A Sentença

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Eu fiquei sentado em meio ao sangue, ele ainda estava morno apesar do frio da madrugada. A carne partida e a pele rasgada decoravam a cena. Meu corpo não aguentava mais, eu estava desgastando-o muito com lutas e magias sem descanso. Peguei meu celular enchendo-o de sangue, liguei para Isaac e falei que já tinha feito o que precisava, alguns segundos depois o diamante se desmanchou virando pó em minha mão. Peguei as Manoplas de Asura, o resto do corpo eu deixei ali, eu já estava muito cansado para fazer mais magias. Caminhei moribundo pelo tempo que pareceu uma eternidade até meu apartamento e entrei no espelho me limpando, depois fui dormir esgotado.

Acordei de manhã cedo e enchi a banheira com água, peguei sálvia, uma erva com propriedades regenerativas, coloquei algumas folhas dela na banheira, joguei sal, coloquei a mão na água e comecei a recitar "Reparare Corpus Spiritus" várias vezes, logo a água tomou a coloração esverdeada da sálvia. Eu entrei e fiquei lá algum tempo. Esse feitiço ajuda a regenerar o corpo, o espírito e a energia, assim não seria necessário muito tempo de descanso.
Eu sentia meus poros formigarem e uma espécie de energia entrava pela minha pele fazendo meu corpo relaxar, isso era um sinal de que o feitiço estava funcionando. No final da manhã ouvi a alguém batendo na porta. Arrumei-me e abri, era o Neight. Fiquei tão feliz em ver seu rosto, algo que me alegrou ainda mais. Ele me cumprimentou de forma esquisita, parecia nervoso ou algo do tipo. Nós sentamos na mesa da cozinha. Eu ofereci alguma bebida ou comida, mas ele recusou sem jeito. Comecei a temer o pior.

- Algor, isso é muita loucura, mas eu gosto de você. Todo esse lance de magia e feitiçaria eu poderia conviver, mas sua vingança é doentia. Nós quase morremos aquele dia e mesmo assim você ainda quer continuar com ela... E se aquele cara aparecer de novo?

- Não se preocupe. - Interrompi Neight. - Eu dei um jeito nele... Eu sei que é difícil para você entender, mas eu preciso fazer isso, isso é o que eu tenho planejado desde que eu tinha quatorze anos. - Falei firmemente.

- Pelo que você me falou esse clã é grande, então não tem só aquele cara, pedir para eu arriscar minha vida pela sua vingança é demais.

- Eu sei... Sinto muito por isso. - Eu não resisti e comecei a chorar... Sabia onde essa conversa ia dar. - Eu preciso fazer isso pela minha família.

- Tudo bem, mas eu não posso fazer isso, mesmo por você. Espero que você não se machuque, mas essa não é a minha vingança. - Eu vi uma lagrima escorrendo de seu olho. - Adeus Algor... - Ele se virou e saiu pela porta me deixando desnorteado. Novamente o clã Damckler tirou uma pessoa que eu amava de mim. Após alguns minutos eu entrei no espelho e me deitei tentando não chorar. Era como se o vazio da perda da minha família tivesse voltado, de uma forma diferente obviamente. Mas também muito doloroso. Contorcia-me na cama como se aquilo realmente machucasse meu corpo, e para mim machucava.

Lá estava eu rolando na cama sem sono por horas, já havia anoitecido e eu estava lá, sem vontade de sair da cama. Logo eu ouvi a porta abrindo, fazendo-me ficar preocupado. Quando olhei vi um senhor de idade com cabelos grisalhos até o pescoço, uma barba branca indo até o peito, sua pele pálida, enrugada e murcha, olhos verdes como musgo. As poucas partes de seu corpo que não estavam cobertas por um manto negro, eram cobertas por símbolos tatuados, nenhum que eu já havia visto antes. Ele foi andando pelo meu apartamento passando as unhas pontudas e encardidas pelos moveis de madeira, e eles foram apodrecendo com o decorrer dos segundos. O símbolo que ele possuía na parte de cima da mão se movia como sombras enquanto ele apodrecia as coisas. Eu fiquei parado na frente dele, ele olhou na minha direção como se soubesse que eu estava lá, mas a magia do espelho parecia realmente estar funcionando. Ele foi circulando a sala passando a mão por tudo, apodrecendo-os, fazendo a madeira exalar um odor fétido, enrugar-se e ficar mais escura.

Os Olhos da VingançaOnde histórias criam vida. Descubra agora