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O detetive-chefe Carlos Brandão não acreditava que encontrariam o rapaz desaparecido. Achava que era mais um caso que ocuparia desnecessariamente o precioso tempo do Departamento de Investigação Criminal de Curitiba, subordinado da promotoria, que havia sido acionado pela polícia civil há 24 horas. Carlos, durante esse período, descobrira que o rapaz estava envolvido com "contatos" de traficantes de crack, dependentes da máfia da zona leste da cidade. Por ser um usuário, provavelmente deveria ter se metido em alguma encrenca financeira e foi "varrido", como chamavam no departamento quem havia sido assassinado e o corpo escondido pela máfia – talvez não tão clássico como "serviu de comida aos peixes", mas era um termo prático.

— Estacione aqui — disse Carlos ao novato do departamento, Luís Ortega, que conduzia o impecável Sandero preto.

Luís obedeceu ao seu superior e estacionou corretamente o carro, rente à guia. Alinhado a eles, do outro lado da rua, estava o seu destino: o edifício Keller. No apartamento 1106 – onde morava Ariel Carls –, Marta Rense e Loana Soares estariam à espera dos detetives para deporem sobre o caso do desaparecimento do jovem.

Os dois saíram do carro, fechando as portas em seguida. Ambos vestiam ternos idênticos. Carlos tinha trinta e sete anos e estava há onze no departamento. Seus cabelos grisalhos e visíveis sinais de tendência a calvície denunciavam o estresse e o duro trabalho durante os anos em que esteve em serviço.

Luís era jovem e tinha sempre uma expressão de estar determinado a aprender. Era ligeiramente mais baixo que Carlos – este que possuía um e oitenta e dois de altura. Tinha vinte e oito anos e aquele era seu primeiro trabalho em prática externa que realizava para o DIC. Havia trabalhado durante cinco anos em Florianópolis, onde atuara como recruta.

Carlos voltou ao carro para pegar no banco de trás uma pasta com alguns documentos referentes ao caso de Ariel Carls. Apesar de não ter gostado daquele caso em particular, sabia o motivo para estar ali. Soube desde o momento em que o tenente Marciano Tavares o entregou os papéis contendo as informações. Carlos estava há bastante tempo atuando como detetive-chefe e era só uma questão de tempo para ser promovido a capitão da equipe, cargo este recém-aberto após um remanejamento do organograma do departamento. Sabia que, antes disso, o tenente queria aproveitar a experiência de Carlos durante o treinamento de Luís em trabalhos mais simples.

Os detetives atravessaram a rua assim que houve oportunidade. Carlos digitou os números um duas vezes, zero e seis no painel de interfone.

Alô? — Uma voz feminina vinda do alto-falante perguntou.

— Boa tarde. É a senhora Marta Rense?

Sim, sou eu.

— É o detetive Carlos Brandão. Poderia abrir?

Claro. Um instante.

Um zumbido estridente se seguiu e a porta abriu. Os dois entraram no hall do prédio e foram em direção a porta do elevador. Este estava no décimo andar. Carlos apertou o botão para chamá-lo.

— Segure estes documentos, Luís. Quando chegarmos lá, deixe que eu nos apresente — disse Carlos respeitosamente, entregando a pasta a Luís.

— Sim, senhor.

Carlos olhou de cima a baixo para Luís.

— Ouvi falar que você trabalhou um tempo com a polícia de Floripa.

— Sim, senhor — disse o rapaz. — Por cinco anos fui recruta.

— Faça-me um favor, rapaz. Pare de dizer "sim, senhor" como se estivéssemos na porra do exército. Você já serviu, não serviu?

UtópicoWhere stories live. Discover now