"Querida Megg,
Como contei antes, depois do meu surto no seu enterro fui mandada para a terapia. Nem se quer pude ver o serviço fúnebre, agora percebo que talvez foi melhor assim. O psiquiatra era uma pessoa terrivelmente arrogante para quem estava sendo muito bem pago para me ajudar no tratamento. Ainda bem que você não viveu para conhecer pessoas assim.
Ele apenas dizia: " Você tem que achar forças dentro de si mesma Amanda" ou "não posso te ajudar se você não quer ser ajudada". Ao final de uma hora e meia em que eu apenas ficava em silencio de braços cruzados, nada se resolvia. Ele começou a me prescrever remédios que eu era obrigada a tomar, segundo ele para controlar minha depressão. Eu não tinha depressão, eu só estava sofrendo. Seu pai finalmente percebeu que me mandar para a terapia estava me fazendo ficar pior do que eu estava. Os remédios me deixavam estressada e muito sonolenta. Finalmente não precisei mais ir.
Duas semanas inteiras gastando um precioso tempo em uma sala estéril de terapeuta para não me sentir menos desolada. E não ajudava muito o fato de que meus seios vazavam frequentemente por não ter mais um pequeno ser para alimentar.
A cada dia eu sentia que um pedaço de mim ia embora. Ninguém mais era importante além de você, mesmo que você não estivesse mais comigo. Nem sua avó, nem seu pai e muito menos eu. Eu queria apenas que eles parassem de tentar me ajudar e apenas me deixassem chorar abraçada as suas roupinhas e trancada no seu quarto que havíamos decorado com tanto carinho. Um quarto que você nunca chegou a ver. Mas não eles não desistiram.
E foi então que eu conheci a Sílvia, ela não era terapeuta, ela era uma espécie de acompanhante. Ela vinha todos os dias em nossa casa e ficava algumas horas comigo. Para mim era a mesma coisa da terapia, o que diferenciava era que eu estava sentada no meu sofá e não no sofá de um escritório. A única coisa que eu sabia sobre Sílvia, além da sua escolha frequente de cores fortes para se vestir, era que ela era responsável por ajudar pessoas que passaram por perdas familiares. Alguém que, segundo as referências, iria me ajudar a aceitar que você tinha ido embora.
As primeiras visitas foram exatamente como as que eu tinha tido com o terapeuta. Mas o que diferia, era que aquela mulher de olhar penetrante e cômodo, apenas ficava me encarando. Ela não falava se eu não falasse. Ela tinha feito diferente e isso me intrigou. Ela não pediu que eu fosse forte e seguisse em frente, como cada pessoa que tinha querido me consolar, ela apenas se sentou e disse que estaria pronta quando eu estivesse pronta.
Naquele dia, quando Silvia foi embora, fiquei com o coração mais apertado de dor que o normal. Peguei todas as suas fotos no computador e as imprimi, apenas para olhar cada uma delas, reparei em cada pequena linha do seu rostinho infantil. Realmente tinham se passado apenas quatro semanas?
Fiquei até de madrugada estendida em cima das suas fotos quando seu pai, Roberto, se sentou perto de mim e olhamos as fotos juntos. E pela primeira vez eu percebi o quanto egoísta eu tinha sido. Afinal, eu tinha perdido uma filha, mas ele também tinha perdido uma filha que ele amava tanto quanto eu.
Olhei em seu rosto e ele estava mais magro e abatido, manchas arroxeadas coloriam ao redor dos seus olhos. E eu pensei o quanto ele estava sofrendo e se preocupando com o meu bem-estar, esquecendo o seu próprio. Eu tinha deixado uma carga muito grande apenas nos seus ombros.
No outro dia quando Sílvia chegou para nosso encontro diário eu estava decidida a falar. Se eu tinha vergonha de falar com a minha família então eu não deveria ter vergonha de falar com uma estranha que não iria me julgar e nem me tratar como uma doente.
E foi exatamente como eu imaginei. Falei sobre os últimos dias e sobre como você ainda fazia falta para mim. Ela foi tão doce e atenciosa, não como uma profissional fria, mas alguém que realmente quer ajudar.
Quando eu falei que não ter você tinha tirado uma parte de mim ela disse algo que me surpreendeu: "Sim, uma parte de você se foi, mas você pode e vai recuperá-la. A Megg se foi, isso é um fato, mas você ainda está aqui, seu marido ainda está aqui e você tem uma vida muito longa pela frente para se deixar abater. Amanda você só tem 26 anos. Cada um de nós tem um propósito e quando o realizamos nós voltamos para Deus. Talvez Megg tenha cumprido o dela, mas você ainda não cumpriu o seu, então não é justo com você nem com as pessoas que te amam e nem mesmo com Megg, que você se abale tanto a ponto de parar de viver."
Dizer que fiquei surpresa foi pouco. Ela estava certa, eu sabia disso, mas uma parte de mim ainda te queria de volta. Eu queria poder viver com você para sempre, nem que para isso eu tivesse que perder a minha vida também. Sim, eu pensei em me matar. Naquele momento me pareceu a solução mais acertada.
Não fique triste meu amor, isso não é sua culpa. Nada do que eu passei foi sua culpa.
Sílvia começou a me incentivar a achar uma conexão com você, da forma que eu achasse melhor, para poder me ajudar a lidar com a dor. Por isso comecei a escrever a você. E nem posso expressar o quanto tem me feito bem. Como escrever algumas palavras a você já me faz ficar mais calma.
Já escrevi demais por hoje e não quero falar tanto. Está na hora de parar. Até a próxima carta minha linda flor.
Com amor, mamãe. "
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Com amor, mamãe [Conto]
Krótkie Opowiadania#Em homenagem a Maria Beatriz# O que fazer quando seu pequeno bebê, que você gestou e esperou com tanto carinho se vai? Quando Amanda perdeu sua filha, que tinha poucos meses de vida, foi como se uma parte de si mesma tivesse se rasgado, a depr...