Uma metáfora

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Cada pessoa possui dentro de si uma crença, mesmo que esteja mais para uma descrença, sempre teremos algo que nos leva de volta ao lugar que caímos para levantar a cabeça e seguir em frente, amigos, família, um amor. Olivia sabia muito bem disso, sua vida nunca fora fácil, desde criança exercera bem o papel de pessoa responsável, boa consigo mesma e com as demais. Também sabia que os conflitos são constantes na vida daqueles que buscam a harmonia, talvez o som de violinos e pássaros cantando incomodam as pessoas que buscam sons anárquicos e rebeldes. E este era o problema, Olivia fazia com que os violinos ganhassem um tom mais vibrante nos ouvidos daqueles ao seu redor, geralmente para o seu próprio azar. Frases como: "Que garota estranha, não falem com ela, meninas!"; "Essa garota não é boa influência, sonsa demais para o meu gosto", eram muito comuns. A "sorte" da menina era que nenhumas dessas pessoas significavam algo importante, ou, digamos, influente para ela. Nada naquele lugar a fazia se sentir daquele lugar, ela era uma peça de xadrez fora do tabuleiro, uma autêntica sonhadora em meios aos sonâmbulos lamentadores.

Os dias passavam-se como o vento e nada mudava, pessoas iam e voltavam e nenhuma delas trazia consigo novidades...Bom, esta era a vida da menina Olivia, lendo os livros antigos e rasgados que seu pai trazia da biblioteca aos finais de semana, e, como sua mãe sempre dizia: "nunca deixe de rezar o pai nosso todos os dias antes de dormir". De fato, ela nunca deixou de rezar, mesmo que as histórias de deuses da Grécia antiga lhe interessavam muito mais. Questão de respeito, talvez.

  No dia 19 de dezembro, Olivia comemora seus 15 anos de idade —claro que sua maturidade demonstrava uma idade muito superior — dia em que fazer um pedido antes de soprar a vela é quase uma devoção obrigatória. No momento em que a menina fez o pedido, sentiu-se surpresa com o seu próprio pensamento mais profundo: "Desejo um verdadeiro amigo". Nenhuma surpresa para os que a conhecem de verdade, pois sabiam que sua única companhia eram os livros. Porém, não restam dúvidas de que seu pedido foi ouvido pelos céus, pois em alguns meses um garoto com um jeito estranho se mudou para a cidade onde Olivia morava. No começo somente os olhares poderiam dizer algo, era incrível como o sentimento de culpa meio inocente gritava no coração dos dois. Somente um acidente provocado pela neve fez o garoto correr tropeçando até Olivia para lhe fazer a pergunta que os fez conceber uma nova aliança:

—  Ei, você se machucou?"— recebendo uma resposta explosiva.

— Não! Eu...eu estou bem!". Olivia se levantou do chão e correu mancando para casa como se não houvesse mais ninguém ali com ela.

Era certeza que a doce menina não iria parar de pensar no pequeno diálogo que tivera com o garoto de cabelos negros e longos que morava ao lado de sua casa, a vontade de pular a janela e encontrá-lo para pedir desculpas pelo modo que o respondeu era quase insuportável;"Mantenha a calma", pensava ela, "Amanhã direi a ele o quanto sinto pelo meu comportamento anterior... de fato, um infortuno".

Veio o dia seguinte, e Olivia, vendo que o sol brilhava com intensidade trazendo consigo ventos genuinamente calmos e frescos, decide sair à varanda para tomar café, aproveitando toda aquela calmaria. Que sentimento bom e leve a menina sentiu. Fechou os olhos por alguns minutos e ouviu uma voz quase sussurrando: "Bom dia, Olivia!". Jogia, o menino à qual Olivia tinha tratado de maneira tão rude, estava à sua frente.

— "Sallut", bom dia! — a menina corou, não conseguindo dizer mais nada.

— O dia está realmente belo hoje, não é? — Disse o menino sorrindo — Desculpe aparecer assim de repente, é que me senti obrigado em vir aqui perguntar se...

— Estou bem melhor — disse Olivia cortando o menino — Aliás, eu deveria pedir desculpas pelo jeito que lhe falei ontem, eu estava envergonhada. — Ela deu de ombros.
— Por favor, eu entendo, não se preocupe. A propósito, você realmente não se machucou, e isso é o que importa.

Olivia corou de uma maneira exagerada, não tinha palavras nem para agradecer.

— Devo ir agora, disse ao meu pai que o ajudaria com o conserto do carro. Foi ótimo falar contigo... Hm, Olivia, certo?   — dizendo sempre sorrindo.

— Claro! Sim, este é meu nome. — Disse a garota mais calma.

  O garoto piscou e foi embora. Olivia sentiu como se o paraíso fosse ali mesmo, não gostaria que aquele momento acabasse. Mas um dia eles acabam.

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