O critério da cidadania

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Não é a residência que constitui o cidadão: os estrangeiros e os escravos não são "cidadãos", mas sim "habitantes".
Tampouco é a simples qualidade de julgável ou o direito de citar em justiça.
Para isso, basta estar em relações de negócios e ter ao mesmo tempo alguma coisa a resolver. Mesmo assim, há muitos lugares em que os estrangeiros não são admitidos nas audiências dos tribunais senão quando apresentam uma caução. Não participam, então, a não ser de um modo imperfeito, dos direitos da Cidade.
e mais ou menos o mesmo que acontece com as crianças que ainda não têm idade para serem inscritas na função cívica e com os velhos que, pela idade, estão isentos de qualquer serviço. Não podemos dizer simplesmente que eles são cidadãos não são senão supranumerários uns são cidadãos em esperança por causa de sua imperfeição, outros são cidadãos rejeitados por causa de sua decrepitude. Terão o nome que se quiser: o nome não importa desde que sejamos compreendidos. Procuramos aqui o cidadão puro, sem restrições nem modificações.
Com mais forte razão, devemos deliberadamente riscar desta lista os infames e os banidos.
Portanto, o que constitui propriamente o cidadão, sua qualidade verdadeiramente característica, é o direito de voto nas Assembléias e de participação no exercício do poder público em sua pátria.
Há dois tipos de poderes: uns são temporários, só são atribuídos por certo tempo e não se podem obter duas vezes em seguida os outros não têm tempo fixo, como o de julgar nos tribunais ou de votar nas assembléias.
Objetar-se-á, talvez, que estes últimos não são verdadeiros poderes e não participam de modo algum do governo. Mas seria ridículo contestar esta denominação de quem se pronuncia sobre os interesses maiores do Estado.
Aliás, pouco importa, essa é apenas uma questão de palavras. Não possuímos, com efeito, um termo comum sob o qual possamos colocar a função de juiz e a de membro da Assembléia. Será, se se quiser, um poder sem nome. Ora, chamamos "cidadão" quem quer que seja admitido nessa participação e é por ela, principalmente, que o distinguimos de qualquer outro habitante.
Convém ainda notar que nas coisas cujo sujeito pertence a espécies diferentes, sem outra relação entre si, senão que uma é a primeira, a outra a segunda e assim por diante, não há absolutamente nada ou muito pouco em comum. e o que se observa nas formas de governo: são de diferentes espécies, umas primitivas, outras posteriores. Entre estas últimas devem ser contadas as corrompidas e degeneradas, que vêm necessariamente depois das que permaneceram sãs e intactas. Explicaremos mais adiante em que consiste a degenerescência. Portanto, o cidadão não pode ser o mesmo em todas as formas de governo. e sobretudo na democracia que é preciso procurar aquele de que falamos não que ele não possa ser encontrado também nos outros Estados, mas neles não se acha necessariamente. Em alguns deles, o povo não é nada. Não há Assembléia geral, pelo menos ordinária, mas simples convocações extraordinárias. Tudo se decide pelos diversos magistrados, segundo suas atribuições. Na cerim{nia, por exemplo, os éforos tratam dos contratos os senadores, dos homicídios as outras magistraturas, das outras matérias. Acontece o mesmo em Cartago, onde alguns magistrados decidem sobre tudo.
A definição do cidadão, portanto, é suscetível de maior ou menor extensão, conforme o gênero do governo. Há alguns em que o número e o poder dos juízes e dos membros da Assembléia não é ilimitado, mas restrito pela constituição. O
direito de julgar e deliberar cabe a todos ou apenas a alguns, e isso sobre todas as matérias, ou somente sobre algumas. Por aí se pode ver a quem convém o nome de cidadão em cada lugar. e cidadão aquele que, no país em que reside, é admitido na jurisdição e na deliberação. e a universalidade deste tipo de gente, com riqueza suficiente para viver de modo independente, que constitui a Cidade ou o Estado.
Comumente, o costume é dar o nome de cidadão apenas àquele que nasceu de pais cidadãos. De nada serviria que o pai o fosse, se a mãe não for.
Em alguns lugares, vai-se ainda mais longe, até dois av{s ou a um grau maior.
Surge, então, a dificuldade de saber como serão eles mesmos cidadãos, este terceiro e este quarto av{. Górgias de Leonte dizia, não se sabe se a sério ou por brincadeira, que, assim como os caldeireiros fazem caldeiras, assim também os habitantes de Larissa fabricavam larissianos, e que era preciso que os larissianos fabricados tivessem os seus fabricantes. De acordo com nossa definição, a coisa é simples. Se participarem do poder público, serão cidadão.
A outra definição, que exige que se tenha nascido de um cidadão ou de uma cidadã, excluiria desta categoria, em contrapartida, os primeiros habitantes e os próprios fundadores da Cidade.
Há maior incerteza a respeito daqueles a quem foi concedido direito à cidadania durante uma revolução, como fez Clístenes em Atenas, quando, após a expulsão dos tiranos, formou várias tribos novas de estrangeiros e até de escravos imigrados. 4uanto a eles, a questão não é saber se são cidadãos, mas se se tornaram tais com justiça ou não. Podemos, também, duvidar se eles se tornaram cidadãos de forma legal, não existindo então nenhuma diferença entre a ilegalidade e o erro. Existe, no entanto, uma distinção muito real. Com efeito, vemos pessoas que alcançam a magistratura por meios ilegais, e não deixamos, porém, de chamá-los de magistrados, mas magistrados ilegítimos.
Sendo, portanto, o cidadão caracterizado pelo atributo do poder pois é pela participação no poder público que o definimos, nada impede de contar entre os cidadãos as criaturas de Clístenes.

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⏰ Última atualização: Oct 15, 2016 ⏰

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