9. lidando.

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Eu sabia que depois de contar à mamãe sobre Lauren e a gravidez, não demoraria muito que ela contasse à papai. Os dois eram extremamente unidos desde o dia que se conheceram, eram o tipo de casal onde um terminava as frases do outro com extrema facilidade e no momento em que esbravejei sobre o bebê que eu nunca poderia segurar em meus braços, era apenas questão de minutos para que papai tomasse conhecimento e resolvesse me procurar.

Ele se manteve calado durante o jantar, provavelmente porque esse não é um assunto pra ser tratado na frente de Sofia, que mesmo já tendo 13 anos, talvez ficasse confusa e traumatizada pelo peso da informação.

Os olhos dele cruzaram os meus por apenas frações de segundos e ele desviou, não estava fazendo questão de esconder seu descontentamento comigo. Me culpei mentalmente inúmeras vezes por ter contado à mais alguém sobre aquele serzinho. Até algumas horas mais cedo ele era um segredo apenas meu e de Lauren. Aliás, ele era apenas meu agora que qualquer lembrança era apenas um borrão pra ela. E agora eu estava fadada a escutar o maior sermão da minha vida e ainda teria que acordar no dia seguinte e lidar com a perda do que eu tinha de mais bonito.

Papai apareceu no meu quarto cerca de uma hora depois que eu já havia ajudado Sofia a tirar a mesa e arrumar a cozinha, sem bater na porta ou pedir licença ele entrou e se acomodou na cama.

Coloquei o violão, onde treinava alguns acordes e tentava relembrar algumas músicas, de lado e prestei atenção nele.

— Você sabe sobre o que quero conversar com você — ele disse por fim, quebrando o silêncio que já havia se tornado esmagador.

— Sim, eu sei — puxei as mangas do casaco, escondendo as mãos ali dentro.

— Quero entender, Camila. O que você estava pensando quando escondeu essa decisão de nós?

— Eu expliquei à mamãe que nós íamos contar à todo mundo mas o acidente aconteceu e aí o bebê já não existia mais — abaixei a cabeça, tentando não deixar que ele visse a lágrima teimosa que traçava caminho pela minha bochecha.

— Como isso tudo aconteceu? Confesso que estou absolutamente perdido, filha — ele passou as mãos nervosamente pelo a cabelos parcialmente grisalhos.

— Quando assumimos o namoro e tudo estava indo bem, começamos a falar sobre ter uma família, sobre sossegar da banda e comprar um lugar pra gente morar com o bebê — respirei fundo e ele acariciou minhas costas, me dando tempo pra retomar — Quando fomos à NY com a sexta turnê, Lauren me disse que tinha achado uma clínica maravilhosa e que podíamos passar em uma consulta e decidir, então nós fomos no dia seguinte ao show. Fizemos exames de fertilidade mas não podíamos esperar pelos resultados, porque tínhamos que terminar a turnê na Europa. O médico ligou pra Lauren alguns dias depois e disse que nós duas éramos férteis e que podíamos fazer o procedimento e que provavelmente seria um sucesso.

— Por que nesse ponto você não nos procurou, Camila? Podíamos ter orientado vocês — ele balançou a cabeça negativamente.

— Por isso, papai — apontei sem sua direção — pra vocês e provavelmente peoa Jauregui, eu e Lauren não daríamos conta de ter um filho. Sabíamos que vocês não iam aceitar bem mas nós estávamos tão feliz com a ideia, papai. Lauren trazia um brilho tão especial nos olhos que parecia que ter um filho era o sonho de vida dela e eu me peguei diversas vezes olhando coisas de bebê na internet e pensando em nomes que podíamos dar.

— Quando vocês deram continuidade? — ele me olhava fixamente enquanto eu lutava contra um choro que quase me deixava sem ar.

— Quando voltamos da Europa e tivemos aqueles dias de descanso... Foi quando retornamos à clínica. O pessoal foi super atencioso e nós escolhemos um doador latino, pra que a criança também tivesse uma parte do meu gene, do nosso gene. Pensamos que ele ou ela teria a nossa cor de pele mas os olhos de Lauren, imaginávamos uma criança tão perfeita, papai — sorri mas sabia que aquele era um sorriso doído, cheio de amargura.

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