Despedida

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          Gabriel não voltara a beijar Manuela. Quando a excitação e eletricidade do momento cessara, uma súbita vergonha e medo da rejeição o preenchera. Como um sinal de que tal acontecimento deveria ser esquecido, Manuela também não se manifestara após o ocorrido. Dessa forma, com o tempo passando cada vez mais rápido e a coragem se esvaindo na mesma velocidade, ambos simplesmente permaneceram em silêncio e mantiveram a memória daquela tarde apenas em suas mentes. O garoto nunca mais tocara no assunto, seguindo o exemplo da menina. O ocorrido no armário tornara-se um momento esquecido, quase que proibido de ser pronunciado. Pelo menos, Gabriel nunca arriscara tentar falar sobre aquilo. E ele se arrependia profundamente disso.

          Naquele momento, o moreno sentia-se o pior dos medrosos e o maior dos covardes. Declarar seus sentimentos pela garota era um de seus planejamentos para o futuro. Futuro esse que estava totalmente incerto desde a ida dela para o hospital. Se tivesse sido um pouco mais corajoso, as coisas poderiam ter terminado de uma forma diferente.

          Terminado. Por que o fim parecia estar tão próximo para ele? O tempo se tornara seu maior inimigo, de fato.

          Com um suspiro frustrado, o rapaz ajeitou-se na cadeira pelo que seria a quinta vez nos últimos dez minutos, tentando pensar em algo que não estivesse interligado a garota de cabelos loiros e olhos tão claros quanto o céu. Aquilo era impossível, ele sabia. Não conseguia arrancar da cabeça a lembrança de seus lábios macios e seu hálito de menta. O garoto sentia uma profunda vontade de ter novamente a melhor amiga em seus braços. Queria afagar seus cabelos, beijar sua boca. Gabriel gostaria de ter a garota ao seu lado de novo, onde era seu verdadeiro lugar. Ele esperava poder fazer as pazes com o relógio e ter seu futuro de volta.

          Como que ouvindo suas preces, os pais de Manuela surgiram no corredor, fazendo-o esquecer por completo de seus pensamentos de instantes atrás. Ele se levantou de modo abrupto, correndo apressado na direção do casal que conversava com um dos médicos do local. Seu estômago se retorcia em ansiedade e saudade, e o garoto não via a hora de poder enfim rever sua amiga. Aproximou-se rapidamente do trio, mas freou suas passadas ao notar as lágrimas que corriam pelo rosto de Luísa. A inquietação que preenchia seu peito fora substituída por medo de forma quase instantânea.

          — Aconteceu alguma coisa? — A voz do rapaz escapou num murmúrio fraco e falho.

           A mulher de olhos claros o encarou, ainda em prantos. Seu marido envolvia firmemente sua cintura, murmurando palavras de consolação em seu ouvido. Uma expressão arrasadora encobria sua face e ela quase não se sustentava em pé. Fernando, mesmo aparentando estar mais calmo que a esposa, também não conseguia esconder a tristeza que fazia tremer seu corpo e marejar os olhos.

          — Está tudo bem?

          O médico, que até então permanecera imóvel, lançou-lhe um olhar caridoso, abrindo a boca diversas vezes na tentativa de falar algo. Não obtivera sucesso. — É complicado, garoto — Ele disse, por fim.

          — Eu vou poder entrar no quarto agora? — O coração do garoto estava disparado. O nervosismo já lhe consumia por inteiro, e um arrepio incômodo subira por sua espinha no segundo seguinte. Havia algo errado. Ele podia sentir isso, em cada pequeno ponto de seu corpo. Algo muito errado. — Vou, não vou?

          — E-eu receio que não — O doutor gaguejou, voltando seus olhos para o chão na intenção de não encarar o garoto de expressão assustada e o casal que chorava envolvido em um abraço.

          — Por que não? — Gabriel questionou-o, sentindo seu peito se comprimir de maneira arrasadoramente forte.

          — Ela estava sentindo muitas dores, garoto — O senhor de jaleco branco o explicou, e o choro de Luísa tornou-se ainda mais alto. — Tivemos que lhe dar uma dose de morfina.

Olhe para o céu [Completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora