Hora do Jantar

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Para minha sorte sua aversão a armas de fogo era equiparada a sua paixão por tecnologia.
Ele me mostrou inúmeros vídeos, todos feitos por ele sobre manuseio e manutenção correta para cada tipo de lâmina. Admito que no começo fiquei impressionado com o quão pouco era preciso para destrinchar uma pessoa.

A princípio seus hábitos alimentares me deixaram apreensivo, mas depois de algum tempo compreendi.

Todo predador caça, por que com humanos seria diferente? Logo Ele que era o próximo passo da cadeia alimentar.

Ele tinha o disfarce perfeito. Uma boutique para carnes de luxo. Claro que isso nada mais era do que um nome enfeitado para falar que ele tinha um açougue.

Eu relutei em provar mas não poderia negar indefinidamente. Ele havia me mostrado um mundo novo, aberto meus olhos para uma nova realidade. Eu que sempre fora religioso finalmente havia compreendido. Ele era o caminho, a verdade e a vida.

Anseava por ser como ele, em causar nele o mesmo orgulho que eu sentia ao ver um daqueles vídeos, a mesma admiração. E como sê-lo senão aprendendo e agindo como ele?

Ele fazia com que tudo fosse único. Podia passar horas a fio falando sobre gumes, facas e espadas ou então sobre culinária, outra paixão de sua vida.

Uma vez o questionei sobre o que o levava a escolher as pessoas e ele então me explicou que havia dois tipos. Os desprezíveis e os randômicos. Os desprezíveis eram os que a natureza apontava. Quando isso acontecia ele os seguia,descobria os tipos de sujeira que faziam e então era tomado pela necessidade de eliminar aquela pessoa do convívio com as boas pessoas de nossa sociedade.

O segundo tipo tropeçava nele sem querer e despertava um desejo quase sexual, animalesco e irascível que crescia do instante em que punha os olhos na pessoa até o momento em que a vida lhes escapava, esvaziando os pulmões e os olhos.

O primeiro tipo não servia para alimentar, pois desses ele tinha nojo. Terminavam em uma vala qualquer e normalmente ninguém sequer os procurava atrás de noticias. Eram estatísticas.

A primeira vez que provei a carne foi surpreendentemente agradável. Não havia um padrão para a escolha do prato do dia, ele podia variar entre faisão e João no mesmo dia entre almoço e jantar como poderia passar uma semana inteira comendo apenas carne bovina, aves ou todo o sortimento de animais que ele tinha tanto prazer em caçar.

Naquele dia ele dizia estar preparando cordeiro. Ele passara o dia falando sobre o quão macia e saborosa era essa carne.

O aroma durante o preparo era maravilhoso e o sabor ainda mais. A carne havia dormido no vinho, com ervas finas e pincelada com azeite de primeira antes de ir ao forno. Acompanhado com uma salada leve, batatas ao murro e boas taças de vinho tinto aquela refeição era saborosa e dava um tom leve a conversa.

Ele serviu porções generosas e então começamos a comer entre o tilintar do garfo e algumas pontuações geralmente bem humoradas sobre algum assunto corriqueiro. Sentia o sumo da carne escorrer pela minha garganta alternando com o sabor do vinho.

Retirei os pratos da mesa e quando voltei ele tinha em mãos um dvd com a capa branca. Eu já havia visto dezenas de similares mas nunca um de capa branca.
As capas eram sempre pretas, até então eu vira apenas os desprezíveis, os que eram descartados.

Assistir a um dvd da capa branca era como uma recompensa, um presente. Sorri imaginando o que deveria conter e me sentei no sofá branco enquanto ele ligava o aparelho e ajustava o áudio.

O video começava na mesma mesa de que tinha acabado de me levantar mas a iluminação sugeria que a refeição que estava acontecendo desta vez era um jantar.
Pela aparência dele na imagem o video havia sido gravado pouco antes do nosso encontro no beco.

O tom da conversa era suave e a garota era uma das mais belas que já havia visto. Ela aparentava ter mais ou menos a mesma idade que eu no momento, tinha longos cabelos castanhos que desciam pelos ombros e caiam em seu colo volumoso porem discretamente coberto por uma blusa branca.

Seu rosto de traços delicados, se abria em um sorriso que começava na boca perfeitamente desenhada e terminava em seus olhos esverdeados.

Aquela garota estava totalmente entregue.

O jantar discorreu tranquilo, conversaram amenidades e como sempre ele fez questão de ressaltar sua paixão pela culinária Falava dos cursos que fez, dos pratos mais aclamados e das receitas inventadas.

Era impressionante a facilidade com que ele se abria com aquela garota. Por alguns instantes, cheguei a sentir ciumes dela. Era sempre tao difícil extrair informações dele e ela estava fazendo aquilo de maneira inconsciente.

A sobremesa como já me parecia obvio foi servida na suite principal da casa com correias de couro e calda quente de chocolate para acompanhar.

Ela havia sido amarrada a cama e parecia gostar muito da brincadeira.

O sexo durou um bom tempo e para qualquer um seria impossível prever o que estava para acontecer a seguir.

De repente, ainda nu ele saiu do quarto, mas logo em seguida estava de volta vestindo um roupão branco e trazendo uma seringa entre os dedos.

A expressão dela era a de quem ainda não havia saído do clima sexual que pairava no quarto.

Ela percebeu que havia algo errado quando ele tentou aplicar o anestésico nela pela primeira vez. Ela então se debateu e tentou lutar para afasta-lo mas era impossível estando presa a aquelas tiras de couro que pendiam das extremidades da cama.

Foi rapidamente dominada e em alguns segundos o tranquilizante que não a adormeceria mas a deixaria impossibilitada de se mover ou falar já estaria correndo por suas veias.

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