Deixe a luz acesa

21 2 0
                                    


Era noite a menina sonolenta sai do conforto das cobertas para ir ao banheiro. Não acende luz alguma, não que ela temesse o escuro, mas sentia certa apreensão quando a casa ficava como agora, silenciosa e mergulhada em total escuridão. Para chegar ao banheiro era preciso atravessar um corredor. 

A menina não ligou a luz porque seu pai estava aborrecido com ela justamente por acender todas as luzes da casa quando acordava á noite, coisa que se tornou um hábito.Em certa hora especifica o sono desaparecia ou se dormia algo a acordava.

Ana era uma criança normal, mas andava um pouco diferente segundo a mãe, ela não fazia xixi na cama desde os dois anos de idade, agora aos dez anos voltou a molhar a cama. Temendo ficar no escuro total pegou uma lanterna do pai algumas noites atrás, mas ele descobriu e tirou a pilha.

— Ana... Uma voz sussurrou da escuridão do corredor.

A menina não pensou duas vezes correu para sua cama e se escondeu em baixo das cobertas. Seu coração estava acelerado agora, parecia que faltava ar em seus pulmões. Uma crise de asma. Ela não podia correr ou fazer exercícios que exigiam esforço porque perdia o fôlego facilmente.

De repente a porta do quarto dela começou a se abrir lentamente com um rangido já conhecido e uma sombra disforme pareceu entrar. Click. A luz do quarto se acendeu e ela descobriu a cabeça e viu o pai ali parado com expressão séria.

— O que você está fazendo acordada? — disse ele.

— Nada. — respondeu após alguns minutos mais calma. — Eu ia beber água, mas tive uma crise de asma.

— Eu trago um copo de água para você, mas depois quero que vá dormir.

— Tudo bem pai.

— Boa noite filha.

David já fechava a porta do quarto quando a filha o chamou:

— Pai?

— O que?

— Pode deixar a luz acesa?

Ele suspirou audivelmente e entrou no quarto novamente.

— Ana nós já falamos sobre isso, nos mudamos para cá porque não podíamos pagar as contas. Dormir a noite toda com a luz acesa vai nos custar mais, você entende?

A menina abaixou a cabeça. Derrotada. A mãe estava trabalhando agora, o pai não tinha paciência com ela, tudo o que pedia era visto como um capricho ou manha.

— Entendo. — murmurou.   

Ela estava se segurando para não chorar na frente dele. Percebendo o desapontamento dela David se sensibilizou e ajeitando o cobertor deu um beijo na testa da filha.

  — Vá dormir querida. Amanhã você tem escola.

Demorou um pouco, mas a menina conseguiu dormir. De manhã a mãe a acordou, estava  com aparência cansada  e ainda vestida com sua roupa branca e um moletom por cima, mas depois de doze horas de trabalho ninguém poderia acusá-la de ser descuidada com sua aparência.

Carolina tinha sua beleza, embora essa não fosse uma de suas prioridades a expressão serena quase nunca se alterava. Seu cabelo escuro estava amarrado num coque desleixado.

  — Mãe você voltou! 

A menina enlaçou a cintura da mãe com alegria.

  — Sim,   como você passou a noite? Teve pesadelos de novo?

  — Bem.  —  disse ela evasiva.

  —  Seu pai me contou que você teve uma crise. O que aconteceu?

  —  Nada eu apenas me assustei, pensei ter ouvido uma coisa.

Encarando a filha por alguns momentos Carolina não se convenceu com a resposta da menina, mas ignorou. Talvez fosse apenas uma fase, Ana também não havia aceitado muito bem a ideia de mudança, como o pai não queria deixar nada para trás, nem a cidade nem a casa, muito menos seus amigos.



A MENINA NO ESCUROOnde histórias criam vida. Descubra agora