20 de Dezembro
A neve a cair lá fora era observada, através da janela de tom verde escuro gasto, por aqueles olhos claros tão grandes e tão atentos daquele rapaz de cabelos castanhos. Ia suspirando como quem estava farto de esperar, e essa era a fatal realidade: os seus pais tinham decidido sair em compras natalícias, levando a sua irmã mais nova, Floris, de 6 anos, e o deixar em casa sozinho no tédio. Ele bem que odiava esperas destas, não suportava não ter nada que fazer ou alguém com quem falar, achava já que as paredes tinham se fartado de o ouvir.Decidiu então ligar ao seu amigo.
- Oieee Lims, que tens feito da vida?
- Nada de interessante Jayme a não ser fixar paredes - suspirou - Desde que as aulas acabaram que eu não tenho nada para fazer!
- Mais vale não ter nada que fazer do que ter aulas Ishii! Pedir aquele inferno é que não.
- Já sabes o que vais fazer este Natal?
- Humm sei lá. Talvez dormir, fingir que o Pai Natal é que deixou as prendas para o meu irmão continuar a acreditar nesse velhote, comer chocolate e jogar Call Of Duty até me fartar.
- Não vais passar antes a conviver com a tua família e a falarem todos?
- Tu sabes como é que eles são, tudo o que fazem é conferir um ambiente propício para discussões. E eu também não sou grande fã da família reunida.
- Porquê?
- A minha família respira aparências e quando se juntam é para criticar ou comentar acerca uns dos outros. É só cochichos!
- Pois, realmente não é fácil assim gostar de passar tempo com eles.
- Quando me vêem é logo "oh Jay podias vestir-te melhor rapaz" - fez uma voz fina - ou "vê se te sabes comportar, olha a postura" e depois criticam o facto de eu não saber dar uso a todos aqueles garfos e facas e colheres e por aí adiante naqueles restaurantes chiques que insistem em ir duas vezes por ano "para continuarmos unidos". Unidos uma ova, é irritante. - comecei a rir - Não te rias! Não tem piada nenhuma.
- Nem eu sei dar uso a esse exército todo
- Ainda bem que não sou o único, ufa. Sejamos sinceros, para quê tanta coisa que basta só um de cada? E o que interessa é comer e não complicar essa tarefa.
- Sim.
- Bem, vou ter que desligar porque a minha mãe já está a fazer cara feia, byezito.
Agora o rapaz encontrava-se no mesmo dilema de à pouco: ou via a neve a cair ou via as paredes pálidas mais uma vez. Ouve-se a chave a entrar na porta e, pouco tempo depois, um furacão de camisola de lá vermelha e saia preta a correr descalça ao encontro do Ishii.
- Ishiiiiiiiiiiii - agarrou-se a ele e deu um abraço - Eu fiz a mãe comprar-me um chocolate!! - disse toda orgulhosa de si mesma com os olhos a brilhar.
- E para mim não há nada? - mostrou-se indignado.
- Haver há maninho mas eu vou ficar com ele!! - a rapariga de cabelos claros começa a correr em histeria, enquanto o irmão corria atrás dela, numa tentativa de a impedir de se apropriar do seu suposto chocolate - Vai ser meu!!
- Não, não vais sua peste. Volta aqui!!
A tarde foi assim passada entre risos e corridas com meias pela casa, levando a algumas quedas vergonhosas com os tapetes dos corredores.
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O Cachecol Vermelho (#NatalUnidos)
Short StoryIshii sempre foi um rapaz peculiar, curioso, dotado de uma inteligência e vontade própria capaz de convencer e mover pessoas. Ele não ligava a materialidade, gostava de andar pelas ruas a mostrar a sua liberdade e a procurar o que fazer para ajudar...