais voltar com ele e as minhas barreiras não irão se abaixar novamente. Deu de amor. Amar ele foi tão fácil e tão prazeroso. Agora é tão difícil e tão doloroso. Deu de amor. Ele já acabou com o que tinha que acabar.
Mando uma mensagem para Luan:
- Posso ir 7:50 na sua casa?
Enquanto andava para minha sala ele responde:
- Claro, o que aconteceu?
- Depois te explico. Mas se prepare com um colo amigo para lamentações idiotas e uma garrafa de whisky.
- Parece que foi pesado em.
- Você nem imagina... Até mais.
- Até. Fique bem ursinha.
Chego no escritório e ele nem me olha. Faço o mesmo, nunca mais. Ele mentiu. Ele conseguiu outra.
Nota: em menos de um mês divorciado.
- Você falou- pausa e respira- Eu te...

Sério gabriel? Sério? Agora vai levar patada mesmo.
- Eu te odeio Gabriel Eduard Ross. Meu maior desgosto é ter que viver ao seu lado, seu mentiroso.
Ele me olha com dor e súplica, tarde demais... A pior parte de mim se manifestou. A parte que não sente.
- Eu estava carente...
- Eu não perguntei. Sabe, deu de você- nessa hora, uso toda a minha classe- Infelizmente tenho que trabalhar com você mas- pego sua gravata e o encaro, meus olhos queimam, implacáveis. Com a voz baixa, clara e imponente, digo- nunca mais me dirija uma só palavra que não tenha relação com essa droga de empresa.

Falo e bato na mesa. Eu estou muito irritada. Ele trás alguém, beija ela na minha cara e além disso... Ele mentiu. Ele mentiu para mim.
- Não faz isso.
- Faz um favor? Não minta e aproveite e vai buscar uma loira natural-
Ele me queima com seus olhos, bravos e assustados, ele está... Ferido?- Ou essa mesma, pode ser. Seu nível ela, sabe? Baixo. Bem baixo. Quer saber? En-gu-la ela. E nunca mais venha atrás de mim.
Falo mesmo e ele permanece calado. Me encara, chorando em silêncio, e sai da sala. Reconheceu ser erro e eu não me reconheço. Na verdade essa sou eu. Essa sempre fui eu. Úrsula. Forte e destemida. Não uma idiota que mendiga amor do ex idiota. Parece que meu passado está voltando e eu vou abrir a porta com um sorriso. Porque eu nunca me feri antes. Foi só abaixar a guarda para aquele idiota vir e me quebrar por dentro e por fora. Sério que fui trocada por uma patricinha idiota de 22 anos? Ele pegou pesado. Todo aquele papo de "quero voltar", "vou correr para o amor", "vou lutar por ele" acabou. Quero é voltar para as noites intermináveis. Vou é correr do amor. Vou lutar para conseguir beber mais e mais. Cansei. Não quero nunca mais voltar com aquela escória humana e vou lutar para que eu volte a ser quem eu fui a vida toda. Úrsula.
Passa muito tempo, eu e ele em silêncio o resto do dia, e cá estou eu, indo para a casa Lu, totalmente ferrada, com o coração quebrado e a maquiagem borrada. Quem mandou passar lápis que não é a prova d'água? Quem mandou passar tanto rímel? Quem mandou ainda amar o ex... Quem?

Divorciada Que Arrasa - Degustação Onde histórias criam vida. Descubra agora