Ah, forró! Pense num som bom pra qualquer nordestino. Eu estava dançando com minhas amigas, Ingrid e Yanna, enquanto Luana e Maria devoravam os salgadinhos. Era um pré-arraiá beneficente e eu tinha certeza que Rodrigo estaria por lá. Já havia algum tempo que vinhamos trocando olhares e eu tinha decidido que, naquela noite, tiraria a prova dos nossos sentimentos, mas já havia quase duas horas de festa e ele não chegava. Ingrid passava os olhos pelo local a cada cinco segundos, também procurando Rodrigo que estaria acompanhado de Leonardo, certamente. Além disso, Humberto, com certeza, saberia daquela festa e ela não perderia a oportunidade de instigar ciúmes no ex.
- Senta e come alguma coisa, uma hora ele vai chegar. - Maria tentou me acalmar, sentei, mas não tinha condições de digerir qualquer orgânico que me empurrassem.
É claro que eu não tirava os olhos da entrada e, quando já estava desanimada, um rosto bochechudo fez as borboletas do meu estômago voarem até a garganta.
- ELE CHEGOU! - Alertei, aos gritos, as outras.
Luana desistira e dormira na mesa mesmo. As outras se animaram, mas quando procurei-o novamente, não estava mais lá.
- Amiga, tu deve ter visto o Johnny e achou que era ele. - Ingrid me dizia quando voltávamos para mesa, depois de tê-lo procurado por todos os cantos da festa.
- Eu não o confundiria! - dizia irritada.
- A festa tá lotada, você deve ter visto alguém parecido...
Eu continuava negando, não podia estar ficando louca a esse ponto.
E não estava! Maria vinha do banheiro gritando por mim.
- Elena! Elena! - ela chegou perto de mim ofegante e baixou o tom - Elena, você estava certa, ele está aqui! - meu coração pulou - Eu estava saindo do banheiro quando o vi ali perto...
Corri com ela até lá! Ele não estava... Mas, agora que eu sabia que tinha a mínima possibilidade de encontrá-lo, a esperança me consumia, tanto que eu não podia ficar parada... Comecei a dançar. Dancei com minhas amigas, com Luís, com Fernando, com Lucas, sozinha e quando, finalmente, me cansei, dirigi-me ao sofá perto da mesa de bebidas com minhas amigas. Lá, minhas pernas ficaram bambas e tive que dobrar para mesa antes que acabasse caindo em cima dele. Que típico! Depois que eu tinha me acabado dançando, estava suada, com a maquiagem escorrendo, provavelmente descabelada, ele decidia que estava na hora de me ver. Estava colocando gelo no meu copo para tentar aliviar a sensação de ardor ao vê-lo quando uma voz fez um efeito melhor do que o gelo.
- Guardou uma dança para mim? - virei-me sem saber muito bem o que fazer, não sabia como responder ou reagir, levei meu olhar para o sofá e sustentei por dois segundos nos olhos de Rodrigo antes de, embaraçada, lembrar que devia responder aquela voz que, antes tão desejada, agora parecia inadequada.
- John... Oi! - falei com um sorriso falso que eu não pude conter.
- John? Quem é você e o que fez com Elena? - ele falou sorrindo. Eu ri desajeitada olhando sorrateiramente para Rodrigo que também nos espiava entre as brincadeiras com seus amigos. Johnny passou um braço pela minha cintura, tirou meu copo da mão com o outro e me puxou para mais perto. - Vem, vamos dançar!
Ele me guiou até a pista, de frente para o sofá onde Rodrigo e minha amigas nos observavam boquiabertas. Ele me fez algumas perguntas enquanto dançávamos, as quais eu respondi com sim ou não, às vezes, fingia não escutar para não responder perguntas como "por que está tão distante?" ou "sinto muito a sua falta, sabia?". Quando a dança terminou, me afastei dizendo que precisava de água e ele me seguiu.
- Por que não conversamos mais? - ele me perguntou abruptamente, por sorte, bebia água na hora e tive ainda dois ou cinco segundos para pensar sem parecer idiota, mesmo assim, não conseguir pensar em nada.
- O que você quer, Johnny? - falei, como se estivesse falando a mesma coisa há muito tempo.
- Johnny... Melhorou...
