No hospital, sempre instruem os pacientes a não ficarem repetindo pensamentos e revisitando o que já passou. Dizem para viverem no presente, não no passado. No entanto, como é possível fazer isso quando o garoto de quem você gosta meio que,virtualmente, acabou de lhe dar um beijo?
Quando encontro a Dra. Sarah na sessão seguinte, já repassei a cena tipo um milhão de vezes, e agora estou me perguntando se a história toda não era só uma tentativa de me deixar tenso ou de ter algo para rir com os amigos, ou ainda se fora tudo por educação apenas. Tipo, será que ele sente pena de mim? Será que foi um beijo de pena? Meu Deus. Com certeza foi um beijo de pena (não que eu seja uma expert em beijos. Beijei precisamente um único menino na vida, o que aconteceu durante as férias do fim do ano passado e foi bem nojento).
A Dra. Sarah escuta educadamente por cerca de meia hora enquanto tagarelo sobre Castiel. Depois, falamos a respeito da mania de "ler mentes" e "catastrofizar", exatamente como sabia que acabaríamos fazendo. Às vezes chego até a achar que também poderia ser terapeuta.
— Sei o que vai dizer — falo, enfim. — Não posso ler a mente dele e não devia tentar. Mas como não pensar nisso? Ele me beijou. Quero dizer... Mais ou menos. No papel. — Dou de ombros, sentindo-me um pouco envergonhado. — Você provavelmente acha que nem conta.
— De jeito algum — garante a médica, com seriedade. — O fato de que estava no papel não diminui a importância. Um beijo é um beijo.
— E agora não tenho notícia dele e não faço ideia do que está pensando, o que me deixa estressado.. — A Dra. Sarah não responde imediatamente, e solto um suspiro. — Eu sei, eu sei. Tenho uma doença que é totalmente tratável.
Faz-se um longo silêncio. A boca da terapeuta está tremelicando.
— Sabe de uma coisa, Dean? — diz, finalmente. — Detesto ter de dar esta notícia, mas ficar estressado conjecturando o que um menino deve estar pensando depois de ter te beijado pode não ser totalmente tratável. Não totalmente.
Então, três dias depois do Starbucks, estou sentado sozinho, tranquilamente assistindo à televisão, quando Sam marcha para dentro do escritório e anuncia:
— Castiel está aqui.
— Ah, OK. — Empertigo-me, agitado. — Mesmo? Está aqui? Mas... — Engulo em seco —Vocês não podem jogar LoC, então... Quero dizer, por que ele...?
— Ele veio te ver. — Sam parece não estar nem um pouco impressionado pelo fato. — Tudo bem? Não vai surtar?
— Não. Sim. Quero dizer... Tudo bem.
— Que bom, porque já está aqui. Castiel!
Alguns irmãos teriam dado a chance de se pentearem. Ou de ao menos trocarem a camiseta velha, praticamente um trapo, que usaram o dia inteiro. Estou transmitindo ondas de pensamento assassinas para ele no instante em que Castiel entra no escritório e diz com cuidado:
— Oi. Uau, está uma escuridão aqui dentro.
Todos da família já se acostumaram à minha salinha escurecida, e me esqueço de como deve ser aos olhos de outras pessoas. Mantenho as venezianas fechadas, assim como as luzes desligadas, e a única iluminação vem da televisão tremeluzente. Desse modo, me sinto seguro. Segura o bastante para tirar os óculos.
— É. Desculpe.
— Não, tudo bem. Você é mesmo um ruibarbo.
— É meu nome. — Vejo que está sorrindo no escuro. Os dentes refletem o brilho da TV, e os olhos são duas aberturas diminutas reluzentes.
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À procura de Dean ✔️
Romance"Dean, leva uma vida relativamente comum, até que começa a sofrer bullying na escola. Aos poucos, ele perde completamente a vontade de estudar e conhecer novas pessoas. Sem coragem de sair de casa e escondido por um par de óculos escuros, a luz par...