Na visão dela

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O que mais se espera da vida é ser sinceramente, plenamente amada, e isso eu fui e sou.

Essa sensação é maravilhosa, faz bem para a alma, alegra o coração, dispara um sorriso bobo e involuntário, quando menos se espera. Ainda mais quando se sente a mesma coisa e na mesma intensidade...

Não existe gratidão no mundo que pague por ter tido a oportunidade de saber, de sentir como é amar e ser correspondida, de se tornar inesquecível mesmo quando não já se existe mais, ao menos em corpo e alma.

Mas o que é felicidade para mim, aqui nesse plano onde me encontro, acabou por se tornar um martírio para ele, justo ele, que me amou e me ama tanto, justo ele, que me fez a mulher mais feliz que eu vim a conhecer.

Não queria que ele permanecesse ali tão triste, sentado em nossa sala agora tão fria, muitas vezes nem a lareira ele alimenta, parece que ele quer que o que sente por dentro seja refletido em cada móvel desta sala mal iluminada.

Eu o vejo procurando por mim nos lugares errados, no nosso antigo quarto, na varanda onde passávamos tarde inteiras a sorrir, na imagem refletida neste porta-retratos, em locais onde jamais poderá me encontrar novamente. Não que eu não esteja ali, não que eu não anseie tanto que ele me encontre, mas nesse momento é verdadeiramente impossível.

Se ele não aprender a me buscar dentro das si, nas profundezas dos seus pensamentos mais íntimos, na imensidão do coração que carrega dentro do peito, ele jamais se libertará do sofrimento que o acorrenta.

Queria poder tocar-lhe novamente a face com as duas mãos, pedir carinhosamente que se cale e me escute, para poder lhe dizer o quanto sou grata por todo o amor que ele sentiu e sente por mim, mas que o seu eterno sofrimento também me machuca, quem é que gosta de ver alguém que amamos sofrendo tanto e por tanto tempo?

Queria poder abraçar-lhe com força e sussurrar em seu ouvido que ele deve ser forte e paciente, pois um dia nos encontraremos de novo e na eternidade seguiremos nos amando, conquistando o mais cobiçado dos paraísos.

Queria olhar nos seus olhos finalmente e ficar em silêncio, doar-lhe de bom grado um sorriso, sorrir com os olhos como assim ele dizia que eu fazia, mesmo sem saber como, e aguardar seu tão suave beijo, sem pressa, sem gana nem volúpia, somente a coroação de um amor sincero.

Queria muitas outras coisas, todas junto do meu homem amado, mas o tempo para isso acabou e a paciência é o meu melhor remédio. Eu não sofro como ele, pois eu sei o que o futuro nos reserva e o que para ele ainda é um mistério, para mim é uma certeza.

Eu sofro é por ele, pelo desejo que ele nutre a cada momento, pelo sofrimento que ele arrasta a cada segundo de solidão, pela sua tamanha desesperança.

Chego a sentir seu olhar sobre mim, me buscando, eu queria do fundo do meu coração dizer-lhe simplesmente que isso não é possível, eu queria poder virar meu rosto e lhe ver plenamente em vez de somente o imaginar, mas nada ainda posso fazer, agora não existe mais como lhe corresponder, pois ele amou o que eu fui e não o que eu sou.

Nesse momento nada mais sou do que uma recordação na mente do meu amado, entremeio flashes e mais flashes de lembranças, despertando inúmeras e diferentes sensações, sufocando no lugar de acalentar, enfim, me resumi a nada mais que uma imagem estática na estante da sala, presa, imóvel, eternizada que estou neste porta-retratos.

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