- Não, de verdade, o que você quer? Quero dizer, você não é burro... Você sabe o que... Você sabe que eu... - não terminei, porque eu sabia que ele já tinha entendido.
- Eu sinto falta da minha amiga, Elena. Daquela Elena que conversava comigo sem querer estar em outro lugar, daquela que sempre aparecia do nada para fazer comentários desnecessários sobre meu cabelo, daquela que não evitava me olhar e rir, que sustentava o olhar no meu para tentar entender uma piada interna... - os olhos dele suplicaram. Os de Rodrigo também.
- Você é tão egoísta, João! - Eu falei, não irritada, não angustiada, falei com raiva, bufando. Queria sair dali, correr, meus olhos já estavam marejando. - Não vê o quanto é difícil te ver olhar todo apaixonado pra ela e quando, finalmente, estou conseguindo não sentir, fazer parar de doer, você vem mexer na dor?
- Não é isso que eu quero, você sabe...
- Bom, é isso que você faz! - a música alta me fazia gritar, eu podia sentar meu rosto corando e minhas veias do pescoço saltando. Eu não queria estragar o resto da noite, então, antes que as lágrimas começassem a cair, tentei sair daquela conversa.
Mas ele segurou meu pulso e me prendeu.
Senti o desespero tomar conta de mim, as lágrimas se aglomeravam na linha d'água.
Virei para tentar me soltar ou me defender ou apenas para chorar de verdade, mas, mais do que depressa, Rodrigo se colocou ali. Estava encarando Johnny. John. João. Estava encarando João. Não de uma forma ameaçadora, mas constrangedora. Rodrigo pegou minha mãe e abriu um sorriso para João.
- Posso interrompê-los? - depois virou para mim. - Espero que não seja tarde para pedir uma dança...
João soltou meu pulso devagar, como se estivesse me perdendo. Rodrigo não soltou da minha mão até chegarmos a pista, onde ele passou o braço pela minha cintura e segurou na outra mão. Talvez ele tivesse percebido que eu não queria conversar, talvez ele só quisesse dançar, mas o fato é que desde o momento em que a música começou até a hora em que ele me levou até o sofá, não deu uma palavra sequer, nem para acompanhar a letra da música.
- Obrigada. - pronunciei baixinho ao sentar ao lado dele. Ele continuou sem falar nada, nem precisava, seus olhos diziam tudo.
Luana dormia por cima de Maria que também já estava quase cedendo ao sono, Yanna me olhava curiosa enquanto esperávamos meu pai buscar, a curiosidade não a deixaria dormir e Ingrid aproveitava os últimos minutos enquanto ainda podia dançar.
- Obrigado. - Rodrigo falou aleatoriamente para mim.
- O que?
- Obrigado. - ele aumentou um pouco o tom de voz, mas não muito.
- Quero dizer, pelo que?
Rodrigo não disse nada, apenas sorriu, um sorriso misterioso, como se quisesse que lesse nas entrelinhas, como se tivesse algo para dizer. Não sabia pelo que ele estava agradecendo, nem sei se queria saber, queria só continuar contemplando aquela paisagem que era o seu sorriso, até que meu telefone tocou e meu pai falou que já me esperava. Levantei e me despedi, ainda um pouco atônita com o contraste de seus dentes brancos e sua boca rosada, levantei uma Luana resmungante e que se apoiou em Maria, chamei Ingrid e fui saindo, logo atrás de Yanna. Antes de sair, porém, senti alguém me segurar pelo pulso, mas não tive medo que fosse João, porque aquele contato que incendiou meu corpo só podia ser uma pessoa.
- Obrigada por essa noite. - seus olhos pretos pareciam labaredas que dançavam enquanto a noite ia se acalmando. As chamas que ardiam nele podiam me incinerar... Mas, como era mesmo? "Fogo que arde sem ver..."
Não sei pelo que ele agradecia, mas eu poderia usar de suas mesmas palavras. Ao invés disso, retribuí com um sorriso sincero, o mais sincero que pude, e saí com as labaredas de seus olhos me fitando a 40° graus.
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Rodrigo
Short StoryMudaram as estações Nada mudou Mas eu sei que alguma coisa aconteceu Tá tudo assim tão diferente Lembra quando a gente Chegou um dia a acreditar Que tudo era pra sempre Sem saber Que o pra sempre Sempre acaba - Cássia Eller