Na rua, no bueiro capítulo 4

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Como o meu pai não queria conviver comigo divorciada dentro de sua casa , me mantive na casa que morava com a ajuda de minha mãe.

Trabalhava de dia como educadora em uma creche e busquei uma escola estadual à noite, para fazer o meu estágio probatório de pedagogia.

Não tinha experiência nenhuma em alfabetização de adultos, mas a ideia me animava.

Vesti minha melhor e sensual roupa, me maquiei discretamente, coloquei acessórios que combinavam com a roupa e calçado. Olhei-me no espelho e senti uma enorme saudade do meu jeans, meu tênis e minha camiseta.

A imagem no espelho brigava comigo, me censurava:

Eu encarnava a imagem da professorinha tradicional.

- Socorro só me falta os óculos. Não, isto não.

Troquei de roupa correndo, já estava me atrasando. Vesti meu jeans, meu tênis e uma camisa mais sofisticada. Lavei o rosto e apliquei apenas um batom.

Ao chegar à escola fui encaminhada para o CB4 (equivalente à quarta série do fundamental).

Fui conduzida à sala de aula; no pátio da escola um menino negro cheirava um lenço. Meu Deus - loló.

A maioria dos alunos no pátio estampava pobreza.

Entrei na sala de aula. Pensei que seria uma turma de adultos operários semianalfabetos.

Que nada. Eram quatorze adolescentes a maioria drogados.

Senti um frio na barriga, medo e vontade de urinar.

Eu precisava enfrentar aqueles monstros que impunham canivetes, bisnagas de loló, vendiam maconha no meio da aula.

Sentados pelos cantos da sala me olhavam curiosos enquanto eu me apresentava.

Escrevi meu nome no quadro e,pelas minhas costas um menino gritou:

- Aí ruivinha, na saída tu é curra.

Fui jogada numa jaula de leões e eu precisava lutar para não ser devorada.

E eu que pensava em apresentar-me bem vestida para esses canibais mirins.

Eu precisava fazer o meu estágio. Era eu ou eles, e eles sabiam disso.

Em outra noite, fiz um círculo com as cadeiras, convidei os alunos para sentarem.

Sentei-me no chão no meio do círculo.

Ficaram me olhando meio que impressionados. Eu fugia do padrão de todas as professoras.

Vestia-me como eles, falávamos a mesma linguagem, dividíamos cigarros e salgadinhos na hora do recreio. Não me desligava deles um só minuto.

Aos poucos fui descobrindo que além do uso de drogas, a maioria dos meninos costumam fazer assaltos a mão armada.

E mesmo sabendo disso, não mais os temia e não conseguia enxergá-los como "trombadinhas, pivetes".

Cada vez mais estava envolvida emocionalmente com eles, principalmente com Charles,um menino de quatorze anos muito desafiador e vulnerável.

Os meses se passaram

Os alunos já confiavam em mim, mas o meu estágio estava chegando ao fim e eu teria de me separar deles. Isso me desesperava.

Eu não poderia simplesmente ir embora.

Abusada,drogada e prostituidaOnde histórias criam vida. Descubra agora