16 de dezembro
Anahí dormiu e acordou sozinha. Abrindo os olhos devagar, por um instante não soube direito onde estava. Mas aí fitou ao redor, verificando o quarto familiar em que vivera um dia, reconhecendo a cama, as paredes pintadas de azul-claro e todos os objetos de decoração, e soube que continuava ali, jovem, em seu lar, onde morava com a família.
Sorrindo para si mesma, de repente ouviu o som de seus filhos brincando de correr na escadaria que levava ao andar inferior da residência. Aliás, os ruídos eram seu despertador personalizado. Aquele barulho costumava irritá-la sobremaneira no passado, mas naquele momento era música para seus ouvidos.
Aquilo, qualquer coisa que fosse aquilo, de forma alguma era uma alucinação causada por alguma droga injetada por Grace, no hospital. Ou por quem quer que fosse. Também sabia que não fora para o céu, e muito menos para o inferno. A constatação fez com que seu sorriso se ampliasse.
- Ainda estou aqui! - Em seguida, olhou e tocou o próprio corpo para certificar-se de que continuava mesmo nova.
Sim, os seios eram firmes, e a pele, lisa e macia. Depois, baixou as pálpebras e relaxou, deixando as faces doerem de tanto sorrir.
Mas aquele sorriso não parecia o suficiente para extravasar toda a alegria que aquecia seu coração, ameaçando explodi-lo e Anahí se permitiu rir alto. Gargalhar com vontade. Sentia-se renovada e feliz a não mais poder, para uma mulher cujo marido havia escondido a papelada do divórcio em algum lugar da casa.
Isso não importava. Afinal de contas, ainda estava ali e poderia abraçar seus filhos, vê-los sorrir, cuidar deles, dar conselhos, amar.
Amar! Sempre amara suas crianças, mas, desde que perdera o bebê, nunca mais fora capaz de demonstrar seu amor por eles. Com essa oportunidade fantástica, faria com que os garotos se sentissem amados e protegidos de verdade.
Sentia-se muitíssimo disposta a dedicar-se por inteiro, orientá-los, mostrar-lhes o que era certo e errado, estando presente de corpo e alma em suas vidas.
Fez uma prece silenciosa, agradecendo a Deus pela chance de corrigir seus equívocos, qualquer que fosse o motivo Dele para dar-lhe aquele presente precioso.
Espreguiçando-se e bocejando, tornou a analisar seu dormitório com uma sensação maravilhosa, algo como um profundo contentamento. E esperança. Uma grande esperança.
Então seu olhar pousou numa cigarreira antiga de mogno que sua mãe lhe dera de presente quando ela completou dezoito anos. Uma caixinha de lembrança. Anahí ficou anos sem ver aquele mimo, e não podia se recordar do que acontecera à peça. Perdera-a em algum lugar, e não se importou no momento, porque a cigarreira se transformara numa espécie de piada de mau gosto, um lembrete de uma mulher que não mais existia.
Sua mãe a presenteara seis meses antes de morrer do coração, e foi só quando ficou mais velha e mais madura que Anahí compreendeu que ela sabia, na ocasião, que estava morrendo. Na época em que sua mãe lhe deu a cigarreira, o objeto não continha cigarros dentro, mas sim uma fotografia das duas sentadas na varanda da residência onde moravam, rindo, felizes, como se estivessem fazendo cócegas uma na outra. Aquela foto passou a fazer parte das memórias perdidas de Anahí.
Mas lá estava a caixa, onde sempre estivera, em cima de sua cômoda.
Hesitou por um segundo, temendo que aquela cigarreira, de alguma forma, pudesse conter a chave da razão daquela maravilha que recebera de Deus fazia dois dias. Que talvez houvesse algo ali dentro que explicasse todo aquele mistério esplêndido. Entretanto, não tinha certeza de querer saber...
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Lição de Vida - AyA
FanfictionUma chance para viver em seus braços... Anahí Herrera que sempre teve a vida tumultuada e cercada por desencontros pensa que a vida apenas passou por ela. Presa em uma cama de hospital, recuperando-se de um ataque cardíaco, uma senhora no leito ao l...