Capítulo 2 - Um novo perigo

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— Senhor Antunes, temos um novo caso que merece sua investigação.

— Mais uma agência pirata suspeita no passado?

— Negativo, dessa vez parece ser algo a ser resolvido no futuro.

Um péssimo presságio tomou conta da minha consciência. As viagens ao passado eram completamente seguras, pois tudo o que já foi feito não podia ser modificado e a pessoa enviada podia retornar em segurança. Porém no futuro, as coisas eram muito mais instáveis.

Pessoas que eram enviadas para os momentos finais de vida do receptáculo, padeciam também em seus corpos originais. Como é impossível prever quando uma pessoa pode morrer, enviar alguém ao futuro e esse receptáculo morrer seriam chances remotas, porém fatais.

Mais do que isso, aparentemente todas as consciências que eram enviadas num futuro muito distante morriam assim que chegavam aos corpos. Após uma trágica movimentação de tentativas e erros, pode-se marcar um período de impossibilidade de envio de mentes que foi denominado como "O Grande Apagão".

Porém o assustador é que, a cada vez que era medido essa época, o tempo parecia retroceder um pouco mais. Logo, nem as agências piratas arriscaram mais enviar pessoas para o futuro e na agência, viagens assim só eram consideradas em casos extremos.

— Posso saber sob qual circunstância que foi autorizada essa excentricidade?

— A ordem veio de cima, eu não estou autorizada a contestá-la.

"Inferno!" Disse enquanto martelava o telefone. Era inútil discutir com a secretária então peguei as coisas e fui diretamente ao chefe de departamento pedir esclarecimentos.

— Que diabos de ideia é essa?

— Controle-se senhor Antunes. Temos motivos de sobra para acreditar que nossa agência está comprometida. Foram registradas viagem retroativas no tempo de uma nova fundação que não é a nossa. Estamos sendo vigiados por piratas.

Mais uma vez meu corpo estremeceu em pavor. Devido a um acordo estabelecido pelo governo desde a instituição do órgão de vigilância. Foi decretado que a agência nunca poderia sair do lugar sob hipótese nenhuma. Para um controle geográfico na linha do tempo das nossas atividades. Qualquer registro de viagem fora daqui era um alerta de atividade clandestina.

— E posso saber por qual motivo sou eu o felizardo por essa missão suicida?

— Ora... — O inspetor umedeceu os lábios e demonstrou grande prazer em continuar — O senhor é o melhor agente dessa instituição, consideramos mais do que capaz de atuar nessa tarefa de importância nacional. Sob recomendação do Presidente.

Estava preso a essa decisão. Nenhuma decisão de base poderia ser revertida se vinda diretamente da Presidência.

— Eu o amaldiçoo... — disse tentando conter a raiva — se algo de terrível acontecer a minha pessoa nessa viagem.

Enquanto me dirigi a cabine de viagem, pude ouvir uma baixa risada da sala. Sempre soube que me odiava, nunca imaginei que me queria morto.

"Vamos acabar logo com isso", disse enquanto me deitava na máquina. Devido a ordem de emergência, não era necessário o preenchimento de qualquer documento.

— Você será enviado cinco anos no futuro. Personalidade e localidade desconhecidas. duração da viagem de uma hora. Esperamos que retorne em segurança.

— Vá se foder. — disse pouco antes da máquina ser ligada. Uma advertência era a menor das minhas preocupações no momento.

Acordei com meu receptáculo caminhando nas ruas do centro de São Paulo. Cada moto que avançava o farol e cada vez que o receptáculo atravessava a rua sem olhar era um pequeno enfarte para mim. Viver sem o controle do corpo mas ainda correndo risco de morte, era uma experiência terrível.

O bastardo ainda teve a coragem de observar, perigosamente de perto, uma briga acalorada entre um bêbado e um mendigo. Cada segundo eu imaginava um dos dois sacando uma arma e pondo fim em nós dois.

Felizmente após alguma enrolação ele se dirigiu a uma espécie de esconderijo, num dos prédios abandonados do centro expandido. Era talvez o maior laboratório pirata de viagem temporal que já vi em minha carreira. Diversas pessoas reunidas lá, algumas mortas sendo retiradas das cadeiras. Ao invés de pequenos comerciantes temporais, esses caras formaram uma grande teia de tráfico de viagens.

— Precisamos de mais informações sobre a agência central. — Falava com meu receptáculo um dos criminosos, parecia ser o chefe deles. — Funcionamento, padrão de investigação... tudo! Vamos te enviar pro corpo de um zé ninguém da agência a cinco anos atrás, período mais vulnerável deles.

Era terrível! Esses imbecis iam enviar meu receptáculo no tempo comigo ainda habitando seu corpo. Isso nunca foi feito antes e não se fazia ideia do que poderia acontecer. Tentei a todo minuto dar sinais que estava lá para poder alertá-lo do erro que estavam a cometer, mas sem frutos.

O horror me foi ainda maior quando percebi que o corpo que seria receptáculo do pirata era o meu próprio. Como foi terrível ouvir meu nome sendo pronunciado pelo chefe dos piratas. Ainda tinha alguns minutos apenas no corpo deste e estava torcendo para qualquer contratempo possível. Cada segundo conta quando se está a beira do inimaginável.

Porém todas as preces foram desperdiçadas. Vi passivamente meu receptáculo deitando-se a cama e seus comparsas ligando a máquina. O que viria a partir foi uma cadeia de eventos que, com algum esforço, vou tentar descrever.

Não estou vivo e aparentemente nem morto. Não sei se passaram anos ou segundos, é difícil manter controle do tempo quando a realidade que você conhecia se desmancha a sua frente. Por vezes revivo memórias passadas, algumas penso serem minhas, outras de meu receptáculo. Não faz diferença agora pois aparentemente, somos apenas um num infinito ciclo.

Passo a maior parte do tempo num vácuo completo sem chance de reagir a nada, não sei se um dia irei morrer, se meu corpo biológico já morreu ou está em coma, se um dia... serei liberto dessa prisão existencial. Sou apenas uma fração de informação perdida na imensidão na grande malha do espaço-tempo.

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⏰ Última atualização: Dec 13, 2016 ⏰

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