Mais Que Perfeito *Degustação*

Capítulo 3 - Entrando no personagem

— Eu estraguei tudo! – a frase saiu entre soluços e as lágrimas finalmente desceram. Repeti palavra a palavra a conversa com o diretor.

— Amorzinho, fica calma. Esse pessoal está acostumado com essas cenas. Faz o seguinte: vai lavar esse rosto, retoca a maquiagem e age como se nada tivesse acontecido. Eu sei que você consegue. À noite, jantamos juntos e ainda vamos rir disso - eu sabia que ele estava certo. Resolvi seguir seu conselho, e terminava de me recompor, quando ouvi uma batida no vidro do passageiro. Era James, o diretor do filme. Ele sentou no banco do passageiro.

— Algum problema? - perguntei, fingindo não entender a presença dele ali.

— Eu soube de um pequeno incidente entre a autora e o meu diretor de elenco. Vim saber mais detalhes - ele tinha a expressão neutra, e eu tinha a certeza que agora não era a hora de fraquejar. Se cedesse ou voltasse atrás nesse ponto, nunca mais conseguiria ter a minha opinião levada a sério. Por outro lado, se exagerasse, poderia perder a chance de ter meu trabalho na tela. Respirei fundo, ganhando preciosos segundos para decidir o que diria.

— James, acho que tivemos um mal entendido. Ou talvez, Saul não goste que eu me meta no trabalho dele. Eu só quero que tudo seja perfeito - ele riu, condescendente.

— Por que você acha que o Jay é o Jerko perfeito? - a pergunta me surpreendeu.

— Bem, ele tem aquele ar quase debochado, mas ainda é bem doce. Além de ter entendido Mihaz de maneira muito parecida com o que Jerko acredita - respondi de uma vez. - Acho que isso é bem mais importante que o fato dele ser um pouquinho mais velho que o personagem.

— E você viu tudo isso numa conversa. Você enxerga mais que muitos diretores que conheço. Confesso que não o havia cogitado para o papel por achar que já está meio saturado por outra franquia, mas se a mãe do personagem decidiu, não sou eu quem vai negar. Saul vai contatar a agente dele. Talvez fique mais fácil encontrar a Sol certa depois disso.

A busca pelo resto do elenco levou mais duas semanas bastante frustrantes. Era quase impossível ver o espírito dos meus personagens em pós adolescentes que nunca tinham feito a própria cama e que davam show por causa do sabor da balinha no set. Acabamos por garimpar as pessoas certas para trazer à tela cada um dos meus preciosos guerreiros, vilões e criaturas mágicas. A leitura do roteiro foi marcada para alguns dias adiante.

Tivemos algumas reuniões de casting e por fim, comecei a me envolver com os atores, tentar mostrar o tom certo de cada personagem. Tive reuniões com cada um deles explicando motivações e detalhes relevantes de personalidade e história. Também procurei criar algum vínculo com quem traria às telas as minhas criações. Sentia-me responsável pelo desempenho de cada um e precisava que meus personagens fossem amados.

Logo na primeira leitura, ficou claro que Jay e Melissa, a atriz escolhida para interpretar Sol, não estavam envolvidos o suficiente e simplesmente não conseguiam passar as emoções certas. Estávamos há horas tentando, quando num intervalo, pedi para falar com Jay em particular. Entramos no trailer dele e olhei diretamente nos seus olhos. Eu estava bem nervosa, já que não era um hábito estar nesse tipo de situação, mas eu precisava que ele fosse perfeito, especialmente por ter sido a responsável pela presença dele no filme. Cheguei um passo mais perto de forma que estávamos a poucos centímetros um do outro. Coloquei uma mão em sua nuca e outra em seu peito, suspirei em seu ouvido e toquei nossos narizes, rocei seus lábios com os meus, estremeci, enquanto ele decidia se continuava estático ou se correspondia ao movimento, mantinha os olhos fechados e parecia controlar a respiração com muito custo. Dei um passo atrás e falei calmamente:

— O que você está sentindo agora? - ele me olhou confuso, parecendo não entender a pergunta - Você está confuso, pensando em algo que não devia e um bocado irritado. É exatamente assim que Jerko se sente em relação à Sol. Agora vá até lá fora e mostre isso.